CGD: Domingues alertou Centeno que não lhe apetecia revelar património - TVI

CGD: Domingues alertou Centeno que não lhe apetecia revelar património

Ex-presidente do banco público está a ser ouvido na comissão de inquérito e confessa que houve risco da Caixa entra falência

A dúvida sobre o acordo que existiu, ou não, entre António Domingues e Mário Centeno continua presente. Mas a fazer valer a palavra do primeiro fica claro. António Domingues, ex-presidente da Caixa Geral de Depósitos, reforçou hoje que o ministro das Finanças, Mário Centeno, sabia que o banqueiro não queria divulgar o valor do património, muito menos ter o estatuto de gestor público. Para o ex-presidente do banco público é claro: se o Governo não estivesse de acordo nem sequer tinha alterado a lei.

Na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à atuação do XXI Governo Constitucional no que se relaciona com a nomeação e a demissão da administração de Domingues, o responsável deixou ainda claro que na primeira conversa sobre o convite para liderar a CGD tinha dito que o banco precisava de muito mais capital que o falado nos jornais na ocasião.

"Disse ao ministro que o convite era honroso e as razões do convite relevantes – intenção do Governo recapitalizar Caixa e dotar Caixa de uma administração despartidarizada e profissional - e que ia ponderar (...)" mas que não aceitaria "ir para a Caixa com o estatuto de gestor público, porque o acho limitativo face ao que entendo que deve ser a autonomia do conselho de administração de uma empresa que opera em concorrência, como é o caso da Caixa".

Acresce que "as obrigações de divulgação da informação patrimonial (…) são um problema" e "não me apetecia muito ter que o fazer. Porque é que estaria a publicar o património que nem sequer é só meu mas da minha família – adquirido na minha atividade enquanto profissional privado?".

Aos deputados, e para enquadrar as respostas, antes mesmo de começar a responder, Domingues assegurou ainda que disse ao ministro que "a Caixa precisa de bastante mais capital do que o que tem sido publicado nos jornais [da época]".

"Era visível, para quem tivesse o mínimo de experiência e estando no mesmo mercado, que havia um gap de capital relevante na Caixa Geral de Depósitos", acrescentou.

Condições, para ponderar aceitar o convite, que segundo o banqueiro foram transmitidas ao ministro e ao secretário de Estado nas primeiras conversas. Um convite que, de resto, o surpreendeu já que "não conhecia pessoalmente nem senhor ministro das Finanças nem o senhor secretário de Estado". E a primeira reação foi "de alguma hesitação, se não mesmo dizer que a probabilidade de aceitar seria relativamente baixa – desempenhava as funções de vice-presidente executivo do BPI".

Além disso, "a Caixa está por de baixo de um regime de ajudas de Estado, contratado em 2012, e não aceitarei ir para a Caixa se a recapitalização tiver que ser feita deixado deste plano", terá ainda dito a Centeno na primeira conversa.

Já sobre as reuniões com o Banco Central Europeu (BCE), Domingues referiu que, logo na primeira, fez questão de dizer que tinha uma preocupação de fundo: "o Fundo de Resolução".

O Fundo de Resolução tinha 4.900 milhões de euros aplicados no Novo Banco. "Havia imensas dificuldades na forma como o dossier ia progredir (...) se as perdas fossem despejadas em cima dos bancos criava um problema enorme. E no caso da Caixa [que tem uma quota de mercado, e uma quota nas responsabilidades do Fundo, de quase 30%, os valores seria muitos expressivos", terá expressado o responsável junto do BCE.

Confesso risco de bail-in

Domingues vai mesmo mas longe ao dizer que uma das razões por aceitou sair da sua "vida confortável" era saber que ia ajudar "a resolver um problema muito sério", para a Caixa, para o setor e, potencialmente, para o país.

O ex-presidente do banco diz que agora já pode falar do tema e assegura que na data a que reportam os fatos, há cerca de um ano, sobretudo no verão "o risco de fazer bail-in [situação de falência em que os investidores são chamados a assumir as perdas aos invés dos governos], de entrar numa situação de resolução, era o que tínhamos em cima da mesa".

Deixando claro que, se a Caixa não fizesse a recapitalização fora das ajudas de Estado as consequências da nova diretiva de resolução é que a Caixa tinha que fazer bail-in.

Domingues reafirma que tudo o que propôs inicialmente, para aceitar o cargo, ficou escrito, "para que não houve qualquer dúvida".

Na resposta a Luís Marques Guedes, deputado do PSD, o banqueiro diz que "a partir de certa altura deixaram de haver condições políticas para que o quadro que tinha sido aprovado pudessem ser mantido".

Acrescentado que teve "muita pena de sair da Caixa Geral de Depósitos, até porque isso teve um custo pessoal. Abandonei uma carreira, que tinha sido do meu agrado e podia continuar, para ir abraçar outra e tive que interromper e não me apetecia muito fazer isso".

O gestor diz que só saiu porque entendeu ser da sua "responsabilidade avaliar se tinha ou não tinha condições [para continuar] e qual era a melhor forma de proteger os interesses da empresa".

Ainda do contra-ataque de Marques Guedes, Domingues responde que "sim" sobre a escuda de entregar a declaração sobre o património, do próprio, e dos membros que convidou para a administração, como condições para aceitação dos cargos.

O ex vice-presidente do BPI garantiu ainda aos deputados que sobre o tema da sua contratação terá interagido com o Governo cerca de três vezes - aquando do convite; no verão porque havia pressão para acelerar a saída da anterior administração, e depois disso uma vez.

Banco público pagou 1,2 milhões à McKinsey e advogados em 4 meses

 A CGD) pagou 1,2 milhões de euros à McKinsey e ao escritório de advogados Campos Ferreira e Sá Carneiro pelos serviços de apoio na negociação com Bruxelas sobre a recapitalização do banco, revelou hoje António Domingues.

"Propus ao Governo que, de acordo com a minha experiência, as entidades mais adequadas para me apoiarem e constituírem equipa comigo era o escritório de advogados de Campos Ferreira e Sá Carneiro (CS Associados) e a McKinsey para as questões mais financeiras", afirmou o ex-presidente da CGD durante a audição. Assegurando que tal foi acertado com o ministro das Finanças e com o secretário de Estado do Tesouro.

Essas equipas não trabalharam para mim. Essas equipas trabalharam comigo para o Estado português", realçou o responsável, que foi alvo de críticas sobre estas escolhas.

 

O custo que essas auditorias tiveram, entre meados de abril e meados de agosto, ou seja, durante quatro meses, foi de 300 e poucos mil euros a sociedade de advogados e pouco mais de 900 mil euros à McKinsey", informou Domingues.

Marques Guedes contrapôs, citando documentos oficiais e atirou com valores completamente diferentes: pagamento de 810 mil euros os advogados e de cinco milhões de euros a McKinsey.

Os custos que eu mencionei são absolutamente rigorosos e referem-se ao trabalho desenvolvido durante quatro meses, no apoio que me foi dado a mim e ao Ministério das Finanças na negociação com Bruxelas", sublinhou Domingues.

E explicou a diferença nos valores que foram hoje colocados pela primeira vez em cima da mesa.

A pedido da direita, esta comissão vai investigar a troca de comunicações entre Centeno e Domingues. Mais concretamente as mensagens que foram proibidas na primeira comissão mas até agora o ex-presidente do banco público não disponibilizou qualquer sms porque, aparentemente, nem PSD nem o CDS-PP fizeram tal pedido.

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