O «gigante adormecido» que está a acordar à «boleia» de uma cidade inteira - TVI

O «gigante adormecido» que está a acordar à «boleia» de uma cidade inteira

Tirsense (facebook Tirsense)

O Maisfutebol dá a conhecer a nova realidade do Tirsense, um histórico do futebol português que tenta voltar aos anos de glória

CAMINHOS DE PORTUGAL é uma rubrica do Maisfutebol que visita passado e presente de clubes dos escalões não profissionais. Tantas vezes na sombra, este futebol em estado puro merecerá cada vez mais a nossa atenção.

FUTEBOL CLUBE TIRSENSE: AF PORTO

Oito presenças no principal escalão do futebol português; uma II Liga e uma Segunda Divisão (que atualmente corresponde ao Campeonato de Portugal) conquistadas. São estes alguns dos maiores feitos do Futebol Clube Tirsense, sediado na cidade de Santo Tirso, em 81 anos de história.

A última participação na I Liga remonta à longínqua época de 1995/1996, e de lá para cá, o emblema jesuíta somou alguns dissabores e problemas financeiros que o levaram até à Divisão de Elite da Associação de Futebol do Porto.

Agora, nos distritais portuenses, o Tirsense tenta reencontrar-se com o velho passado de glória e, apesar de o caminho ser longo e sinuoso, começam a dar-se os passos certos nesse sentido.

«Dos três grandes eu sou do clube da minha terra»

Fernando Matos, 56 anos, presidente do conjunto de Santo Tirso há praticamente cinco. Adepto do «clube da Terra» desde que nasceu, o dirigente recorda ao Maisfutebol os tempos áureos de I Liga e explica parte do problema que levou o Tirsense a afastar-se do topo do nosso futebol.

«É o clube da nossa terra, dos três grandes eu sou do clube da minha terra, tenho memórias muito boas. Lembro-me de jogos aqui com o Sporting, Benfica, FC Porto… são boas recordações que estão longe dos nossos horizontes nesta altura», começa por dizer, saudosista.

«Todos os clubes têm dificuldades e o Tirsense também passou por elas. Descemos três ou quatro vezes seguidas, da I Liga até aos distritais e tudo isso deixou marcas. Se calhar poderá ter havido exageros nos tempos em que andámos lá em cima e eles refletem-se ainda hoje, tudo isso se paga. Mas agora o caminho é pôr o Tirsense no sítio que merece», prossegue.

Financeiramente, diz Fernando Matos, a questões de maior urgência estão ultrapassadas e agora olha mais para a parte desportiva: «Nesta altura o mais importante é organizar o clube. (…) Agora estamos a pensar mais na parte desportiva, porque a parte financeira conseguiu-se minimamente [resolver]… porque esses reflexos do passado ainda vão aparecendo.»

Foto: facebook Tirsense

Ora, a cumprir a terceira época consecutiva na Divisão de Elite da AF Porto, os jesuítas estão em bom plano no campeonato, tendo inclusivamente subido ao segundo lugar da prova no passado fim-de-semana, posição que dá acesso ao play-off de subida.

Ainda assim, Fernando Matos prefere manter os pés bem assentes no chão.

«O que eu digo é que vamos jogo a jogo e vamos continuar com a forma com que temos estado até agora. Não estamos a embandeirar em arco só porque estamos em segundo, as contas vamos fazê-las só no final. Se fizermos o nosso trabalho bem feito, de certeza que tudo vai correr bem.»

Se dentro do campo as coisas têm corrido bem à equipa de Santo Tirso, fora dele então pode dizer-se que tem corrido ainda melhor. Apesar de atuar nas divisões distritais, os adeptos do clube têm acorrido em massa ao Estádio Abel Alves de Figueiredo e já houve jogos em que a assistência bateu as sete mil pessoas, números superiores até a muitas partidas da I Liga.

VÍDEO: Tirsense-Lousada teve mais de sete mil adeptos nas bancadas

E é aqui que entra em cena João Coelho, o «faz tudo» do Tirsense. Entrou no clube para gerir as redes sociais, mas rapidamente se tornou responsável pelas áreas de comunicação, assessoria e marketing

Ao nosso jornal, João Coelho explica-nos o que está a ser feito para encher o Abel Alves de Figueiredo.

«Nós sempre fomos um clube com história e com boa massa associativa, já o ano passado éramos o clube com mais adeptos no estádio, mas queremos levar isto ao próximo passo, criar uma onda de apoio em volta do clube e estamos a conseguir», começa por referir, acrescentando que esta dinâmica também surge da necessidade de obter «receitas financeiras».

Segundo revela ainda João Coelho, retomar a ligação perdida desde os «célebres anos 90» com as empresas da cidade tem sido fundamental.

E como se faz isso?  «Entramos em contacto com as empresas, que durante uma semana são promovidas pelo clube e o que depois elas fazem é dar-nos um valor financeiro que permita cobrir a compra de bilhetes, o que nos dá a capacidade de oferecer esses mesmos bilhetes.»

«Por exemplo no primeiro jogo em casa oferecemos mil bilhetes e o valor que a empresa nos deu simbolizava a compra desses bilhetes», acrescenta.

Além disso, há um trabalho a ser feito pelos jogadores: «Também temos tido algumas iniciativas durante a semana. Fizemos uma larga campanha com vídeos promocionais, os nossos jogadores foram a lojas dar autógrafos… temos tentado retomar essa ligação perdida com a cidade e temos tido também um enorme crescimento a nível digital, nas redes sociais.»

Foto: facebook Tirsense

Ora, por falar nas redes sociais, é esse o caminho a seguir pelos clubes que atuam em campeonatos com menor dimensão para contrariar a dinastia dos «grandes»?

«Sim, penso que o que importa fazer é uma ligação necessária. Os clubes grandes não o precisam de fazer, porque as pessoas já os têm como referência, e os clubes pequenos, em termos de divisão, porque acho que o Tirsense é um clube com uma dimensão enorme, têm de fazer essa ligação», argumenta.

«Enquanto que os adeptos vão atrás do FC Porto, Benfica e Sporting, por exemplo das redes sociais e das iniciativas, neste caso acho que acontece exatamente o contrário, a iniciativa tem de ser do clube e o clube é que tem de ir buscar os adeptos.»

Esta ligação aos adeptos é importante não só para o presente, como também para assegurar o futuro: «A massa associativa do Tirsense já tem alguma idade, são aquelas pessoas que estavam connosco na altura da I Liga, e muitas das pessoas de média idade desligam-se um bocado do clube.»

«Esse é um dos passos que temos feito, rejuvenescer, temos de assegurar o futuro do clube, e não há melhor futuro do que investir a nossa dedicação e o nosso trabalho em jovens e nós temos visto isso, muita juventude a aparecer no estádio.»

«É um clube especial, um gigante que está adormecido e o nosso objetivo é recuperá-lo e voltar a acordá-lo»

José Vilaça, 33 anos. Começou a jogar futebol aos dez, na formação do Tirsense, e ficou no clube por mais 18 anos, até sair para o Famalicão, em 2013.

No conjunto de Famalicão subiu à II Liga e impôs-se de tal maneira que chegou a capitão de equipa. Depois de quatro anos no Vila Nova, saiu para o Aliança de Gandra e para o Merelinense, ambos do Campeonato de Portugal, mas após apenas uma época, desceu até à Divisão de Elite para voltar ao «seu» Tirsense.

Foto: facebook Tirsense

«O que me fez regressar? Com a minha idade já começo a pensar numa perspetiva de trabalho, de conseguir conciliar o trabalho com o futebol, que é o que eu faço. E também pelo projeto que me foi apresentado, para fazer com que o Tirsense voltasse aos campeonatos nacionais, e eu aceitei», começa por contar ao nosso jornal.

Tal como Fernando Matos, Vilaça diz que é «jogo a jogo» que os jesuítas têm de pensar, mas afirma que os próximos desafios são fundamentais.

«Temos agora alguns jogos importantes, se nesses jogos tivermos dois resultados positivos sabemos que estamos mais perto de ir à fase final disputar a subida. Neste momento é jogo a jogo, mas se conseguirmos bons resultados nos próximos jogos estamos mais perto de ir à fase final e aí sim, depois o nosso objetivo passa pela subida de divisão.»

Habituado a uma grande envolvência de adeptos à sua volta, já que o Famalicão também tem uma forte massa associativa, o defesa assume que os jogadores jesuítas se têm «sentido privilegiados e contentes» por terem «o estádio cheio de domingo a domingo» e que está num clube especial.

José Vilaça, num jogo ao serviço do Famalicão frente ao Sporting

«Quem vem de novo para o Tirsense rapidamente se integra e percebe que o Tirsense é um clube especial. Neste momento sinto-me privilegiado por voltar ao clube da minha terra, onde fiz a formação e passei alguns dos melhores momentos da minha carreira», conta.

«Para mim é especial [regressar] e para os outros jogadores que estão cá neste momento também, assim como os que possam vir no futuro. É um clube especial, um gigante que está adormecido e o nosso objetivo é recuperá-lo e voltar a acordá-lo», remata.

Depois da época dourada vivida principalmente nos primeiros anos da década de 90, onde até conseguiu um histórico 8.º lugar na I Liga, o Tirsense trilha agora o caminho para regressar à elite do futebol português e conta com uma boleia de luxo: a cidade de Santo Tirso.

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