Puzzle do clássico: peça a peça, as escolhas de Manuel Machado - TVI

Puzzle do clássico: peça a peça, as escolhas de Manuel Machado

Manuel Machado (Lusa)

Os jogadores (e treinadores) de FC Porto e Benfica analisados por um dos treinadores com o bloco de notas mais usado na história do campeonato nacional. O olhar do conhecimento antes do jogo no Dragão

Manuel Machado senta-se no banco de suplentes, ergue o tabuleiro tático e movimenta as peças de Sérgio Conceição e Bruno Lage. É-lhe um exercício familiar, repetido milhares de vezes ao longo de uma carreira iniciada em 1990 [há 30 anos] e à espera do próximo capítulo.

O treinador de 64 anos é um dos 11 nomes com mais de 400 jogos na primeira divisão e um homem mais do que habituado a defrontar FC Porto e Benfica: 35 jogos oficiais contra os dragões (três vitórias) e 29 frente às águias (duas vitórias).

Um olhar conhecedor sobre o momento das duas equipas e analítico sobre as peças a lançar por Sérgio Conceição e Bruno Lage. Uma conversa com o Maisfutebol a 48 horas do jogo que ajudará a decidir o próximo campeão nacional.

FC Porto pressionado pela «marca de possível reversão»

Manuel Machado vê um FC Porto ainda combalido pela perda do campeonato anterior. É uma equipa que «tarda em recuperar» os índices do «excecional primeiro ano com o Sérgio Conceição».

«Era previsível que houvesse continuidade e progressão em relação ao futebol apresentado nesse ano do título, mas a perda da Liga anterior é marcante. Este é um FC Porto que não vive o seu melhor momento, quer no aspeto técnico, quer no aspeto anímico.»

O experientíssimo treinador considera que os dragões estão «no limite» do atraso suportável. Por outras palavras, os sete pontos são a derradeira «marca de possível reversão».

«Sim, por agora o FC Porto tem uma desvantagem ainda passível de ser diluída. O histórico mostra-nos isso mesmo, mas é sempre melhor estar sete pontos à frente do que sete pontos atrás.»

«Se o FC Porto deslizar no Clássico, acabará por ultrapassar a marca de possível reversão. Essa marca tem estado sempre nos sete pontos. Foi assim na época passada, como foi anteriormente na fase dos duelos entre Vítor Pereira e Jorge Jesus. Sete pontos é o sinal do limite», defende o homem que conquistou seis idas às provas da UEFA ao longo do seu rico percurso.

Benfica é um desenho de «voragem ofensiva»

Manuel Machado sente-se mais confortável «a fazer a ata» do passado do que em avançar prognósticos.

«Desconheço os dados das casas de apostas, mas acredito que não haja uma diferença grande na atribuição do favoritismo. O Benfica tem apresentado melhor qualidade de jogo, mas o fator casa é relevante», acrescenta Manuel Machado sobre o duelo no Dragão.

O Benfica de Bruno Lage, considera, é uma equipa de «voragem ofensiva» e construída para fazer golos. Mais do que para não sofrê-los.

«As apostas feitas denunciam isso mesmo, basta olhar para a composição dos médios das duas equipas. O FC Porto opta por atletas de perfil mais próximos da posição ‘6’, o Benfica tem apresentado médios mais de perfil ‘8’. Isso faz com que se exponha mais e apresente menor solidez em determinadas fases, como vimos nos dois últimos jogos na Luz.»

POSIÇÃO A POSIÇÃO, A ANÁLISE DE MANUEL MACHADO:

Marchesín vs. Vlachodimos: o professor escolhe o argentino

«Nunca trabalhei com nenhum deles, é bom sublinhar isso. A análise feita é a possível de quem observa o comportamento dos atletas em jogo. Só isso. E, nessa perspetiva, tenho de dizer que o FC Porto não ficou a perder em nada com a aposta em Marchesín. É um guarda-redes mais experiente, apresenta um passado rico e tem tirado muitas bolas de golo.»


Corona vs. André Almeida: o professor escolhe a estabilidade encarnada

«Há uma maior flutuação de jogadores no FC Porto na posição. O Benfica estabilizou o lugar com o André e o Tomás Tavares, enquanto o FC Porto tem recuado muitas vezes um dos seus desequilibradores mais criativos. Jogando a lateral, o Corona chega à frente já com 70/80 metros percorridos e não o faz com a mesma frequência. O Benfica está mais estável nesta posição e a dupla André/Tomás oferece mais garantias.»

Mbemba / Marcano vs. Rúben Dias / Ferro: o professor escolhe a dupla das águias

«Com Pepe e Marcano o FC Porto estava a dar uma resposta boa. Gostei de ver o Mbemba em Braga, na Taça da Liga. Uma coisa é ver no estádio e outra é ver na televisão. Fiquei impressionado do ponto de vista individual, mas no contexto do bloco não dará a mesma experiência e qualidade que Pepe confere. O FC Porto perde alguma consistência com isso no imediato. O Benfica tem uma dupla assente na sua formação e que tem dado uma boa resposta. A lesão do Jardel não é relevante, pois tem sido um atleta alternativo esta época. Aqui diria que o Benfica está mais sólido.»

Alex Telles vs. Grimaldo: o professor escolhe o lateral do FC Porto

«Se tivesse de optar entre um, optaria pelo Alex. Julgo que é um jogador mais equilibrado no conjunto de componentes que procuramos num lateral. É mais sólido defensivamente, apresenta melhores ferramentas do ponto de vista físico-atlético e, pelo menos, a mesma capacidade do Grimaldo no aproveitamento da profundidade no corredor. No conjunto dos fatores analisados, e apesar do alto nível do Grimaldo, diria que o Alex Telles está um pouco acima. Podemos também olhar para o número de assistências feitas nos últimos anos.»

Alex Telles e Pizzi em luta no clássico da Luz

Danilo/Uribe vs. Weigl/Gabriel: o professor escolhe a construção do Benfica

«Se o Danilo não recuperar, acredito que avance o Sérgio Oliveira e faça dupla com o Uribe. Mesmo assim, sinto que a dupla Weigl/Gabriel pode dar mais ao jogo naquilo que é a participação na construção ofensiva da equipa. É a tal situação que apontava antes: os médios do FC Porto são de perfil ‘6’ e os médios do Benfica mais de perfil ‘8’.»

Marega/Luis Díaz/Otávio vs. Pizzi/Rafa/Cervi: o professor escolhe a pólvora visitante

«O trio do Benfica tem mais e melhores argumentos nesta altura. Estão bem inseridos no plano da equipa, têm uma chegada fácil a zonas de remate, e o Pizzi é um elemento acertadíssimo na finalização. Marega não está a fazer uma época brilhante, apresenta problemas até no plano da velocidade e na finalização, já para não referir no plano técnico. A intensidade e a capacidade de choque faziam dele um avançado muito difícil de parar, mas não tem utilizado tudo o que tem da melhor forma. Olho com atenção para o Luis Díaz, porque acredito que fará mais no futuro. Caiu num caldo complicado, menos tranquilo, e isso não lhe permite colocar tudo o que tem cá para fora. Já vi bons movimentos dele, espetaculares, mas a espaços. Quando a equipa estiver mais estável, com um suporte de resultados positivos mais constante, pode ser muito influente. Nesta altura, sinto que o Pizzi e o Rafa, principalmente eles, são superiores.»

Grimaldo e Corona conhecem todos os segredos do clássico

Soares vs. Carlos Vinícius: o professor escolhe o momento de Tiquinho

«O Soares é muito forte na área, acredito até que mais forte do que o Vinícius. Não começou bem a época, mas atravessa um momento muito forte [11 golos nos últimos 13 jogos]. Tem feito golos de forma consecutiva e tem-me impressionado pela frieza demonstrada em frente à baliza. Não perde nada para o Vinícius nesse aspeto e aposto no Soares para o Clássico.»

Sérgio Conceição vs. Bruno Lage: técnico do Benfica chega «mais confortável»

«Sendo eu um profissional do mesmo ofício, olho para os treinadores com muito comedimento. A nossa classe é muito suscetível a qualquer palavra menos acertada. Não tenho relacionamento com nenhum deles, não me prende aqui nenhuma empatia ou simpatia. São treinadores a viver momentos diferentes e a postura de ambos denuncia isso mesmo. O Sérgio vive em alguma dificuldade, como é normal quando os resultados não são os esperados, e isso traz à tona alguma fragilidade. O Bruno parte para este jogo em vantagem nesses pontos de vista: a classificação, a estabilidade exibicional, o produto final. O Benfica apresenta dinâmicas mais interessantes, uma plasticidade e uma complexidade no ataque organizado mais harmoniosas. O FC Porto está mais dependente do Corona e do Otávio, está mais centrado na inspiração de algum deles do que na interligação da equipa. De forma resumida, o Bruno Lage chega mais confortável ao Clássico.»

Continue a ler esta notícia