Quatro dias e quatro noites numa boia no Mediterrâneo - TVI

Quatro dias e quatro noites numa boia no Mediterrâneo

Doaa Al Zamel viu 500 pessoas a morrer afogadas à sua frente, incluindo o noivo. Sobreviveu e conseguiu salvar uma bebé. A história desta refugiada síria é contada no livro “Uma Esperança Mais Forte do que o Mar”

O olhar triste e tímido de Doaa Al Zamel esconde uma verdadeira história de superação. Sem saber nadar, a jovem síria, na altura com apenas 19 anos, sobreviveu quatro dias e quatro noites numa pequena boia insuflável.

À sua frente viu mais de 500 pessoas afogarem-se. Entre elas o noivo Bassem, que conheceu no Egito, para onde fugiu com a família devido à guerra civil síria, que deflagrou em Daraa, a sua terra Natal.

A morte do Bassem foi o momento mais difícil. Ele era todo o meu amor, toda a minha vida. E eu perdi-o”, revela, em entrevista à TVI.

“Foram as crianças que me mantiveram viva”

Quando Bassem desapareceu nas águas do Mediterrâneo, foi-se também a vontade de continuar a lutar para sobreviver. Mas, nos braços, Doaa segurava dois bebés. Malak, de nove meses, que lhe foi entregue pelo avô enquanto confessava já ter perdido 27 pessoas da família que seguiam no barco. E Masa, de 19 meses, entregue pela mãe, que morreu minutos depois.   

Foram as crianças que eu carregava nos braços que fizeram com que continuasse viva. Foi por eles. Senti que eram minha responsabilidade. Foi isso que me manteve viva.”

A história desta impressionante viagem é relatada no livro “Uma Esperança Mais Forte do que o Mar” por Melissa Fleming, porta-voz do Alto Comissariado para os Refugiados das Nacões Unidas, que trabalhou com António Guterres.

“Deixem os peixes comer a vossa carne”

No mesmo barco que Doaa, seguiam amontoadas mais de 500 pessoas. Apenas 11 sobreviveram. O naufrágio foi causado propositadamente pelos traficantes a quem tinham pago 2.500 dólares adiantados para fazer a travessia do Mediterrâneo.

“Foi um homicídio em massa. Os traficantes bateram num lado do barco dela com o deles. Gritaram insultos. Um dos insultos que gritaram, enquanto o barco de Doaa se afundava no mar, foi: ‘deixem os peixes comer a vossa carne’. E estavam a rir”, revela Melissa Fleming.

A nova vida na Suécia

Agora com 21 anos, Doaa mora na Suécia, país onde um dia sonhou vir a viver com Bassem. Com a ajuda do Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas conseguiu levar para lá os pais, a irmã e os sobrinhos. 

Também naquele país escandinavo está agora Masa, a criança que Doaa salvou. "Só a vi uma vez na Grécia, não a voltei a ver. Mas sei que vive na Suécia com o tio e a irmã", conta. Malak acabou por não sobreviver. Morreu pouco depois de chegarem as equipas de resgate. 

Doaa, que tinha fobia de água está agora a ter aulas de natação. Estuda sueco e quer entrar na universidade. Diz não ter dúvidas que um dia vai voltar à Síria. 

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