Covid-19: é o fim das companhias aéreas da Europa? - TVI

Covid-19: é o fim das companhias aéreas da Europa?

Faz 75 anos no dia 14 de março que foi fundada a companhia aérea portuguesa TAP

Algumas empresas só têm dinheiro para se manter nos próximos dois meses. Outras, nem isso. Quem as vai salvar?

O rasto de destruição deixado pela Covid-19 vai muito além das vidas humanas perdidas. A pandemia está a arrasar as economias e a deixar setores inteiros de joelhos. No caso da aviação, até as maiores empresas enfrentam o risco de colapso. Sem ajudas públicas, a Europa arrisca-se a perder as companhias aéreas, e a TAP não é exceção.

O setor do transporte aéreo europeu estima perder mais de 70 mil milhões de euros este ano, naquilo que foi já classificado como uma crise sem precedentes.

“Estimamos uma perda nas receitas com passageiros de 76 mil milhões de dólares [pouco mais de 70 mil milhões de euros] este ano para as companhias aéreas na Europa”. Palavras de Rafael Schvartzman, o vice-presidente regional para a Europa da Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA, na sigla em inglês).

Muitas das empresas do setor “só terão dinheiro disponível para uma suspensão [das suas operações] por dois meses” e, pior, “há outras companhias que poderão nem ter isso disponível”.

Os próximos tempos serão, inevitavelmente, de insolvências na aviação. Para a maioria das companhias, incluindo a TAP, a ajuda pública e até europeia é já encarada como a única possibilidade de sobrevivência.

O caso TAP

Antes da Covid-19 a TAP realizava cerca de 3 mil voos por semana. Hoje realiza 5. A frota está praticamente parada, tal como os cerca de 10 mil trabalhadores. 

Por isso, a companhia foi das primeiras a recorrer ao lay-off simplificado, a medida criada pelo Governo que permite às empresas mandar os trabalhadores para casa, reduzindo os custos salariais. 

Dos 10 mil funcionários, 9 mil foram colocados nesse regime de lay-off, a receber dois terços do salário, os restantes mil estão a trabalhar com horário reduzido. Todas as contratações estão suspensas e os contratos a termo certo não estão a ser renovados. A isto juntou-se um programa de licenças sem vencimento, com durações entre um mês e seis meses, que teve a adesão de 500 trabalhadores.

Apesar de todas as medidas de redução de custos não vitais à operação, a TAP está em maus lençóis, como qualquer outra companhia aérea nos dias que correm. Mas se os tempos são difíceis até para os gigantes do setor, como o Grupo Lufthansa, que lucrava mais de mil milhões de euros por ano, são-no ainda mais para uma companhia pequena como a TAP, que já vinha registando prejuízos nos últimos anos, e que tem elevados encargos financeiros com a dívida.

Por isso, a Comissão Executiva da operadora pediu já formalmente uma garantia do Estado para um empréstimo de 300 milhões de euros, necessário para manter a empresa a funcionar ao longo dos próximos dois meses.

O Governo mostrou-se disponível para ajudar a TAP. O caso é tão sério que nem a nacionalização da empresa é uma hipótese a excluir.

"O Estado não deixará de usar todos os poderes ao seu dispor para salvaguardar a posição estratégica da TAP. O Estado tem ferramentas para nacionalizar e usá-las-á se achar conveniente", afirmou o ministro da Economia, Siza Vieira, em entrevista à TSF.

Para já ainda não é certo como é que o Governo vai ajudar a TAP. As possibilidades, pelo menos em teoria, passam por dar uma garantia estatal aos empréstimos que a companhia venha a contrair junto da banca, fazer o próprio Estado um empréstimo direto à companhia, ou injetar dinheiro diretamente, através de um aumento de capital.

Mas a TAP é um caso peculiar, já que a empresa é detida em 50% pelo Estado, em 45% por um investidor privado (o grupo Gateway) e 5% pelos trabalhadores, estando a gestão estratégica nas mãos do parceiro privado.

Um aumento de capital levantaria várias questões: por exemplo, se o aumento por parte do Estado seria acompanhado pelo acionista privado ou se o grupo Gateway veria a sua posição acionista reduzida, e se as decisões de gestão se manteriam com o acionista privado ou se o Estado quereria recuperar esse poder de decisão.

 

Ajuda estatal à espera de orientação europeia

Em tempos normais, as regras da União Europeia proíbem qualquer ajuda de Estado às empresas. Mas estes não são tempos normais, por isso, Bruxelas já concordou em levantar as restrições às ajudas de Estado, e estuda algumas medidas para que os Estados membros possam apoiar as suas empresas.

Está a ser preparado um enquadramento legislativo específico para os apoios no contexto da crise da Covid-19, de forma a que as empresas tenham liquidez para continuarem a funcionar ou para poderem congelar temporariamente suas atividades, se necessário.

O novo quadro provisório permitirá aos Estados membros atribuir subsídios diretos ou benefícios fiscais até 500 mil euros a uma empresa, conceder garantias estatais subsidiadas sobre empréstimos bancários e ainda disponibilizar empréstimos públicos e privados com taxas de juros subsidiadas.

Em cima da mesa está a possibilidade de ser atribuída uma “compensação às transportadoras aéreas pelos danos sofridos em consequência do Covid-19, mesmo que tenham recebido auxílio de emergência nos últimos dez anos”, palavras da vice-presidente da Comissão Europeia, Margrethe Vestager.

“A CE está pronta para trabalhar imediatamente com os Estados-Membros para encontrar soluções viáveis que preservem esta parte importante da nossa economia, utilizando toda a flexibilidade prevista nas regras em matéria de auxílios estatais”, refere.

Medidas genéricas que ainda estão a ser negociadas com os Estados membros e que podem demorar semanas a chegar ao terreno.

O futuro da TAP depende em absoluto da ajuda que vier a receber e essa depende também em larga medida do que Bruxelas decidir, para apoiar o setor como um todo.

A pressão junto da Comissão está a ser feita sobretudo pelos grandes grupos, como a Lufthansa e a Air France-KLM, e a ajuda que a TAP vier a receber depende em larga medida do que estas empresas conseguirem negociar. 

Para já ninguém sabe ao certo quando é que a situação começará a retomar a normalidade, nem qual será o comportamento do turismo depois desta crise. Se a normalidade demorar mais do que uns meses a ser retomada, como muitos já preveem, a situação do setor pode assumir contornos catastróficos.

Como estão as outras companhias europeias a enfrentar a crise?

No resto da Europa, como em Portugal, as companhias olham para os Estados e para a União Europeia em busca de ajuda. O Grupo Lufthansa está a negociar diretamente com as autoridades da União Europeia e com os Governos da Alemanha, Áustria, Bélgica e Suíça um plano de redução de encargos no setor da aviação. O gigante já admitiu mesmo pedir ajuda aos Governos dos países onde tem atividade. 

Na Alemanha, a chanceler Angela Merkel quer abrir os cordões à bolsa e prevê um investimento adicional de 12,4 mil milhões de euros entre 2021 e 2024. Adicionalmente, o Estado terá a possibilidade de nacionalizar parcial e temporariamente determinadas empresas para ajudar a atravessar a crise. Segundo a imprensa alemã, a companhia aérea Lufthansa será um dos primeiros candidatos à “recapitalização” do Estado.

Em França, o Governo já anunciou que está preparado para ajudar a Air France-KLM, e vai apresentar um novo calendário de obrigações fiscais que adia o pagamento de impostos. Emmanuel Macron prometeu ainda garantir até 300 mil milhões em empréstimos bancários para apoiar empresas ameaçadas pelo COVID-19.

Na Bélgica, a Brussels Airlines pediu um apoio de 200 milhões de euros ao Governo, que está a negociar com a companhia.

Mais a Norte, a Norwegian Air está em situação crítica. O Governo norueguês anunciou um pacote de 6 mil milhões de coroas norueguesas para o setor aéreo, sendo que metade desse valor será para esta companhia. Do restante valor metade vai para empresas regionais, como a Wideroe e a outra metade para a SAS. A transportadora escandinava vai receber ainda 300 milhões de dólares de apoio dos Governos da Suécia e da Dinamarca.

O Estado norueguês tinha já tomado algumas medidas de apoio ao setor, como a suspensão de todos os impostos e as taxas aeroportuárias no primeiro semestre, a suspensão do imposto por passageiros durante 10 meses e o apoio do Governo às empresas que avançam com lay-off. 

Na Finlândia, a Finnair receberá um empréstimo de 600 milhões de euros do Estado.

Aqui ao lado, o Governo espanhol anunciou uma série de incentivos fiscais e uma linha de crédito de 400 milhões de euros destinada a empresas do setor do turismo, transporte e hotelaria. As companhias aéreas espanholas já avisaram que estes apoios não serão suficientes.

No caso da Alitalia, que há vários anos enfrenta dificuldades financeiras, a companhia vai beneficiar das ajudas financeiras de 25 mil milhões de euros para empresas afetadas pelo coronavírus. O Governo italiano já avançou com um plano para a sua nacionalização.

E nos EUA?

As três maiores companhias dos EUA estão a negociar com o Congresso e com a Casa Branca apoios para enfrentarem a atual crise. A American Airlines (AAL), a United Airlines (UAL) e a Delta Airlines (DAL) esperam conseguir linhas de assistência financeira.

A Delta deverá reduzir cerca de 40% da sua estrutura, e a United pediu financiamentos de dois mil milhões de dólares.

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