É herdeiro? E se houver dívidas, sabe o que fazer? - TVI

É herdeiro? E se houver dívidas, sabe o que fazer?

  • CB
  • 28 mar 2017, 15:44
Carro/Dinheiro

A notária e diretora do Instituto dos Notários de Portugal, Sandra Brás, diz que o primeiro passo depois da morte de alguém passa por “perceber quais os bens que a pessoa tinha, se deixou alguma dívida por liquidar e se, em vida, deixou testamento”

Receber uma herança é, aparentemente, algo bom mas pode revelar-se uma dor de cabeça.

Não só porque o processo burocrático é longo mas também porque exige diversas decisões.

A TVI24 foi perceber como deve proceder em caso de “herdar” uma dívida e quais os passos mais importantes para não ficar a perder ou, pelo menos, conseguir minimizar os danos.

Segundo a notária e diretora do Instituto dos Notários de Portugal, Sandra Brás, o primeiro passo depois da morte de alguém passa por “perceber quais os bens que a pessoa tinha, se deixou alguma dívida por liquidar e se, em vida, deixou testamento.”

Esta informação pode ser encontrada em documentos deixados pela pessoa, como cadernetas, escrituras, certidões, entre outros. Caso ainda haja dúvidas, sobre o património deixado, “o cabeça-de-casal (administrador da herança) pode pedir informações ao Banco de Portugal sobre contas e dívidas. E os herdeiros podem pedir certidões às conservatórias do registo Predial, Comercial e Automóvel para saberem se os bens, que se encontram em nome da pessoa que faleceu, têm hipotecas ou penhoras”, esclarece.

Para o fazerem precisam de uma escritura de habilitação de herdeiros, escritura que permitirá também aos herdeiros movimentar as contas em causa ou vender/partilhar os bens da herança - imóveis, automóveis, armas, quotas em sociedades, entre outros.

Depois há uma decisão importante a tomar: aceitar ou repudiar a herança.

Seja qual for a opção será sempre sobre a totalidade do valor herdado – património e dívidas, se as houver. Ou seja, os herdeiros nunca poderão decidir sobre uma parte.

Quando aceito a herança e há dívidas o que fazer?

Em primeiro lugar, saber qual o valor das dívidas e qual o valor do património ativo:

Se os ativos cobrirem os encargos, ou seja, o valor do património for superior ao das dívidas estas serão saldadas. Nesta situação receberá uma quantia menor do que seria de esperar.

Segundo Sandra Brás, “as dívidas da pessoa que faleceu só serão pagas se os bens deixados forem suficientes e até ao limite do seu valor”, o que garante que não terá que se responsabilizar por qualquer dívida herdada.

Se o montante da dívida ultrapassar o do património, não terá direito a nada. Isto acontece porque o valor dos encargos foi coberto pelo património disponível.

A parte da dívida que não conseguir ser coberta não será uma preocupação sua pois ficará a fundo perdido.

A aceitação da herança não o obriga a qualquer declaração. Basta começar a “usar” os bens herdados.

Partilha de herança só depois de pagar dívidas

Se em vez de um são dois ou mais herdeiros, o processo de partilha só deverá ser feito depois de serem liquidados todas as dívidas e encargos, para não aumentar a confusão.

 “Antes da partilha (divisão dos bens pelos herdeiros), os bens da herança respondem em conjunto pela satisfação dos encargos da herança. Depois da partilha, cada herdeiro só responde com os seus bens próprios. Pelos encargos da herança na proporção da quota que lhe coube”, esclarece Sandra Brás.

No caso em quem haja bens partilhados, por exemplo uma casa, também esses poderão ser utilizados para pagar a dívida.

Existem alguns empréstimos que, em caso de morte do titular, ficam pagos devido ao seguro de saúde associado ao mesmo.

E se repudiar a herança?

Caso repudie a herança perde todos os direitos que possa ter sobre a mesma.

Nos casos em que o passivo ultrapassa o ativo, repudiar a herança pode ser uma forma de se livrar de todas as “chatices” que as dívidas implicam mas não se livra de alguns aspetos burocráticos.

“Se o herdeiro pretender repudiar a herança faz uma escritura de repúdio num Cartório Notarial e leva-a, de seguida, às Finanças e à Conservatória do Registo Predial para que o seu nome deixe de constar como herdeiro daquela pessoa”, explica a notária.

Note que, se repudiar a herança esta passará para os descendentes do herdeiro que, caso queiram tomar a mesma decisão, terão que proceder da mesma forma. Se os descendentes forem menores, os pais terão de pedir autorização ao Ministério Público para repudiar a herança.

Habilitação como herdeiro: passo a passo

Para que tudo isto se processe corretamente e sem preocupações acrescidas é necessário que saiba quais os passos a dar se for herdeiro.

1 - O óbito tem que ser declarado nas Finanças, no espaço de 3 meses após a morte. Da declaração têm que constar: os herdeiros da pessoa que faleceu, os bens que deixa como herança, e os documentos listados no portal das Finanças

O não cumprimento deste passo é punível com coima.

2- Para saber se a pessoa deixou testamento ou não deve dirigir-se a um conservatório dos Registos Centrais. Só poderá saber depois de participado o óbito.

Se não existir testamento, os herdeiros legitimos terão que reunir todos os documentos que contenham informação sobre o património deixado. “Os herdeiros podem começar por procurar na documentação deixada pela pessoa que faleceu escrituras, certidões do registo predial, cadernetas prediais, extractos bancários, testamentos e outros.”

3- Terá que fazer a escritura de habilitação de herdeiros, que prova quem são os herdeiros. E que poderá ser feita em qualquer cartório notarial.

No caso de haver testamento, os herdeiros são conhecidos através desse mesmo documento.

Caso contrário, os herdeiros são definidos pela lei.

“Existem herdeiros legitimários (forçosos): o cônjuge, os descendentes e os ascendentes. E herdeiros legítimos (não forçosos), que podem ser afastados por testamento: os irmãos, sobrinhos, tios, primos e o Estado.”

Embora esclareça este ponto, Sandra Brás aconselha a que esta informação seja recolhida num cartório porque, em matéria de testamento e herdeiros, cada caso é um caso.

Momento da partilha

Se for herdeiro único, a resposta é simples. Não há qualquer partilha a fazer e todos os bens, de qualquer espécie, ficam a seu cargo – caso aceite a herança.

Se existir mais que um herdeiro há que entender se todos pretendem partilhar os bens herdados e será preciso reunir a informação necessária, descrita antes.

A notária esclarece também que, se os herdeiros decidirem não fazer a partilha de bens, podem ficar com eles a título de “bens comuns”.

A pessoa que deixou testamento só poderá decidir qual a parte da herança que deixa a cada um caso não tenha herdeiros legitimários.

Por outro lado, se os tiver, apenas tem poder de decisão de uma parte da herança (quota disponível). O restante será, obrigatoriamente, entregue aos herdeiros legitimários.

Um motivo pelo qual é importante, em algumas situações, deixar um testamento é no caso de viver em união de facto, numa casa que esteja em nome da pessoa que morre.

Se isto acontecer, para que tenha direito a alguma parte do património (da casa que partilhavam), é obrigatório que este conste do testamento. Caso contrário, a lei prevê que possa permanecer na casa onde vivia com a pessoa que, entretanto faleceu, durante cinco anos.

Os custos

Neste processo é importante saber que há custos a suportar. A escritura de habilitação como herdeiros e a partilha ou repúdio têm encargos. Os herdeiros não legitimários têm ainda que pagar 10% do imposto de selo sobre o valor dos bens.

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