Em vários momentos do debate sobre o Orçamento do Estado não se discutiu a proposta de Orçamento do Estado do GOverno. À semelhança do primeiro dia da discussão, o Bloco de Esquerda insistiu na necessidade de o país renegociar o mais depressa possível a dívida e o PCP foi pelo mesmo caminho falando numa "rutura" necessária com as imposições europeias. José Manuel Pureza falou primeiro num “europeísmo resignado” e culpou a ideologia de direita pelo atual estado de coisas. O contra-ataque foi feito pelo PSD, que acusou o BE de “estar à venda” e ser um mero “anexo” do PS.
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Invocando a “claque de comentadores encartados” e o “diabo que tanto atormenta a direita”, José Manuel Pureza constatou um “silêncio estranho” no debate: não se falar das regras europeias.
“Temos de cumprir regras do tratado orçamental para credibilidade; temos de poupar poupar poupar até que chegamos a 5.000 milhões de euros de saldo orçamental. Poupar poupar poupar significa falta de toner e papel nas impressoras, hospitais e centros de saúde levados ao limite”, exemplificou. Tudo para dizer que há dinheiro, mas os juros que o país tem de pagar pela dívida estrangulam qualquer hipótese de o canalizar para melhorar o Estado e a vida das pessoas.
Depois de tudo pago e com mais de 5.000 milhões de saldo positivo esbarraremos em 8 mil milhões de conclusão do europeísmo resignado: poupamos para nos endividarmos. Poupamos para empobrecermos. O país está refém. O bom senso é partir este muro”.
Para o Bloco não chega só conseguir um juro mais baixo. “Importa, certamente, mas sem renegociar a dívida não há baixa decimal dos juros que nos valha”.
Ontem, o ministro das Finanças tinha concordado que “é necessário que Portugal tenha redução na taxa de juro que paga pelo seu endividamento”. Não disse que seria para renegociar a dívida com essa abrangência que o BE apregoa e que hoje voltou a insistir.
José Manuel Pureza aludiu à União Europeia que “não se porta como um ator razoável” para justificar porque é preciso ir mais além: “Sermos cordiais com isto não é ganhar credibilidade, é deixarmo-nos aprisionar. Salvo o Luxemburgo nenhum estado cumpre Tratado Orçamental, mas há uns que são premiados e outros que são punidos”, argumentou.
Com isto, referiu-se à Alemanha, “que é a Alemanha” e à França, “que nunca cumpriu, mas com a convicção de que só os amigos aceita acordos informais, secretos ou não, para que se maquilhem as contas, mas claro, a França é a França”. Para Portugal “sobra a permanente perseguição”.
"O BE é um anexo das traseiras do PS"
O deputado recebeu um pedido de esclarecimento de Carlos Abreu Amorim (PSD) que, na prática, se traduziu numa série de acusações à perda de ideologia do Bloco neste Orçamento, apesar do discurso hoje proferido.
O Bloco de Esquerda é um partido à venda por um naco de carne a um preço cada vez mais baixo. Não passa de um anexo situado nas traseiras do PS, que abdicou por completo daquilo que vinha defendendo há uns anos”
Abreu Amorim acusou o partido de querer “taxar as luzes, o lusco fusco, o sol, as vistas”, isto a propósito do novo imposto sobre o património.
E terminou vaticinando: “Tenho a certeza absoluta, parafraseando um treinador, que o BE e a geringonça não serão bocejados pela sorte com toda a certeza”.
Pureza respondeu que o seu partido defende "aqueles que é necessário defender" de uma "agressão social" como as que PSD e CDS "praticaram".
Por isso não nos deixaremos vender por interesses. O PSD arrisca-se a fazer o que os treinadores fazem quando estão a perder por 3-0: 'perdemos mas tivemos uma grande atitude".
PCP dá uma no cravo, outra na ferradura e faz exigências
Pelo PCP interveio Paulo Sá. Começou por destacar as "medidas positivas" do Orçamento que dão "respostas a poblemas mais urgentes", como é o caso do aumento das pensões. Registou, no entanto, que o partido "não esquece que não se avança para uma tributação mais adequada dos grupos económicos e grandes empresas".
"Registamos avanços, mas este Orçamento contém manifestas insuficiências e limitações, que resultam das opções do Governo e do PS relativamente às regras europeias (...) É um facto inquestionável que uma política que queira aprofundar a reposição de rendimentos requer uma rutura".
O deputado comunista referiu concretamente a dívida pública e os juros, "um fardo insusportável" para Portugal, até porque a dívida continuou a crescer atingindo 130% do PIB, "uma das maiores em percentagem relativa do mundo". Atualmente, os juros "consomem 10% da despesa do estado, mais do que o SNS e mais do dobro do investimento público".
Obviamente que depois falta dinheiro para apoiar os serviços, melhoria e funções social do Estado. Portugal não pode continuar o fardo, é preciso uma ação decisiva da renegociação da dívida, libertando juros".
Em várias frentes: o PCP é contra o Programa de Estabilidade e Crescimento, a união económica e monetária e o Tratado Orçamental. "Condicionam o funcionamento dos serviços públicos, a contratação de pessoas, o investimento público, deixa pouco disponível para a reposição de rendimentos".
Ou seja, para o partido que apoia o Governo no Parlamento, este Orçamento está ainda "muito aquém da resposta cabal" que o país precisa.