Portas e fechaduras dos Paióis de Tancos não cumpriam segurança - TVI

Portas e fechaduras dos Paióis de Tancos não cumpriam segurança

  • VC com Lusa
  • 22 mar 2018, 00:00

As “deficiências e lacunas” identificadas no relatório que o Governo entregou no Parlamento e que ermete para a investigação criminal a “resposta cabal” ao “quem, quando, porquê e como” foi perpetrado o furto de material militar em junho de 2017

O relatório que o Ministério da Defesa enviou ao Parlamento sobre o roubo de armamento em Tancos revela que as portas e fechaduras dos Paióis não cumpriam os requisitos de segurança exigidos, que não havia “quaisquer sistemas de sensores e de videovigilância em funcionamento” e que a rede de segurança periférica estava degradada. Estas são algumas das “deficiências e lacunas” identificadas nos Paióis. 

No mesmo dossier, o ministério liderado por Azeredo Lopes remete para a investigação criminal a “resposta cabal” ao “quem, quando, porquê e como” foi perpetrado o furto de material militar, em junho do ano passado.

Existem diversas deficiências/lacunas ao nível das estruturas, entre as quais se destacam as seguintes: as portas não têm os requisitos de segurança exigidos; as fechaduras não têm os requisitos de segurança exigidos”.

Verificou-se que faltava material militar, "aparentemente retirado de forma ilícita da unidade, com arrombamento de fechaduras das portas dos paióis 14 e 15 e a pela perfuração da rede exterior de segurança”.

À luz do que foi possível apurar, indica o relatório, “foram praticados sem recurso a violência, mesmo porque os locais de onde foram retirados os materiais não estavam vigiados em permanência”.

Com cerca de 100 páginas, o dossier Tancos 2017: Factos e Documentos apresenta um resumo histórico dos paióis nacionais de Tancos desde a origem, nos anos oitenta do século passado, e as suas “constantes dificuldades e insuficiências”.

O documento, aqui citado pela Lusa, descreve os sistemas de proteção e vigilância, faz uma cronologia dos acontecimentos desde a deteção do furto, a 28 de junho de 2017, estabelece o enquadramento jurídico e as competências legais do governo, forças armadas, ministério público e parlamento, as ações desenvolvidas pelo ministério e pelos ramos militares, em especial o Exército.

Com base num documento do Exército enviado à tutela a 16 de fevereiro, conclui este relatório do Governo que a rede de segurança periférica encontrava-se, à data dos acontecimentos, “degradada em alguns pontos” e havia “para-raios que não estavam operacionais”.

A Casa da Guarda não tem comunicação de rede fixa nem existem meios de comunicação com os postos de sentinela e as rondas móveis, sendo a comunicação assegurada por telemóveis de serviço”.

Mais: o pavimento no exterior estava “em mau estado de conservação” e não havia “quaisquer sistemas de sensores e de videovigilância em funcionamento” naquela infraestrutura de armazenamento de munições.

Nunca foi cumprido número de efetivos de segurança

O relatório aponta “falhas de manutenção sistémica e estrutural”, destacando que nunca foi cumprido o número de efetivos originalmente determinado para a segurança da infraestrutura.

É possível afirmar a existência de falhas de manutenção sistémica e estrutural. Os erros sistémicos estão associados à gestão dos materiais e à segurança das infraestruturas, designadamente a partilha de responsabilidades, que, por vezes, foi associada à falta de unidade de comando”.

Desde a sua origem, em 1987, os paióis nacionais de Tancos foram sujeitos a “sucessivas transformações” e à “alteração constante das responsabilidades de segurança”. Verificou-se uma “contínua chamada de atenção para a falta de efetivos afetos à missão”, bem como uma “preocupação com a segurança efetiva”.

No que se refere aos militares adstritos à segurança dos PNT (Paióis Nacionais de Tancos), nunca, desde a sua instalação, foi alcançado – nem de perto, nem de longe – o `standard´ inicialmente definido como necessário”.

Este número tinha sido estabelecido em 1987 pelo Exército: “um oficial, cinco sargentos, quatro cabos e trinta e quatro soldados, num total de quarenta e quatro efetivos”, a ser atribuído à Escola Prática de Engenharia.

Segundo o ministério, “parece ter-se gerado – logo na fase inicial dos PNT – uma situação de pouca clareza no que toca à responsabilidade efetiva e integral” pela segurança. A “autoridade, responsabilidade técnica e segurança imediata” foram atribuídas à Direção do Serviço de Material.

Contudo, aquela direção atribuiu a “segurança imediata” à Escola Prática de Engenharia, que ficou também com a “segurança próxima”, uma decisão que o ministério da Defesa considera que “justificaria algum reparo” por possibilidade de haver “colisão com responsabilidades de natureza operacional”.

Decorreram cerca de duas décadas entre o momento em que foram estabelecidas orientações relativas aos problemas de segurança, a afetação de efetivos (quarenta e quatro) e os incidentes de 2017 (...) Sob o ponto de vista do comando a nível Exército, a oscilação de responsabilidades entre unidades foi notória, assim como a ausência de medidas assertivas por parte dos comandos superiores”.

Por outro lado, as “sucessivas alterações do modelo organizacional” provocaram “alterações no relacionamento entre estruturas mantidas no terreno”.

O ministério da Defesa frisa no entanto que “já estavam a ser implementadas medidas que procuravam mitigar os riscos identificados em Inspeções promovidas no quadro do Exército”, apontando a intervenção “ao nível dos sistemas de sensores e videovigilância, em especial, desde 2016” e “através de um planeamento em infraestruturas entre 2015 e 2017”.

Quanto a inspeções, o documento revela que a última inspeção geral realizada à Unidade de Apoio Geral de Material do Exército, entre 17 e 18 de fevereiro de 2016, “mais uma vez não abarcou os PNT, referindo apenas que estavam em fase de intervenção ao nível das infraestruturas”.

O material que foi roubado

Com uma área de 40 hectares e um perímetro de 2.700 metros, tinha uma dupla vedação, espaçada cinco metros entre cada uma, e integra 18 paióis, um para o Regimento de Paraquedistas, quatro para o Regimento de Engenharia 1 e os restantes para a Unidade de Apoio Geral de Materiais do Exército.

O relatório descreve a lista do material roubado e reitera que as 44 LAW (arma anti-carro) estavam “obsoletas” como afirmou o anterior chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, Pina Monteiro, juntando “prova documental”.

O documento refere ainda que é o “procedimento adotado para a inativação de engenhos explosivos que permite compreender a discrepância detetada” entre o material roubado e aquele que apareceu a 20 quilómetros, recuperado pela Polícia Judiciária Militar.

“Foi dado como provado que, após um exercício militar em que houve devolução de material explosivo, o arguido (Sargento), por lapso, não atualizou a folha de registo de quantidades de material”, refere o documento, acrescentando que o militar em causa foi punido com uma “repreensão”.

As perguntas que é "legítimo" fazer

Na introdução do relatório, o Ministério da Defesa admite como “evidentemente legítima” a pergunta de “quem, quando, porquê e como perpetrou o furto de material de guerra nos Paióis Nacionais de Tancos”.

Contudo, recomenda que se deverá aguardar “serenamente, para resposta cabal, pelo termo das investigações (que, à data da divulgação deste dossier, ainda decorrem), orientadas por quem de direito, o Ministério Público”.

As sanções inerentes à prova de culpa dependem da avaliação e de um juízo” que é competência dos tribunais. Eventuais decisões de caráter disciplinar suplementares decorrentes desse juízo proveem do exercício de competências exclusivas das chefias militares".

A atuação do ministro da Defesa, descreve o relatório, “consistiu na análise da situação e no dever de adoção de determinações eficientes” e na articulação com outros órgãos de soberania, “sempre no respeito das responsabilidades e tutelas diferenciadas”.

Azeredo Lopes sublinha que a investigação criminal “é uma matéria da exclusiva competência da autoridade judiciária competente, coadjuvada pelo órgão de polícia criminal respetivo”.

Por isso, acrescenta, “não existe aqui, portanto, e não podia existir, qualquer espaço para a intervenção do Governo”, a não ser a garantia do dever de colaboração.

O furto de material militar de Tancos – instalação entretanto desativada – foi detetado a 28 de junho durante uma ronda móvel, pelas 16:30, por um sargento e uma praça ao serviço do Regimento de Engenharia 1.

Inicialmente, o ministro tinha apontado fevereiro como mês de entrega do relatório. Veio a ser entregue só agora.

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