Seixal Clube 1925: «o filho» das gentes da terra - TVI

Seixal Clube 1925: «o filho» das gentes da terra

O clube setubalense enfrentou uma grave crise financeira, ficou sem estádio e foi obrigado a extinguir o futebol sénior. Seis anos depois, a paixão e dedicação das pessoas à volta do emblema do Seixal permitiram o renascimento do clube. Um projeto da autoria de Maria Teresa de Andrade que conta com a ajuda de Fusco, figura histórica do Beira-Mar

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CAMINHOS DE PORTUGAL  é uma rubrica do Maisfutebol que visita passado e presente de clubes dos escalões não profissionais. Tantas vezes na sombra, este futebol em estado puro merecerá cada vez mais a nossa atenção.

SEIXAL CLUBE 1925: AF SETÚBAL

Os clubes são dos adeptos. É uma frase cliché, muitas vezes aplicada ao desbarato. No entanto, faz todo o sentido dizê-la quando falamos do Seixal Clube 1925. 

O emblema do distrito de Setúbal caiu num estado moribundo, do qual parecia ser impossível sair. Mas, a força das suas gentes permitiu criar o Seixal Clube 1925, carinhosamente apelidado «filho do Seixal Futebol Clube», superou todas as adversidades e desafiou as probabilidades. 

Antes de avançarmos na história, é obrigatório recuar no tempo. Fundado em 1925, o emblema sediado a sul do Tejo chegou a estar no escalão máximo do futebol português entre 1963 e 1965. Da descida à 2.ª Nacional até à queda para os campeonatos regionais 39 anos bastaram. Após dois anos no distrital, a direção do Seixal Futebol Clube terminou com o futebol sénior.

«O clube chegou a esse ponto devido a uma má gestão por parte de quem estava na Direção. O Seixal FC foi alvo de uma auditoria por parte das Finanças, realizaram-se uma série de penhoras, incluindo do Estádio do Bravo. Quando perdemos o estádio... fui das últimas pessoas a deixar o estádio e posso confessar que foi um dos momentos mais dolorosos da minha vida», contou Maria Teresa de Andrade, atual presidente do renascido Seixal, ao Maisfutebol.

Da esquerda para a direita: Presidente do Seixal Clube 1925, Maria Teresa de Andrade à esquerda na foto juntamente com o Presidente da Câmara Municipal do Seixal, Joaquim Santos (ao centro) e o Presidente da União das Freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, António Santos. Foto cedida por  Hugo Rodrigues


Técnica oficial de contas, Maria Teresa de Andrade detém a sua empresa bem próxima do Estádio do Bravo. Entrou no clube em 2005 com a função de tesoureira, embora sem fazer parte da direção. Ganhou gosto ao clube e não o deixou morrer.

«Sou de Corroios, mas há 23 anos que trabalho no Seixal. Não sou da terra como se costuma dizer, mas é como se fosse, as pessoas conhecem-me. Agarrei o clube com muita garra, honestidade e força. Penso que tudo isso convenceu as pessoas que acabaram por se juntar ao projeto do 'filho' do Seixal Futebol Clube como gosto de lhe chamar», relatou.

A história é corroborada pelo vice-presidente do Seixal Clube 1925, Hugo Rodrigues. «O clube foi reerguido pela atual presidente, Maria Teresa de Andrade. Estava na comissão de gestão do Seixal Futebol Clube e, para o clube não morrer, juntou-se com outras pessoas e fundou o Seixal Clube 1925 em agosto de 2012. Assim este podia competir e, no fundo, sobreviver», sublinhou. 

Completamente ao abandono, o Estádio do Bravo acabou por cair num estado de degradação extrema. Uma cena horripilante.

«O Estádio do Bravo não estava assim tão degradado quando o Seixal FC o perdeu. O clube perdeu o bem patrimonial do Estádio do Bravo, e entre o período de hasta pública até à compra, um processo que demorou cerca de dois anos, ninguém tratou do relvado, ninguém fez a manutenção das instalações. O Estádio do Bravo não era de ninguém e, naturalmente, ficou demasiado degradado», referiu Hugo Rodrigues.

Degradação do Estádio do Bravo (Consultar galeria associada).
 

Estádio do Bravo: foto cedida pelo clube

«O Benfica assinou um protocolo com a Câmara Municipal do Seixal. Esse acordo previa que o Benfica realizasse as obras no Estádio do Bravo e que o entregasse ao município. Por sua vez, a Câmara Municipal do Seixal cedia terrenos ao Benfica. Ficou também estabelecido que o Seixal Clube 1925 tinha o direito de usufruir de um campo sintético no centro de treinos», acrescentou.

Sem instalações próprias, o Seixal Clube 1925 ansiava pelo regresso a casa, entenda-se, ao Estádio do Bravo. E isso foi possível com ajuda camarária. 

«Quando entrei no clube em 2015 deparei-me com inúmeras dificuldades. Queríamos treinar e tínhamos apenas oito bolas, não tínhamos equipamentos de treinos. Enfim, tínhamos muito pouco. Depois ainda estávamos a usar as instalações do Benfica, mas o prazo para usufruir desse espaço estava a terminar. Não tínhamos onde jogar. Gostava de realçar o papel da Câmara Municipal do Seixal nesta fase. Foi muito importante, pois mesmo com as obras ainda a decorrerem, facultou-nos a entrada no Estádio do Bravo. Este processo deu-nos uma alavanca para o sucesso que estamos a ter», frisou o vice-presidente.

Hugo Rodrigues refere-se às pessoas que tiveram a coragem de criar o «filho do Seixal FC» como «autênticos heróis». Com as contas equilibradas e com a casa garantida, surgiu o momento de dar o passo seguinte: recuperar o futebol sénior. 

A formação e o passado como bases para um futuro promissor

 

Equipa sénior: Foto cedida por Hugo Rodrigues


 

Vivia-se o verão de 2017 quando o Seixal Clube 1925 inscreveu-se a equipa sénior para competir no campeonato distrital da AF Setúbal. A reativação do futebol sénior surgiu como necessidade de potenciar o trabalho desenvolvido na formação como o próprio Hugo Rodrigues explicou.

«O nosso projeto tem como base a formação. O Seixal FC foi sempre uma referência em termos de formação, por isso, se queríamos ter o clube de volta tínhamos de ter como base a formação. Como pensamos? Temos um bom exemplo no basquetebol, modalidade que teve sempre como base a prata da casa. Transportámos essa ideia para o futebol. A nossa aposta passa por formar jogadores, diretores e treinadores. Quando um atleta chega aos juniores tem de ter possibilidade de dar o passo seguinte. Se não tivesse essa possibilidade, certamente não queria estar aqui. Para termos bons juniores temos de ter bons juvenis e assim sucessivamente. Regressámos aos seniores porque tínhamos condições para tal, quer em termos de espaço quer em termas financeiros. No fundo foi para dar continuidade à formação», esclareceu. 

A média de idades do plantel do Seixal Clube 1925 ronda os 23 anos o que dá razão à ideia partilhada pela direção. Todavia, o emblema do Seixal não tem apenas atletas oriundos da formação. Arriscou e foi à procura de recuperar jogadores que já tinham representado o clube. É o caso, por exemplo, de Paulo Silva. Aos 47 anos decidiu calçar outra vez as luvas após um interregno de cinco anos.

«Deixei de jogar e comecei a ajudar o Fusco aqui no Seixal Clube 1925. Era o treinador de guarda-redes dos seniores e um dia, na brincadeira com o Tiago Correia [treinador e irmão de Rui Correia do Paços de Ferreira] disse-lhe que era capaz de voltar a jogar. Apostei com o treinador que ainda era capaz de jogar e assim foi», disse ao nosso jornal. 

Por que razão se volta a jogar aos 47 anos e depois de cinco anos sem jogar? «Ficamos contentes quando somos bem tratados. Em seis anos no clube não tenho nada a apontar a quem quer que seja. Moro perto e mesmo depois de sair do Seixal mantive a relação com as pessoas daqui. Fizeram parte da minha vida, tanto no futebol como fora dele», respondeu.

Além do veterano guara-redes, o Seixal Clube 1925 recuperou Fusco. Sim, esse mesmo: figura histórica do Beira-Mar (chegou a vencer uma Taça de Portugal) e também ele produto da formação do extinto emblema lisboeta. 

«Sou coordenador do futebol, mas faço tudo o que for preciso. Tenho dois clubes no coração: o Beira-Mar e o Seixal. Foram marcantes para mim. Já tinha estado no clube em 2005 exatamente na mesmo função. Voltou a surgir o convite e agarrei-o com tudo o que tinha. Devo muito às pessoas daqui e quero retribuir», sustentou o atual funcionário camarário.

O Seixal Clube 1925 quer trilhar o caminho da ressurreição com quem conhece o clube. Para já os passos dados foram certos e os números refletem o crescimento.

«Temos jogadores desde os três anos até aos 70 anos. Em quase todos os escalões temos mais de duas equipas. Foi um crescimento brutal. Nos primeiros quatro anos tínhamos cerca de 70 atletas só no futebol. Neste momento, contabilizando os veteranos, temos 300 atletas [ndr: 357, clube com mais atletas inscritos na AF Setúbal dados oficiais]. As pessoas acreditaram no nosso projeto e o facto de termos ido buscar treinadores e jogadores formados no Seixal FC e acabou por trazer muita gente para o clube», elucidou Hugo Rodrigues.

O plantel sénior do Seixal Clube 1925 «não recebem nada» diz o mesmo dirigente, sublinhando que o trabalho é desenvolvido «com muito amor à camisola». 

Libertado do passado sombrio, o Seixal Clube 1925 está a despertar.

Atual Complexo Municipal do Bravo:

 

Foto: PTDRONICA cedida por Hugo Rodrigues



 

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