«J. Edgar»: a nova perspectiva de Eastwood esquece-se de muito - TVI

«J. Edgar»: a nova perspectiva de Eastwood esquece-se de muito

Filme com Leonardo DiCaprio como fundador do F.B.I. chega às salas portuguesas

Em «J. Edgar», Hollywood revisita mais uma personagem incontornável da história dos Estados Unidos. Desta vez, Clint Eastwood não escolheu um presidente norte-americano, mas escolheu um homem que lidou com oito presidentes dos EUA. J. Edgar Hoover foi o fundador do F.B.I. como agência de combate à criminalidade em solo norte-americano e fê-lo com extrema competência; assim como pagou um preço por isso. O filme é Isto, numa nova perspectiva.

Hoover é visto como o responsável pelo mais famoso departamento policial do mundo, mas é também equiparado na respectiva proporção como um dos maiores «sacanas» que os EUA tiveram em lugares decisivos para a sua nação. E é comumente aceita que ele, nesta forma, chegou a ser «o homem mais poderoso» do país das «stars and stripes».

Estas característica «gerais» do carácter de Hoover e da sua vida fazem parte da história conhecida pela generalidade das pessoas, sejam elas norte-americanas ou de outra nacionalidade, mas minimamente interessadas. Quanto a isto, nada de novo. Clint Eastwood apresenta-o é numa perspectiva dupla: na sua forma humana, além da desumana, mesmo que as duas acabem por fundir-se.

Para este «J. Edgar», o realizador octogenário escolheu Leonardo DiCaprio. Encontrar um actor que encaixasse num papel que vai dos vintes aos setentas era complicado. DiCaprio acaba por se revelar uma boa aposta. Não deslumbra. Mas cumpre a tarefa. É um pouco como o filme. Bem suportado por Armie Hammer e Judy Dench (Naomi Watts merece sempre mais para o talento que tem), os ingredientes para ter apreciação positiva estão lá. Mas faltam temperos para que o gosto perdure e não se desvaneça com facilidade.

«J. Edgar» acaba por ser um filme de um homem que foi quem foi, mas que podia ser outra personagem qualquer, de ficção, por exemplo. A força para marcar o que se vê, num ano de cinema por exemplo, falta ¿ e este tipo de filmes são ideais para isso. O trabalho de Eastwood sobre Hoover podia seguramente ter mais uma hora, porque se a perspectiva não é a puramente histórica, a figura em questão obriga a mais pormenores, mais enquadramento, em suma, a mais factos; pois a maior parte das pessoas não intuirá automaticamente todo o quadro histórico envolvente de muitos momentos em particular ¿ independentemente da nacionalidade dos espectadores, norte-americanos incluídos.

No fundo, está-se a fazer um filme sobre uma figura histórica, mesmo que a sua forma humana seja a dominante. E, já se disse, essa fora humana é indissociável da forma desumana com que Hoover faz parte da história. E era melhor haver mais desta.

Clint Eastwood foi económico no enquadramento indispensável para mostrar o J. Edgar Hoover que revela dependente da mãe, bissexual e dependente dos muito poucos que escolheu para terem a sua confiança, o implacável que tudo o que fazia estava desprovido de emoções e não era decidido sem ter as consequências previamente equacionadas. O realizador explora como era este homem na sua vida pessoal mostrando também como resultava naquilo que dele se conhece. Mas esta última parte fica aquém. A figura está perfeitamente lá, mas como que pairando acima de uma realidade que não é suficientemente bem exposta.

Eastwood «não enganou» ninguém, não obstante. O filme que chega esta quinta-feira às salas de cinema portuguesas foi deliberadamente chamado «J. Edgar» e não outra coisa qualquer com «Hoover» no título. O resultado é que também deixa a ideia de que podia ser algo mais. Pois não chegou ele a ser o homem mais poderoso dos Estados Unidos que exerceu o seu mandato ao lado de oito presidentes? Sim, já se sabe. Como? Fica-se pela rama.
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