Cidade italiana em silêncio durante um mês - TVI

Cidade italiana em silêncio durante um mês

  • VC
  • 21 jan 2019, 12:19
Museu do Violino, Cremona, Itália

O motivo é de força maior: preservar o som de violinos históricos para a posteridade

É mesmo um desafio difícil: ainda se lembra de como soa o silêncio? Poderia ser tão simples e é tão impossível para a maior parte das pessoas. Seja no trabalho, com o som dos dedos nos teclados a impor-se; seja na rua, com os motores dos carros; seja em casa, com o frigorífico aquele barulho miudinho. A cidade italiana de Cremona é uma exceção a esta regra: a população está a fazer tudo para que o silêncio reine, durante um mês. Por um motivo de força maior: preservar o som dos violinos e dos violoncelos para a posteridade.

À medida que o tempo passa, os instrumentos também envelhecem e os seus sons característicos acabam, inevitavelmente, por mudar. A ideia aqui é conservar sons para as gerações futuras, antes de eles se reformarem, por assim dizer.

Daí as gravações digitais, sem perturbações sonoras de qualquer tipo. No Museu do Violino de Cremona silêncio e música andam de mãos dadas. Não faria sentido ser noutro lugar. Esta é a casa de oficinas de alguns dos melhores fabricantes de instrumentos do mundo, caso de Antonio Stadivari, que nos séculos XVII e XVIII produziu dos melhores violinos e violoncelos algumas vez fabricados, mas também dos artesãos Amati e Guarneri del Gesù, por exemplo.

O autarca Gianluca Galimberti, que é também o presidente da Fundação Stradivarius, detentora do museu, implorou aos cidadãos para que evitem ruídos repentinos ou desnecessários. 

Somos a única cidade no mundo que preserva os instrumentos e suas vozes. Este é um projeto extraordinário que olha para o futuro, e tenho certeza que as pessoas de Cremona vão entender que o isolamento desta zona era inevitável".

As ruas adjacentes foram fechadas, não se circula, quer-se evitar qualquer tipo de reverberação: os sons do motor de um carro ou de uma mulher a andar em saltos altos, por exemplo, produzem vibrações que correm debaixo da terra e afetam os microfones.

As ruas em redor do auditório estão repletas de paralelepípedos, um pesadelo auditivo”.

O ex-DJ Leonardo Tedeschi, que foi quem teve a ideia deste projeto, faz essa chamada de atenção para, como disse ao The New York Times, enfatizar a importância do silêncio absoluto. Só assim será possível “tornar imortal o melhor instrumento já criado”.

Por isso é que, desde o dia 7 de janeiro, e durante cinco semanas, as ruas estão fechadas à circulação, a ventilação e os elevadores do auditório estão desligados e todas as lâmpadas da sala de concertos foram desenroscadas para eliminar zumbidos. Por mais leves e quase impercetíveis que sejam, para estes especialistas são ruído e podem comprometer o processo, a perfeição.

Durante oito horas por dia, quatro músicos tocam dois violinos, uma viola e um violoncelo. Há trinta e dois microfones ultrassensíveis instalados no auditório do museu para captar os sons. "Isto permitirá que os meus netos ouçam como um Stradivarius soava”, diz Leonardo Tedeschi.

Porque há memória para além dos escritos, das imagens e das esculturas. O som também é cultura e está carregado de História.

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