Barómetro: Os cêntimos de Centeno no orçamento da concórdia e discórdia - TVI

Barómetro: Os cêntimos de Centeno no orçamento da concórdia e discórdia

  • Gustavo Cardoso, Professor Catedrático ISCTE-IUL
  • 23 out 2016, 19:16
Mário Centeno e Marcelo Rebelo de Sousa

Em semana de Orçamento do Estado, os cêntimos de Centeno tornam-no personalidade da semana. Quanto ao pódio da política, Passos iguala Marcelo nos sentimentos positivos mas Costa mantém-se na liderança

Presidente da República

Esta semana o indicador da opinião política nas redes sociais ISCTE-IUL mostra Marcelo Rebelo de Sousa a descer nos sentimentos positivos (37% para 23%). No entanto, continua a ser o político português com menores sentimentos negativos, mantendo um valor idêntico ao da semana anterior (19%).

Esta semana as transferências de afetos face a Marcelo Rebelo de Sousa ocorreram dos sentimentos positivos para os neutros (14%), o que demonstra que os portugueses continuam com boa opinião sobre o seu Presidente.

Os movimentos e imobilidades nos sentimentos desta semana são o produto da ausência do Presidente da República em situações de polémica pública (o caso Daesh-Sant’Iago da Espada quase desapareceu das redes sociais) e do seu posicionamento estratégico face ao tema Orçamento 2017. O Presidente sabe que este é o tempo dos partidos e que o seu papel é o de ouvir sem grandes manifestações públicas. O seu comentário aos ordenados dos administradores da Caixa Geral de Depósitos foi a exceção, mas foi feito numa formulação tão longa e afastada de um concordo ou discordo que acabou por permitiu ser entendido como quase positivo pelos dois lados da contenda. A semana de Marcelo Rebelo de Sousa foi assim de “nada a assinalar” para um Presidente da República que tem de se preparar para responder a si próprio dentro em breve: “o que faço eu com este orçamento?”.

Primeiro-ministro e líder da oposição

A maior novidade na mudança de equilíbrios nas redes sociais entre os três políticos semanalmente analisados pelo LCC reside na prestação de Passos Coelho. O líder da oposição ultrapassa pela primeira vez o Presidente da República nos sentimentos positivos – algo que é inédito nos últimos meses. No entanto, sendo esta primeira semana em que a estratégia do PSD se afasta das questões do défice para questões mais concretas (que impostos aumentam?) verifica-se que, nas redes sociais, aumentou o número daqueles que saíram da neutralidade para expressar apoio a Passos Coelho. Esse apoio traduziu-se num aumento de 20 pontos percentuais (de 5% para 25%) dos sentimentos positivos para Pedro Passos Coelho – ficando assim 2% acima dos expressos para Marcelo Rebelo de Sousa.

Pedro Passos Coelho estreita também a distância para António Costa nos sentimentos positivos. Por sua vez, o Primeiro-ministro, passado o efeito positivo da visita à China e dos anúncios de investimento (55%) posiciona-se num valor que é dos mais baixos das últimas semanas (31%) embora não seja o seu mínimo.

Na mesma semana em que Passos Coelho questiona o porquê de o PS não ter mais de 40% ou 50% de intenções de voto, os sentimentos nas redes sociais continuam a dar a liderança a Costa com mais sete pontos percentuais nos sentimentos positivos. Por outro lado, se dermos razão a Churchill e à ideia de que não é a oposição que ganha eleições mas sim os governos que as perdem, então ainda não é o momento para o PSD voltar a ter condições para governar, dado que o líder da oposição continua a gerar mais sentimentos negativos (66%) do que o atual Primeiro-ministro (37%). No cômputo geral, para António Costa a semana de discussão do orçamento não correu de forma demasiado negativa. Pelo contrário, o somatório dos que apoiam o Primeiro-ministro e dos que não manifestam opinião negativa continua bastante distante (63%) da manifestada para com Passos Coelho (34%).

Personalidade da Semana – Ministro das Finanças

Mário Centeno é a personalidade da semana nas redes sociais, muito por causa da apresentação e explicação do Orçamento do Estado nas televisões. O OE é sempre um campo de debate político, pois é a passagem para os montantes financeiros das ideias e projetos que regem a atuação de um partido (ou partidos). Num contexto como o atual, com a vigilância da União Europeia e dos mercados face à saída de uma intervenção externa, a construção e apresentação de um orçamento é ainda mais um ato político central para um governo. Quando, para além de tudo isso, o principal partido da oposição faz do cumprimento do défice o monotema da sua atuação, então o momento é ainda mais central. As notícias da semana demonstraram-no, com a liderança distanciada do orçamento na atenção jornalística.

No entanto, olhar para o que sucedeu nas redes sociais, a propósito do orçamento, apresenta-nos várias surpresas.

Em primeiro lugar, tal como na cobertura noticiosa, a análise dos cidadãos nas redes sociais sobre o orçamento contrapõe, num quase equilíbrio, a visão de copo meio-cheio e a de copo meio-vazio. Ou seja, há quase um equilíbrio perfeito entre os que criticam o OE 2017 e as medidas neles contidas (38%) e os que lhe demonstram apoio (40%).

Em segundo lugar, se excluirmos a simples partilha de notícias pelos cidadãos nas redes sociais, verificamos que são mais as críticas negativas (73%) do que as positivas (37%). Mas, o que poderia parecer a confirmação da ideia de que sempre que um governo fala de impostos os cidadãos criticam as medidas, não se comprova numa análise mais cuidada. A semana do orçamento foi tomada de assalto pelas críticas e sátiras ao Ministro das Finanças e não às medidas do orçamento. A sátira à compostura, aos gestos, à fala e às expressões de Mário Centeno aquando da apresentação televisiva do OE 2017 representaram a maioria das críticas feitas nas redes sociais (35%), face a apenas 28% de críticas negativas às medidas.

Mário Centeno, dadas as suas características peculiares de comunicação, conseguiu centrar as críticas na sua pessoa e não nas medidas apresentadas. Por outro lado, essa concentração de críticas e sátiras pessoais deixa-nos perante um orçamento que, no que respeita às críticas às medidas concretas nas redes sociais, também deixa, à vez, a ideia de ser tanto um orçamento da concórdia como da discórdia.

Ficha técnica:

Neste trabalho foi seguida a metodologia proposta pelo Pew Research na análise de enquadramentos de discussão nas redes sociais através da plataforma de codificação da Crimson-Hexagon. Foram consideradas as redes Twitter, Facebook, Tumblr, Google+ e Blogues. A análise do sentimento considera as categorias ‘positivo’, ‘negativo’, ‘neutro’ ou ‘fora de âmbito’. Informação detalhada sobre o algoritmo pode ser consultada aqui.

 

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