O Presidente da República procurou arrefecer a subida da temperatura no quadro político nacional neste mês de julho, reunindo-se com os partidos nesta segunda-feira. Pela terceira vez desde que foi eleito chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa chamou as forças partidárias ao Palácio de Belém. O Presidente está já de olhos postos na elaboração do Orçamento do Estado para 2017 (OE2017) e, num momento em que o país se vê a braços com as pressões europeias, quis apelar à responsabilidade dos agentes políticos. Os partidos mais à esquerda asseguraram em Belém que querem continuar a “caminhada” de “devolução de rendimentos”, recusando uma inversão de políticas. Já os partidos de direita mostram-se preocupados e dizem que o "Orçamento do Estado para 2016 tem sido "claramente incapaz de relançar a economia portuguesa".
O calor do Verão chegou em força neste mês e terá contagiado os agentes políticos nacionais. Pelo menos é esta a teoria de Marcelo Rebelo de Sousa, que, justificou desta forma o clima de forte crispação entre esquerda e direita nos últimos dias. As sanções da Comissão Europeia devido ao incumprimento da meta do défice, a situação da Caixa Geral de Depósitos e, mais recentemente, o falhanço na eleição de Correia de Campos para presidente do Conselho Económico e Social (CES) levaram PS e PSD a esgrimirem argumentos em acaloradas trocas de acusações.
Apesar de ter desvalorizado a questão no domingo e de se ter referido a estes encontros como uma rotina que quer implementar durante o seu mandato, acalmar este ambiente de crispação terá sido uma das preocupações do Presidente da República. É que vem aí um Orçamento do Estado para ser votado, num novo teste à "geringonça", e as pressões de Bruxelas poderão trazer dificuldades que não estavam previstas. Marcelo já admitiu, numa iniciativa em Trás-os-Montes, que vai ficar “mais aliviado nas suas preocupações” quando o OE2017 estiver concluído e aprovado na Assembleia da República.
Os partidos mais à esquerda surgiram alinhados no discurso, depois dos respectivos encontros com Marcelo Rebelo de Sousa: querem continuar a "caminhada" no próximo orçamento com a "devolução de rendimentos". Porém, não dão margem para marcha atrás, nem adiantam uma posição de voto sobre um documento que ainda não existe.
PS: não há crise política à vista
A secretária-geral adjunta do PS considerou que não há nenhuma crise política à vista e manifestou-se confiante num entendimento com os partidos que apoiam o Governo para a aprovação do Orçamento do Estado para 2017.
Parece-me que não há à vista nenhuma questão de instabilidade política, nenhuma crise política. Os acordos estão firmes e estão para durar", declarou Ana Catarina Mendes.
Sobre o Orçamento do Estado para 2017, Ana Catarina Mendes afirmou: "Está a ser preparado, será preparado inevitavelmente com o Bloco de Esquerda, o Partido Ecologista "Os Verdes" e o Partido Comunista, e estou confiante que chegaremos a um bom resultado também em 2017".
A dirigente socialista fez "uma avaliação positiva" dos primeiros oito meses do atual executivo, "pela estabilidade governativa" e "firmeza dos acordos parlamentares" que o sustentam e também "pela coesão dentro dos partidos que apoiam o Governo do PS".
Como principais resultados da governação, apontou a devolução de rendimentos e de direitos e a evolução da economia.
Ana Catarina Mendes defendeu que o PS tem sido capaz de cumprir os compromissos que assumiu com os eleitores, com os seus parceiros políticos e ao mesmo tempo os compromissos internacionais.
É nisso que continuaremos empenhados, não há nenhuma razão para que não continuemos empenhados neste equilíbrio que é necessário", acrescentou.
BE: Marcelo não tem nenhum motivo para intranquilidade
O Bloco de Esquerda (BE) sublinhou que "nunca pactuará com medidas de austeridade", mas informou que "até agora" não houve da parte do Governo "nenhuma indicação de que não queira respeitar o acordo que foi feito".
A coordenadora do BE, Catarina Martins, afirmou que o seu partido está empenhado em manter o acordo com o PS e considerou que o Presidente não tem nenhum motivo para intranquilidade.
"Eu julgo que o Presidente não tem nenhum motivo para intranquilidade. O BE nunca lhe deu motivos para isso."
Catarina Martins abordou ainda o tema das sanções, referindo que os dados da execução orçamental do primeiro semestre, divulgados nesta segunda-feira num comunicado do Ministério das Finanças, são positivos e constituem mais um fator para Portugal rejeitar sanções da União Europeia. Insistiu, por isso, que Portugal deve recusar nas instituições europeias quaisquer sanções.
"Bater-nos-emos contra as sanções, seremos aliados Governo no que for combater as sanções."
PCP rejeita "qualquer inversão"
Por sua vez, o secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), Jerónimo de Sousa, declarou que o partido "estará presente" para prosseguir o caminho de "reposição e conquista de direitos" no OE2017 e "em desacordo" com "qualquer inversão".
"Tudo o que seja este caminho de prosseguir essa reposição e conquista de direitos, o PCP estará presente. Como compreenderão, qualquer inversão deste caminho, reversão, voltar para trás, como o PSD atualmente defende e propõe, naturalmente não estaremos de acordo."
O comunista olha para o próximo orçamento como uma "prova importante", cujos "conteúdos o PCP estará disponível para examinar". Adiantou que têm existido “contactos normais” com o Governo sobre o assunto, mas recusou avançar uma posição de voto sobre um documento que ainda “não conhece”.
Quanto às sanções, Jerónimo de Sousa voltou a condenar as “chantagens e as pressões da União Europeia”.
As mesma ideias foram reiteradas pelo Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), que também se mostrou disponível para “continuar a caminhada”. O deputado do PEV José Luís Ferreira fez um balanço positivo da sessão legislativa, referindo, porém, que seria "prematuro” anunciar uma posição sobre o OE2017 pois este é um orçamento “que ainda não existe".
"A posição conjunta estabelecida com o PS é, de certa forma, uma segunda Constituição. Se há linhas vermelhas, serão aferidas por essa posição conjunta. Sempre direi que ‘Os Verdes' estão disponíveis para continuar esta caminhada que se está a traduzir na devolução de rendimentos e recuperação de direitos dos portugueses."
Sobre um cenário de eventuais sanções europeias, o PEV considera que estas punições são políticas e não têm "qualquer sentido", até porque vários países ultrapassaram o défice, "inclusivamente a França ultrapassou 11 vezes e nunca se falou de sanções".
PAN garante que será "responsável"
Já o partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), que foi o primeiro a ser recebido por Marcelo Rebelo de Sousa, assinalou que será “responsável” quanto ao orçamento e apelou ao mesmo sentido de responsabilidade por parte de todos os partidos. Sem todos os dados em cima da mesa, na altura própria o PAN irá pronunciar-se sobre o assunto, como assegurou o deputado André Silva.
“É extremamente necessário que, neste momento de dificuldade que possa existir, haja responsabilidade por parte daqueles que são os partidos que fizeram esta solução governativa e também daqueles que são os principais partidos da oposição, que se dizem responsáveis."
PSD acusa Governo de falhar na economia
O PSD acusou o Governo de falhar a sua promessa de crescimento económico e manifestou-se também preocupado com a banca, mas defendeu que a maioria parlamentar é estável e que não se antevê uma crise política.
Não vemos nenhum cenário de crise política no horizonte", declarou Sofia Galvão.
A vice-presidente do PSD afirmou que "o Governo tem uma maioria estável no parlamento" a quem compete aprovar o Orçamento do Estado para 2017 e argumentou que "quando há maiorias nos parlamentos não há razões para se pensar em crises políticas".
O PSD não é parte da solução em termos do próximo Orçamento do Estado", frisou.
De acordo com Sofia Galvão, a delegação do PSD teve "uma conversa muito transversal, muito aberta sobre a situação política do país" com Marcelo Rebelo de Sousa, manifestando, sobretudo, "preocupação com o estado da economia".
Os nossos compromissos com o exterior dependem de um desempenho económico que a política do Governo não está a conseguir assegurar. E foi isso sobretudo que transmitimos ao senhor Presidente da República", afirmou.
De acordo com a vice-presidente do PSD, "nesta altura já é possível perceber que os resultados da política económica são o contrário daquilo que o Governo tinha prometido".
O crescimento é um crescimento muito inferior, de acordo com os últimos estudos, àquilo que se prometeu. Nesta altura fala-se em cerca de metade do que era previsível", apontou.
Sofia Galvão disse que "o investimento cai" e que "o emprego não melhorou" e que Portugal está "com níveis de poupança negativa", mas ao mesmo tempo "o consumo interno não é capaz de fazer arrancar a economia".
Esta foi a nossa principal nota, complementada por uma preocupação também com o estado do sistema financeiro e especificamente da banca. Sem banca a funcionar, em condições de financiar a economia, a economia não consegue de facto ter o desempenho de que Portugal precisa", acrescentou.
CDS-PP preocupado sobretudo com a economia
A presidente do CDS-PP, Assunção Cristas, defendeu que "a solução governativa das esquerdas unidas" tem sido incapaz de relançar o investimento e o emprego e parece estar a "empurrar com a barriga" a despesa pública.
A líder do CDS-PP disse que esta conversa com o chefe de Estado "foi sobre esta sessão legislativa e sobre a avaliação deste momento" e manifestou-se preocupada sobretudo com a economia, mas também com a situação do setor financeiro.
Segundo Assunção Cristas, o Orçamento do Estado para 2016 tem sido "claramente incapaz de relançar a economia portuguesa, claramente incapaz de relançar o emprego".
Esta solução das esquerdas unidas não nos parece que esteja a fazer nada de bem à economia, à vida dos portugueses, numa perspetiva de médio e de longo prazo", acrescentou.
Questionada sobre o Orçamento do Estado para 2017, a presidente do CDS-PP respondeu: "Essa não é uma matéria que nos preocupe, porque também não nos ocupa". Interrogada sobre a solidez da atual maioria de apoio ao Governo do PS, remeteu também essa questão para "os seus protagonistas".
Os jornalistas insistiram, contudo, para que esclarecesse se o CDS-PP aceitaria fazer parte de uma solução de Governo em cenário de crise.
Eu não vou estar a comentar nenhum cenário que não está em cima da mesa", retorquiu Assunção Cristas. "Não depende de nós a manutenção ou não da atual solução governativa", acrescentou.