Dra. Pêgo: não fui eu que matei o homem! - TVI

Dra. Pêgo: não fui eu que matei o homem!

    Henrique Machado
    Jornalista
  • 15 out 2021, 12:01
Fernanda Pêgo

Artigo de opinião do editor de Justiça da TVI, Henrique Machado

Depois de ter ordenado à PSP, em 2018, que seguisse, vigiasse e fotografasse à socapa dois jornalistas, entre os quais eu, para perceber quem eram as fontes dos mesmos, o corpo de magistradas do Ministério Público de Lisboa, sob o comando da dra. Fernanda Pêgo, não desarma no combate à alta criminalidade. Agora, investigam-me há 19 meses (dezanove) para perceber como descobri, e noticiei na TVI, um segredo de Estado: que um desgraçado ucraniano tinha sido morto no aeroporto, em março de 2020. Pelo meio, uma procuradora de bom senso até arquivou o processo, mas… era o que faltava. A chefe mandou reabrir. Acontece que, à data da notícia, nem sequer o inquérito estava em segredo de justiça. Pormenores. Qualquer semelhança com perseguição, abuso de poder e mais um ataque à liberdade de imprensa, é pura ficção.  

Aqui vai: a 12 de março de 2020 um imigrante foi assassinado no aeroporto de Lisboa. Os suspeitos eram inspetores do SEF. A 29 de março de 2020, a TVI deu a notícia. Acabaram detidos, acusados e condenados, como se sabe, em maio deste ano. Fim da história? Não. Já os inspetores do SEF andam há meses em recursos, nos tribunais superiores, e ainda o DIAP da dra. Pêgo – agora famoso pela espionagem a jornalistas – empenha meios do Estado num combate sem tréguas… ao jornalismo. Há um ano e meio. E o alvo, novamente, sou eu. 

Mas terei cometido o pior dos crimes de março de 2020 e que, desconfio, será o predileto da dra. Pego no Código Penal, a violação do segredo de justiça? Quem consultar o inquérito do homicídio, e tiver a 2º classe, rapidamente tropeça na resposta: o mesmo não estava sequer em segredo de justiça no dia da notícia. Só passou a estar depois da detenção dos suspeitos. 

Chato, chato, foi quando a investigação por alegada violação de segredo, inicialmente, calhou no DIAP a uma Procuradora, dra. Josefina Fernandes, que sabia o que era liberdade de imprensa, direito à informação. Essas maçadas. Mal me sentei, escaldado com o ‘outro’ DIAP, antecipei-me: “Então a sra. dra. constitui-me já arguido, não é? Como não revelo fontes, uso o direito ao silêncio, assinamos os papéis e vamos embora”. Resposta da magistrada: “Chamei-o aqui como testemunha, fica testemunha. E, se quiser, é o seu código deontológico que o protege de revelar as fontes. Não precisa de ser arguido”. Entende aquela senhora, como entendia a direção de Maria José Morgado, ainda o DIAP era um departamento, alinhar pela doutrina do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem: o jornalista não comete o crime. Se alguém o comete é a fonte. E é só esta, quando identificada por vias lícitas – não por espionagem a jornalistas –, que pode vir a ser acusada.

E explicar isto à dra. Pêgo, diretora? Mal a outra senhora arquivou, a chefe mandou reabrir. Com o dinheiro do Estado, num departamento onde, percebe-se, há falta de trabalho. Na comarca de Lisboa não há corrupção, burlas, fraudes, branqueamento, peculato, desvios de subsídio, homicídios, roubos, raptos nem abusos sexuais para investigar. Digo isto com alguma ironia, embora perceba a indignação, coerência e verticalidade da dra. Pêgo, que desde os tempos em que coordenava a 8ª secção do DIAP, até chegar a diretora, sempre manteve os jornalistas todos à distância.

Percebo tudo, mas há aqui um padrão que já me chateia. A dra. Pêgo, pessoa que não me suscita interesse e magistrada cuja carreira desconheço, parece ter um problema comigo. E isto, obviamente, não teria a mínima relevância pública se o problema fosse pessoal, de consequências pessoais. Acontece que a senhora é procuradora-geral adjunta, diretora do DIAP de Lisboa, e insiste em empenhar os meios do Estado, que também pago, para me chatear. Isto, que não é grave, mas gravíssimo, passou impune no conselho superior da classe a que a senhora pertence – Ministério Público, o “garante da legalidade” –, mas fará o seu caminho, Deus nos dê vida e saúde, nem que seja até ao Tribunal Europeu. Não por mim, mas pela liberdade de imprensa.

Não tenho medo dos processos da dra. Pêgo. Mas, excluindo o conselho superior da classe a que a senhora pertence, não há mesmo ninguém que nos proteja disto? No Estado, quem é que guarda o guarda?

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