Um avião pode ser mais seguro sem nenhum piloto no cockpit? - TVI

Um avião pode ser mais seguro sem nenhum piloto no cockpit?

Dentro do cockpit de um Airbus A320

Nos anos 60, eram precisos quatro pilotos para comandar um avião. Hoje dois são suficientes, mas já se fala em aviões com apenas um ou sem piloto

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O Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC) emitiu na semana passada uma diretiva que obriga todas as companhias aéreas portuguesas a manter duas pessoas no cockpit em todos os momentos do voo.

Este pode ser um passo atrás em relação à tecnologia, numa altura em que a Embraer já planeia um avião comercial que precisa de apenas um piloto e de uma iniciativa da NASA que estuda a possibilidade de criar aviões sem piloto ou com um sistema em que um dos pilotos fica em terra, podendo comandar até 12 aeronaves em simultâneo.   

Quem dá conta destas mudanças é o psicólogo investigador da NASA Steve Casner que publicou um artigo onde reflete sobre o percurso da aviação até hoje e sobre o possível futuro dos aviões e dos pilotos comerciais.

No artigo, o investigador relembra os aeroportos dos anos cinquenta, onde era possível encontrar tripulações a caminhar com o passo coordenado, com óculos tipo aviador e com roupas que refletiam esmero e glamour.

Há 60 anos, cada avião tinha quatro pilotos, que trabalhavam «como equipas», «tanto no trabalho como no lazer», durante as escalas de vários dias em lugares paradisíacos.

Com o avançar das décadas e da automatização, as tripulações foram sendo emagrecidas. O navegador, um dos membros da tripulação, que costumava consultar as estrelas e descobrir a posição do avião, foi o primeiro a deixar de ser preciso. Depois foi o engenheiro de voo, que observava os sistemas de navegação durante o voo. Foi o GPS e os sensores que fizeram com que estes dois membros fossem trocados por máquinas.

Para o investigador, o que hoje resta são «dois pilotos e um sistema de navegação automática que é usado durante a maior parte do voo».

O passo seguinte é para Steve Casner reduzir a tripulação para apenas um piloto. E até já há provas dadas nesse sentido: um piloto da Delta Airlines mostrou que só é necessário um homem aos comandos do avião, quando o outro piloto do avião em que seguia ficou preso acidentalmente fora do cockpit.

O investigador diz, no entanto, que «devemos estar nervosos com a presença de apenas um piloto no cockpit». «Os estudos revelam que os pilotos cometem muitos erros. É por isso que existem dois no cockpit. Enquanto um piloto opera os controlos do avião, outro mantém-se alerta para erros ocasionais».

Para Casner o problema reside no facto de a automatização não eliminar o erro humano, mas apenas o deslocar. «Os engenheiros e os programadores que fazem a automatização são humanos, também. Criam softwares complexos, que contém erros».

O investigador argumenta que a automatização nem sempre é benéfica: «os pilotos devem permanecer preparados para intervir quando alguma coisa corre mal. Mas os estudos revelam que com a automatização, os pilotos gastam uma grande parte do tempo a conversar um com o outro e a divagar mentalmente.

Para o investigador pode mesmo ser pior ter um avião apenas com um piloto do que um avião sem piloto: «é difícil imaginar um piloto num cockpit, sozinho, a suportar muitas horas de tédio, a ver as suas capacidades a perderem-se, mas ao mesmo tempo pronto para intervir em caso de algum problema».

O investigador também reflete sobre o projeto da NASA para avançar com aviões com apenas um piloto. O projeto prevê que um piloto fique no ar e outro em terra. O que fica em terra tem capacidade para comandar até 12 aviões ao mesmo tempo.

Mas mesmo esta hipótese apresenta falhas para o investigador. «A segurança de um voo não pode depender de uma avaliação a partir do chão. A comunicação pode falhar. E ter uma pessoa a ajudar no fundo da linha de comunicação não é a mesma coisa do que ter alguém lado a lado». O antropologista cognitivo Ed Hutchins mostrou que os pilotos comunicam um com o outro utilizando expressões faciais, a postura, a posição da cabeça, o olhar e até a respiração.

Para o investigador a automatização do cockpit «obriga a questionar a forma como se utiliza a tecnologia para aumentar a capacidade humana».

Mas parece que a evolução teve agora um travão legal já que, depois do acidente da Germanwings que vitimou 150 pessoas na manhã desta terça-feira, grande parte das companhias aéreas vai ser obrigada a alterar as regras de segurança no cockpit, exigindo que em todos os momentos do voo existam dois pilotos na cabine de comandos do avião.

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