Bruno Conceição: a segunda pele entre calçado e marroquinaria - TVI

Bruno Conceição: a segunda pele entre calçado e marroquinaria

Bruno Conceição

Guarda-redes terminou a carreira em 2013, quando descobriu que tinha um mieloma múltiplo, que se encontra estabilizado

«Depois do Adeus» é uma rubrica dedicada à vida de ex-jogadores após o final das carreiras. O que acontece quando penduram as chuteiras? Como sobrevivem os que não ficam ligados ao futebol? Críticas e sugestões para o email vhalvarenga@mediacapital.pt. 

Em março de 2014, quando o seu problema de saúde foi tornado público, Bruno Conceição confessou ao Maisfutebol que tinha pela frente o maior desafio da vida: a luta contra um mieloma múltiplo, diagnosticado meses antes.

O guarda-redes de São João da Madeira terminou abruptamente a carreira, com 32 anos, depois de representar clubes como Sanjoanense, Infesta, Esmoriz, Varzim, Paços de Ferreira, Beira Mar, Arouca e Trofense.

Em outubro de 2019, o Maisfutebol volta a cruzar-se com Bruno Conceição e descobre um cenário positivo, de doença estabilizada e um novo caminho desbravado. O convidado deste «Depois do Adeus» despiu a pele de jogador profissional para abraçar uma segunda pele, como agente comercial, entre calçado e marroquinaria. 

Maisfutebol - Antes de mais, como vai a luta contra o mieloma múltiplo?

Bruno Conceição - Não estou curado do mieloma mas a doença está estabilizada. Sou controlado mensalmente no Hospital de Santo António e tenho uma vida completamente normal, evitando apenas desportos de contacto, porque no meu caso, o excesso da proteína (plasmocitos) origina-me fragilidades nos ossos e maior risco de fractura.

MF – Mas o que aconteceu desde que foi detetada a doença?

BC - Em setembro de 2013 fiz um autotransplante que não resultou. Depois da campanha de recolha que realizei em 2014, para ajudar outras pessoas e a mim, encontrei um dador compatível mas os médicos acharam por bem não avançar para o transplante, por causa do risco de rejeição por parte de um dos órgãos. A verdade é que nesta altura me sinto perfeitamente bem.

MF – Quando é que entrou para o mercado de trabalho?

BC - Nos primeiros meses depois de acabar a carreira estava sobretudo ocupado com a luta contra a doença. Após um ano e meio, dois anos, comecei de facto a pensar que tinha de encontrar outra fonte de rendimento, que tinha de ir trabalhar. Comecei por ir trabalhar para uma empresa de peças de automóveis, que pertencia a um amigo meu.

MF – O que fazia nessa empresa?

BC - Fazia de tudo um pouco. Tratava da parte logística, de armazém, de arrumar as peças nas prateleiras, fazia entregas, inseria as peças no sistema informático, enfim. Trabalhar para mim nunca foi problema, porque comecei aos 12 anos a trabalhar no café do meu pai. Nessa empresa, trabalhava das 9h00 às 19h00 e até gostava, mas não sentia que aquela fosse uma área para o futuro. Fiquei lá cerca de um ano.

MF - E o que se seguiu?

BC - Comecei a trabalhar como agente comercial de um armazém de peles e desenvolvi um gosto por esta área. Fui trabalhando uns contactos, a interessar-me cada vez mais pela relação com os clientes e, em fevereiro de 2016, acabei por lançar a minha própria empresa, a RBC Couros, de representação e comércio de peles, em conjunto com o meu sócio Rui Ribeiro.

MF - Como está a correr essa experiência?

BC - No início foi complicado e estive cerca de ano e meio sem conseguir tirar ordenado para mim. Nessa altura, foi fundamental o apoio da minha família, sobretudo da minha mulher de há 17 anos, que acabava por ser o sustento da casa. Felizmente, fomos crescendo, fomos conquistando espaços e hoje em dia estamos num patamar interessante. Somos os representantes exclusivos da Codina em Portugal, uma grande empresa, que se instalou no Centro Empresarial da Feira em junho, com um investimento de dois milhões de euros.



MF - Foi fácil entrar nessa área de negócio?

BC - Entrei nesta área sem conhecer nada, sem conhecer a imensa variedade de peles, a diversidade do negócio. O Rui Ribeiro, o meu sócio, acabou por ser o meu professor, domina o produto, enquanto eu fico mais com a parte de relações públicas, trabalho muito com os clientes e viajo muito para Itália e Espanha. Chego à segunda-feira motivado, com vontade de trabalhar numa área que se revelou ser muito entusiasmante.

MF - E não pensa voltar a trabalhar no futebol?

BC - Desde que acabei a carreira, já recebi convites do futebol, já trabalhei na Sanjoanense como diretor-desportivo mas nesta altura quero dedicar-me a cem por cento à minha empresa. Quero ter estabilidade para, se amanhã voltar ao futebol – e acredito que um dia voltarei - , não precisar do futebol financeiramente.

MF - Voltando ao seu dia a dia, qual tem sido a prioridade nos últimos tempos?

BC - Estamos muito motivados com esta ligação recentemente à Codina, que trabalha sobretudo com calçado e também marroquinaria: bolsas, cintos, carteiras, etc. A Codina tem a vantagem de fazer todo o processo, trabalha a matéria-prima, isso permite dar uma resposta muito mais rápida às solicitações das marcas. Apostam sobretudo na chamada pele pequena, pele de cabra, de carneiro, mestiça, mais requintada, enquanto em Portugal, ainda é maioritariamente utilizada a pele de vaca, sobretudo em calcaço para homens.

MF - A indústria do calçado continua com grande força em Portugal?

BC - O calçado em Portugal continua em grande forma. Aliás, temos várias marcas a apostar no nosso país porque Portugal e a Itália são os melhores na relação entre preço e qualidade.



MF - E o Bruno, sente-se feliz com esta nova realidade?

BC - Muito. Começo a conhecer um Bruno que volta a ter ego, que tem valorização e mais ambição, sempre numa perspetiva de crescimento. Não já via este Bruno desde Paços de Ferreira. A minha mulher costuma dizer que há um Bruno pré-Paços e outro pós-Paços, um Bruno que não conseguiu ter sucesso na Liga e que perdeu confiança.

MF - Antes dessa época no Paços de Ferreira, na Liga, sentia-se mais confiante?

BC - Lembro-me do início da época anterior, no Varzim, em que começo como titular e passadas três ou quatro semanas chega o Bruno Vale, que vinha do FC Porto e tinha passado nas seleções nacionais. Os meus amigos disseram-me logo que eu não ia ter hipóteses, mas a verdade é que nunca duvidei das minhas capacidades e a época acabou por me correr bem.

MF - O que falhou então na época em que representou o Paços de Ferreira?

BC - Tinha 25 anos e o sonho de chegar à Liga. Cheguei ao Paços de Ferreira e entrei logo como titular, tive jogos complicados frente a equipas como o Sp. Braga e o Benfica e acusei a pressão. Faltou-me saber estar naquele patamar e depois a verdade é que só voltei a fazer mais um jogo na Liga, já perto do fim da época, que acabou por ser o meu último. Depois disso, ainda fiz uma boa época no Beira Mar, que culminou com a subida de divisão, mas sentia que já não era o mesmo Bruno Conceição.

MF - No ano seguinte cruzou-se com um jovem Jan Oblak, o que se recorda?

BC - O Beira Mar foi o primeiro clube do Oblak em Portugal, foi emprestado pelo Benfica mal chegou da Eslovénia. Ele tinha apenas 17 anos mas já se notava grande confiança, grande vontade de trabalhar. Se o treino começava às 9h00, ele já estava lá às 8h00 a trabalhar no ginásio. Sabíamos que em condições normais iria chegar a um patamar alto, embora fosse difícil prever que seria dos melhores do mundo, como é atualmente, pois para mim está no Top 5 mundial.

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