Esta rentrée parecia interminável. Uma esticada cauda de calor de uma silly season que se recusava a acabar. A última semana de setembro acaba como o mês começou: na expetativa de que algo significativo aconteça, o quotidiano vai-se dispersando por vários temas sem que surja uma estrutura coerente.
Não tinha de ser assim. Vejamos. Peguemos pelo fim, só para efeitos demonstrativos.
Dobrão Barroso: o filão noticioso desperdiçado
O grande tema não desenvolvido são as revelações sobre aquele ex-Primeiro Ministro português que mantinha estreitas (e perigosas?) relações com a Goldman Sachs. Sobre esta individualidade veio a lume uma [colossal quantidade de documentação] que mostra este Banco de Investimento Norte-Americano como possivelmente o maior conselheiro informal do ex-Presidente da Comissão Europeia. O que é interessante é este material ser pouco explorado. Porquê?
Deutsche: até a barraca abanca!
E ao entrarmos no último trimestre do ano vemos que o sector preferido da crise (não, não é o Estado) espreita mais uma vez o “top +” das notícias. É uma vertigem sem nome, esta. E agora o caso Deutsche Bank, que tremia, começa a abanar e a fazer ruído. Já há fundos de investimento a se retirarem deste mastodonte da banca europeia. Ainda nos lembramos de Schauble neste Verão, quando questionado sobre isto, a dizer que o problema europeu era Portugal. Portugal, como é costume, apanha sempre por tabela: 15 agências deste banco vão fechar (tornando o mercado bancário ainda mais concentrado e oligopolístico).
As altas esferas entre Berlim e Francoforte podem estar muito silenciosas, mas os ativos deste banco são “apenas” metade do PIB alemão (ainda e sempre a maior economia alemã). Três perguntas: afinal em que andou este banco metido para chegar até aqui? Ele não tinha sido já ajudado? Porque razão as autoridades americanas decidiram multá-lo com impacto tão estrategicamente significativo para pôr em causa a sua espinha dorsal financeira.
Shalom Simon: mais um pouco do século XX que partiu
Simon Peres foi uma personalidade complexa. E encerra as contradições e as esperanças de um Médio Oriente ainda a ferro e fogo. Sefardita nascido na Polónia torna-se um protegido do novo país em afirmação chamado Israel. Peres tornar-se-ia elemento central na famigerada Guerra do Suez há exatamente seis décadas. Nos anos 90 empenha-se decididamente no processo de paz, dentro e fora de Israel. Um caminho complexo num mundo complexo.
(…)
Finalmente, e num modo mais ligeiro, poder-se-á dizer que o sistema de media nacional está a passar ao lado dessa grande novela política nacional que se desenrola em plena praça pública a olhos vistos. O MRPP está no intenso centro de uma refrega sócio-política sem par na história do pós-25 de Abril, novela que, por enquanto, tem o seu espaço mediático, páginas de blogues e fóruns na Internet. Mas enquanto os politólogos dormem, a estranha caravana anda em círculos e até o MRPP tem direito a uma silly season estendida.
Ficha técnica:
O Barómetro de Notícias é desenvolvido pelo Laboratório de Ciências de Comunicação do ISCTE-IUL como produto do Projeto Jornalismo e Sociedade e em associação com o Observatório Europeu de Jornalismo. É coordenado por Gustavo Cardoso, Décio Telo, Miguel Crespo e Ana Pinto Martinho. A codificação das notícias é realizada por Rute Oliveira, João Lotra e Sofia Barrocas. Apoios: IPPS-IUL, Jornalismo@ISCTE-IUL, e-TELENEWS MediaMonitor / Marktest 2015, fundações Gulbenkian, FLAD e EDP, Mestrado Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação, LUSA e OberCom.
Análise de conteúdo realizada a partir de uma amostra semanal de aproximadamente 413 notícias destacadas diariamente em 17 órgãos de comunicação social generalistas. São analisadas as 4 notícias mais destacadas nas primeiras páginas da Imprensa (CM, PÚBLICO, JN e DN), as 3 primeiras notícias nos noticiários da TSF, RR e Antena 1 das 8 horas, as 4 primeiras notícias nos jornais das 20 horas nas estações de TV generalistas (RTP1, SIC, TVI e CMTV) e as 3 notícias mais destacadas nas páginas online de 6 órgãos de comunicação social generalistas selecionados com base nas audiências de Internet e diversidade editorial (amostra revista anualmente). Em 2016 fazem parte da amostra as páginas de Internet do PÚBLICO, Expresso, Observador, TVI24, SIC Notícias e JN.