Jogou com Walcott e Bale, agora trabalha na Mango do Chiado - TVI

Jogou com Walcott e Bale, agora trabalha na Mango do Chiado

Feliciano Condesso foi para Inglaterra com 16 anos, fez parte de uma geração de ouro do Southampton e treinou no Villarreal com nomes como Cazorla ou Riquelme; somou 45 internacionalizações pelas seleções jovens de Portugal e terminou a carreira aos 27 anos, após três roturas de ligamentos

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«Depois do Adeus» é uma rubrica dedicada à vida de ex-jogadores após o final das carreiras. O que acontece quando penduram as chuteiras? Como sobrevivem os que não ficam ligados ao futebol? Críticas e sugestões para o email vhalvarenga@mediacapital.pt.

Feliciano Condesso trocou Setúbal por Southampton aos 16 anos e fez parte de uma geração de ouro do clube, chegando à final da FA Youth Cup na época 2004/05. Nessa equipa de sub-18, que perdeu o jogo decisivo frente ao Ipswich, estavam jogadores como Theo Walcott (Everton), Adam Lallana (Liverpool) e Gareth Bale (Real Madrid).

O médio ofensivo saiu do Vitória de Setúbal para crescer no futebol inglês e, pelo caminho, acumulou 45 internacionalizações pelas seleções jovens de Portugal, participando no Campeonato da Europa de Sub-17 em 2004, no Campeonato da Europa de Sub-19 em 2006 e no Mundial de Sub-20 em 2007, tristemente recordado pelo momento em que Zequinha decidiu tirar o cartão vermelho das mãos de um árbitro.

Nessa altura, Feliciano Condesso já tinha cumprido a primeira temporada no Villarreal, em Espanha. O setubalense jogou pela equipa B mas ainda treinou com nomes consagrados como Cazorla ou Riquelme, sob o comando técnico de Manuel Pellegrini. Após três épocas no Submarino Amarelo, representou Logroñés e Ontinyent, regressando a Portugal em 2011.

A primeira rotura de ligamentos surgiu aos 24 anos, quando jogava no Estrela das Vendas Novas. Na temporada seguinte, foi para o Oriental e sofreu mais uma. Seguiu-se o União de Montemor e a terceira rotura de ligamentos. A última. Não aguentava mais. Aos 27 anos, terminou a carreira e arregaçou as mangas.

Feliciano Condesso foi para os armazéns do El Corte Inglês e da DHL fazer descargas. Entretanto, conseguiu entrar na área do vestuário e tem crescido até um patamar de saudável estabilidade. Aos 32 anos, é Visual Merchandiser na secção de homem da Mango do Chiado, a maior loja da cadeia no país.

«As minhas lesões foram um mal que veio por bem. Hoje em dia tenho a estabilidade que não teria se tivesse continuado a jogar», resume o antigo internacional português.

Maisfutebol – Recuemos até 2003. Como foi sair do Vitória de Setúbal e ir para o Southampton tão novo, sozinho, com 16 anos?

Feliciano Condesso - Da minha geração penso que fui o primeiro a ir para o estrangeiro tão novo. Nos primeiros meses, percebi logo que a formação em Inglaterra estava muito mais avançada. No Vitória de Setúbal nunca tinha feito um treino de ginásio, por exemplo, enquanto no Southampton havia planos individuais para todos os atletas, preocupavam-se com treino, alimentação, etc. Tínhamos uma grande equipa no Southampton, quer nos sub-18, quer depois na equipa B. Estavam lá, entrou outros, Theo Walcott, Adam Lallana, Nathan Dyer, Tim Spar, que agora é o capitão da seleção da Finlândia, e o Gareth Bale, que era mais novo mas jogava connosco.

MF – Qual era o jogador mais promissor dessa geração?

FC - O melhor de todos era claramente o Walcott, estava num patamar superior, e também o Lallana. O Bale tinha coisas boas mas só mais tarde deu um salto, quando apostaram claramente nele. Por exemplo, ele não era possante, não fazia ginásio, e entretanto melhorou muito nesse aspeto. O Bale era lateral esquerdo, fez toda a formação nessa posição e nem na equipa principal do Southampton foi extremo. Ele deu um grande salto com o Harry Redknapp, no Tottenham, e a partir daí é a história que todos conhecem.

MF – O Gareth Bale tem sido criticado no Real Madrid por alguns comportamentos. Como era ele nessa altura?

FC - O Bale que vemos hoje em dia é exatamente igual ao que era nessa altura. Era um rapaz super-tímido, estava sempre sossegado no canto dele e pouco participava nas atividades de grupo. Não me surpreende quando o vejo agora a sair do estádio com a equipa dele ainda a jogar. Curiosamente, foi o que teve mais sucesso de todos, porque ganhou quatro Ligas dos Campeões, entre outros títulos, mas não era o maior talento daquela geração.
 

Feliciano Condesso é o primeiro na fila de baixo, da direita para a esquerda; na fila de cima estão
Adam Lallana (primeiro da direita para a esquerda), Theo Walcott (terceiro) e Gareth Bale (quarto)

MF – Voltando a si. Foi também por ir em Inglaterra que começou a ser chamado para as seleções jovens de Portugal.

FC – Exato. Já estava em Inglaterra quando, em fevereiro de 2004, representei a Seleção de sub-17 de Portugal no Torneio Internacional do Algarve, em que fui o melhor jogador. Depois disso fomos ao Campeonato da Europa de sub-17, ficando no terceiro lugar. Em 2006 disputei o Campeonato da Europa de sub-19, mas infelizmente não passámos a fase de grupos.

MF – Esteve três épocas no Southampton mas acabou por sair em 2006 para o Villareal B. Porquê?

FC - Em 2006, estava na equipa B do Southampton, o treinador mudou e quem chegou não estava a apostar nos jovens, começou a utilizar a equipa B para colocar a rodar jogadores que precisavam de ritmo. Muitos jogadores saíram nessa fase e, como era ano de Mundial de sub-20, acabei por fazer o mesmo. Fui para a equipa B do Villarreal, mas tenho de dizer que fui um pouco abandonado pela pessoa que me levou para Espanha.

MF – Não chegou a jogar pela equipa principal do Villarreal. De qualquer forma, foi uma experiência positiva?

FC – Claramente. Senti-me privilegiado por viver experiências únicas. No Villarreal, joguei na equipa B, fui convocado para alguns jogos da equipa principal, estive no banco mas não cheguei a ser utilizado. De qualquer forma, treinei várias vezes com o plantel principal, com o treinador Manuel Pellegrini e vários jogadores como Cazorla, que era fabuloso, o grande Riquelme, Robert Pires, Godín, Forlán, etc.

MF – Em 2007, disputou o Mundial de sub-20 por Portugal. Lamenta que o trajeto dessa geração tenha sido manchado pelas expulsões de Mano e Zequinha frente ao Chile?

FC - É uma pena que aquela geração seja apenas recordada pelo que aconteceu no final do jogo com o Chile, já nos oitavos de final da prova. Conseguimos passar o Grupo B, em que estava o México, eu até marquei um golo à Gâmbia, mas depois perdemos por 1-0 com um Chile que tinha jogadores como Arturo Vidal, Alexis Sanchez, Medel, Isla, etc. E o que ficou na história, o que os adeptos recordam, é apenas um momento infeliz do Zequinha , que sente muito o futebol, depois de uma entrada mais no limite do Mano, dois jogadores que conheço bem. Reduzir o trajeto de uma geração a esse final de jogo com o Chile é muito triste.

MF – Após três épocas no Villarreal B, ainda jogou no Logroñés e no Ontinyent. Sente foram as melhores opções para a sua carreira?

FC - Nunca joguei na Liga portuguesa, ao contrário dos outros jogadores da minha geração, mas se voltasse para trás, faria tudo igual. Joguei em Inglaterra, joguei em Espanha, em Inglaterra por exemplo tive a oportunidade de tirar um curso proficiency de inglês, o mais elevado, e isso é extremamente útil para mim atualmente. Trabalho numa loja numa zona altamente turística e falo fluentemente inglês, espanhol e francês, já que as minhas raízes são da República Democrática do Congo.

MF – Regressou a Portugal em 2011 mas acabou no Estrela de Vendas Novas, do terceiro escalão. Com o seu currículo, não esperava conseguir algo melhor?

FC - Quando voltei a Portugal, tinha na mala a minha qualidade, mas digamos que não tive uma entrada fácil no futebol português. Vou-lhe confessar: tinha tudo acertado para ficar no Atlético, na II Liga, com o mister João de Deus. Havia a questão do passe internacional, mas até me ofereci para pagar do meu bolso esse passe e ficar a receber o salário que entendessem, porque queria relançar a carreira. A situação arrastou-se até 31 de agosto e acabei por ficar sem clube. O Atlético preferiu apostar em jogadores emprestados pelo Benfica e pelo Sporting e eu acabei por ir para o Estrela de Vendas Novas, da II Divisão B. Dois ou três meses depois, tive a primeira lesão grave no joelho e foi o princípio do fim.

MF – O que aconteceu depois?

FC - Tive três lesões nos joelhos em quatro anos. Duas no joelho direito e uma no esquerdo, sempre nos ligamentos cruzados. Acabei a carreira aos 27 anos e foi porque não conseguia mesmo continuar. Tive a primeira lesão no Estrela de Vendas Novas, dois ou três meses depois do início da época. Ainda em recuperação, fui contratado pelo Oriental, fiz meia época lá e lesionei-me de novo. Já não me sentia feliz a jogar futebol, fui para o União de Montemor, fiz uma época e a meio da segunda tive a terceira e última lesão. Ainda treinei cerca de três semanas no Alcochetense, mas já não dava mesmo para continuar.

MF – Hoje em dia, sente limitações por essas sucessivas lesões nos joelhos?

FC - Consigo andar normalmente, fazer ginásio de forma regular, mas nunca mais tentei jogar futebol. Há cerca de dois anos, comecei a interessar-me mais pela corrida e tenho participado em corridas. A 22 de março vou fazer a prova de 10 quilómetros aqui em Lisboa.

MF – Quando é que começou a trabalhar em áreas fora do futebol?

FC - Como jogava numa II Divisão B em Portugal, os valores que ganhava já não eram muito altos. Comecei por trabalhar nos armazéns do El Corte Inglês, depois a fazer igualmente descargas, mas na DHL. Trabalhar nunca foi problema para mim, também pelo meu background. Sempre fui humilde, sempre fiz o que tinha de ser feito.

MF – Como é que passou para a área do vestuário?

FC - Comecei a enviar currículos e fui trabalhar para a Armani do Freeport, em Alcochete. Mais tarde, chamaram-se para a Mango de Setúbal e, como moro na cidade, mudei. Comecei como vendedor part-time em Setúbal, já estive na loja da Avenida da Liberdade e atualmente estou na Mango do Chiado, a maior loja do país.

MF – Foi difícil adaptar-se a essa nova realidade?

FC – Ao início foi, porque não sabia muito bem distinguir uma peça de algodão de uma peça de lã, fazer uma bainha, etc. Atualmente já me sinto confortável com isso. Sou Visual Merchandiser, cuido da planta da secção de homem da Mango. No fundo, tendo em conta vários parâmetros como tendências, épocas no ano, especificidades do mercado, preços, determino a planta da loja, também seguindo as diretrizes gerais da empresa.

MF – Nota-se que está feliz. Sente-se realizado a desempenhar essa função, cinco anos depois de ter terminado a carreira precocemente?

FC – Sinto-me, sinto-me mesmo. Sinceramente, sinto que foi um mal que veio por bem, porque neste momento tenho estabilidade e, se continuasse a jogar depois das primeiras lesões, provavelmente ainda estaria naquele nível, no terceiro escalão. Não tive formação de base nesta área mas fui aprendendo, tive algumas formações já na empresa e hoje estou seguro que desempenho bem as minhas funções.

MF – Para terminar, por curiosidade, como é que faz diariamente a viagem entre Setúbal e Lisboa, para a zona do Chiado?

FC – Ora bem, eu faço horários rotativos, nem sempre apanho os maiores fluxos de pessoas. Mas atualmente vou para Lisboa de transportes públicos e adoro! Desde que baixaram os passes, consigo ir e vir por 40 euros por mês e demoro cerca de uma hora. Mesmo quando há greves, há várias alternativas para ir e vir. É muito melhor que ir de carro e adoro fazer o trajeto. Muitas vezes até levo a bicicleta para fazer parte do percurso.

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