«Cada vez me interessa mais confundir realidade e ficção» - TVI

«Cada vez me interessa mais confundir realidade e ficção»

João Canijo em entrevista, a propósito de «É o Amor», e não só

João Canijo rejeita com veemência qualquer aproximação a um cinema de intervenção social: «Só pela via emocional, eventualmente, nunca pela via programática», garante, apesar da riqueza sociológica dos locais e personagens que escolhe para ancorar os seus filmes. Esse é, a par do trabalho de preparação e coautoria que faz com os atores, um dos traços mais fortes do seu trabalho.

Sobre o segundo ponto, o realizador assume-se feliz por finalmente ter condições para aplicar as suas ideias: «Os produtores não percebem que o investimento no trabalho de preparação com actores não é perdido, pelo contrário. E só agora tenho um produtor, que é também um amigo, que percebe essa ideia e faz um esforço de tesouraria para respeitá-la» conta, situando o início da sua luta nesse particular no ano de 1981, quando trabalhou com o alemão Wim Wenders em «O Estado das Coisas».

«É o Amor» é um documentário, é uma ficção, está na fronteira?

É uma fronteira, e também uma espécie de preparação para o prõximo filme. Cada vez me interessa mais confundir a ficção com a realidade, porque a realidade também é ficção. E isto serviu muito para fazer esta experiência e provar a mim mesmo que funciona. Serviu, porque misturei uma actriz com pessoas reais, que representam o seu próprio papel. A atriz não estava a fazê-lo, mas a fazer um híbrido, porque representava uma atriz que estava a pesquisar para fazer uma personagem, que não existia, para um filme que também não existia. Nesse sentido é também uma ficção, uma representação dela.

Que tipo de relação gostava que o público estabelecesse com este desafio?

A única coisa que me interessa sempre na relação com o público é que este se emocione à sua maneira. E que o filme permita à imaginação do público ir para onde cada um quiser, porque o público não é uma coisa homogénea. A emoção tem passado, e portanto acho que funciona. Estou contente por isso, as pessoas riem-se e comovem-se nas alturas em que deveriam, ou que acham que devem.

Caxinas, como Boticas, em «Mal Nascida», ou o Bairro Padre Cruz, em «Sangue do meu Sangue». A ligação aos locais é tão característica dos seus filmes como o trabalho com atores...

Cada vez mais o meio onde as personagens se vão mover é quase como uma personagem também. Esse meio exige de mim um conhecimento profundo, tem de existir para mim, realmente. E quando isso acontece, forçosamente existe também no filme.

Imagina-se a trabalhar de uma forma mais superficial com atores e locais?

Não, até porque já não tenho idade para fazer encomendas com pressupostos fechados. Este filme foi uma encomenda, da comemoração dos 20 anos do Festival de Vila do Conde, mas tinha um pressuposto que me agradou: ser feito com os alunos das actividades de formação do festival, quase todos alunos das escolas de audiovisuais do Porto. Depois disso, houve uma sugestão, de ser passado nas Caxinas. A partir daí saiu melhor do que a encomenda.

Diz que este filme serviu de ensaio para o próximo, que tem o título provisório de «Caminhos da Alma». O que pode dizer sobre ele nesta altura?

Muito pouco. Não está investigado, nem pesquisado, ainda não houve condições para isso. Mas é, fundamentalmente, uma peregrinação de Trás-os-Montes a Fátima, de um grupo de mulheres. Cada uma com o seu motivo, cada uma com a sua promessa, e o seu olhar para Fátima.
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