Inquérito: Caixa tinha "imparidades que não estavam reconhecidas" - TVI

Inquérito: Caixa tinha "imparidades que não estavam reconhecidas"

  • SL
  • 7 mai 2019, 18:57
José Cunha Pereira e Carlos Eduardo Santos

Ex-diretor de supervisão do Banco de Portugal disse que uma inspeção feita à Caixa em 2010 "foi espoletada porque se teve conhecimento de créditos que não eram pagos, que eram renovados, de empréstimos com pagamento apenas de juros"

O ex-diretor de supervisão do Banco de Portugal (BdP) José Cunha Pereira disse, esta terça-feira, no parlamento que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) tinha "imparidades que não estavam reconhecidas".

José Cunha Pereira, diretor de supervisão do BdP entre 2009 e 2010, afirmou na sua audição na comissão parlamentar de inquérito à recapitalização e gestão da CGD que uma inspeção feita à Caixa em 2010 "foi espoletada porque se teve conhecimento de créditos que não eram pagos, que eram renovados, de empréstimos com pagamento apenas de juros".

Dessa inspeção, verificou-se que havia imparidades que não estavam reconhecidas, e que havia também provisões que não estavam feitas", acrescentou José Cunha Pereira em resposta ao deputado do PS João Paulo Correia que tinha citado documentos do Banco de Portugal que demonstram que o supervisor tinha conhecimento de situações irregulares.

Entre essas situações, o deputado do PS referiu um relatório de 2010 que mencionava 3 mil milhões de euros em crédito garantido por títulos, coberto por 198 milhões de provisões.

O documento refere "critérios pouco prudentes" no cálculo de imparidades, decisões que "raramente" tinham parecer favorável da direção de gestão de risco da CGD, casos em que "a situação económico-financeira dos clientes" se encontrava "desatualizada" e ainda o cumprimento do serviço de dívida de mutuários "com o produto dos dividendos das ações recebidas".

Tanto quanto sei, houve depois uma interação com a Caixa, com o departamento de supervisão, no sentido de algumas dessas deficiências serem resolvidas, e acho que disso resultou o aumento do reconhecimento de imparidades", respondeu José Cunha Pereira, explicando que esta informação foi um "'feedback'", que recebeu, pois "quando foi finalizado o relatório já não estava no departamento de supervisão".

O antigo responsável pelo departamento de supervisão do Banco de Portugal disse ainda, em resposta ao deputado do PCP Duarte Alves, que apenas quando entrou em funções, em 2009, se começou "a sentir que era necessário ter uma ideia das imparidades, nomeadamente dos créditos por ações, e que era necessário fazer uma inspeção nessa área".

A inspeção estava inicialmente "apontada para 2010 e por dificuldade de recursos humanos iniciou-se no final de 2010 e em 2011".

José Cunha Pereira referiu ainda que no final de 2009 "o departamento de supervisão" do BdP "era um monstro", e que por isso encetou medidas para "autonomizar o 'enforcement' [sancionamento]", de forma a "aumentar a pressão e a força da supervisão" e torná-la "mais intrusiva".

Também presente nesta audição esteve Carlos Eduardo Santos, diretor de supervisão do Banco de Portugal entre 2000 e 2008, que respondeu que não se lembrava, que não tinha "memória" dos acontecimentos questionados pelos deputados, e que não tinha tomado conhecimento da auditoria da EY à CGD.

 

Comissão de ética do BdP "analisou e debateu" escusa do governador

A comissão de ética do Banco de Portugal "analisou e debateu" o pedido de escusa do governador do Banco de Portugal a decisões sobre a auditoria à Caixa Geral de Depósitos (CGD), disse no parlamento com um dos seus membros.

O membro da comissão de ética em causa, José Cunha Pereira, que respondia aos deputados na comissão parlamentar de inquérito na qualidade de ex-diretor de supervisão do Banco de Portugal, disse que a comissão de ética "naturalmente que analisou e discutiu a situação" relativa à escusa de Carlos Costa, que pediu para não participar nas decisões do banco central sobre a auditoria à CGD por ter sido administrador no período analisado.

Questionado pela deputada do PSD Liliana Silva, que afirmou que o governador "não pediu qualquer parecer à comissão de ética" e perguntou se "não o deveria ter feito", José Cunha Pereira não negou.

Quando não nos é pedido o parecer, no mínimo a comissão de ética analisa a situação, debate, já o fez em termos de discussão interna", admitiu, dizendo que não ia "avançar mais por razões que [os deputados] compreendem".

José Cunha Pereira complementou o seu raciocínio dizendo que se trata de "uma relação sigilosa" e que a informação não era sua "mas de três [pessoas], de um órgão".

Não sei se já avancei demais, mas naturalmente que [a comissão de ética] analisou e discutiu a situação, e não é obrigada a transmitir o parecer".

Mais tarde, Liliana Silva disse que tinha "conhecimento de que o governador do Banco de Portugal pediu para ser ouvido pela comissão de ética, o que já aconteceu", e perguntou se havia "relatórios ou algum tipo de conclusão" que pudesse ser partilhada.

José Cunha Pereira disse que foi "objeto de discussão, que essa discussão será formalizada, a última reunião foi em 12 de abril", que a ata é "aprovada na reunião seguinte", e que não podia "avançar" mais informação.

O membro da comissão de ética afirmou ainda que também já foi discutida a situação da vice-governadora Elisa Ferreira, mulher de um ex-administrador da La Seda, empresa implicada no relatório da EY à CGD.

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