Afinal, porque pagamos tanto pelo combustível? - TVI

Afinal, porque pagamos tanto pelo combustível?

Portugal ultrapassou a barreira dos dois euros por litro de gasolina, mas há vários fatores a contribuírem para isso

Do 8 ao 80, ou neste caso, do 1 ao 2. Se em plena pandemia de covid-19 os combustíveis desceram para valores mínimos, chegando o preço do gasóleo a ficar abaixo de um euro em muitos sítios, esta quarta-feira verificou-se o inverso. Pela primeira vez em Portugal, a gasolina ultrapassou os dois euros por litro.

Do Alentejo ao Norte, mais precisamente de Grândola a Vila Nova de Gaia, foram pelo menos nove os postos de abastecimento onde o preço ultrapassou esta barreira. De acordo com informação disponibilizada pela Direção Geral de Energia e Geologia, estas são as bombas da Repsol em que a gasolina especial 98 está com o preço acima dos dois euros por litro:

Autoestrada 1 (A1)

- Gaia, em ambos os sentidos

- Antuã, Estarreja, em Aveiro, nos dois sentidos

A8

- Loures, em ambos os sentidos

A9 CREL

-  Loures, em ambos os sentidos

A17

- Nó da Ponte de Vagos, nos dois sentidos (Aveiro - Vagos)

- Figueira da Foz, em ambos os sentidos (Figueira - Coimbra)

- Monte Redondo, nos dois sentidos (Monte Redondo - Leiria)

A2

- Grândola, em ambos os sentidos (Grândola - Setúbal)

A6

- Vendas Novas, nos dois sentidos

Mas afinal, o que justifica o elevado preço dos combustíveis em Portugal?

Tanto na gasolina como no gasóleo, mais de metade do preço por litro vai para impostos e taxas. No primeiro caso, isso significa que um total de quase 65% do preço por litro vai para o Estado.

Entre o Imposto sobre Produtos Petrolíferos (36,4%), a contribuição de serviço rodoviário (6%), as emissões de CO2 (3,7%) e o IVA (18,7%), 64,8% do total do preço por litro da gasolina pago pelo consumidor é explicado por diferentes contribuições.

No caso do gasóleo a percentagem desce um pouco, mas continua acima dos 50%. O Imposto sobre Produtos Petrolíferos representa 26,4% do preço total, a contribuição de serviço rodoviário é de 8,6%, as emissões de CO2 são 4,5% e o IVA fica-se nos 18,6%.

Mas nem tudo é explicado pelos impostos. A restante parte do preço dos combustíveis vai para a cotação e frete, ficando ainda uma margem de lucro para as gasolineiras. De resto, como veremos mais à frente, são estas duas variáveis que estão a influenciar a subida de preços.

Ainda antes de serem conhecidos os mais recentes preços, o tema foi alvo de análise na rubrica de Paulo Portas no Jornal das 8. Em Global, o comentador da TVI explicou o que está em causa, afirmando que existem soluções possíveis, apontando exemplos concretos na União Europeia, que fizeram descer a carga fiscal.

Os espanhóis fizeram, os italianos fizeram e os franceses também", explicou, lembrando que também nesses países as taxas sobre impostos significavam um total de cerca de 60%.

Mesmo apesar da descida da margem, é a subida do preço do frete e da cotação dos recursos naturais que faz oscilar o preço em relação a 2020.

O Governo inventa este mecanismo [custo da margem], que fica muito bem, mas depois, quem tem de o aplicar são duas entidades que vêm explicar que o problema não está aí, que o problema está na fiscalidade", disse, referindo-se à Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos e à Autoridade da Concorrência.

Foi precisamente um parecer dessas duas entidades que o Governo teve em conta para apresentar uma proposta de lei no Parlamento, entretanto aprovada em setembro. O documento dá a possibilidade de o executivo fixar margens mínimas e máximas nos diferentes componentes que estabelecem os preços do combustível. Ainda assim, o ministro do Ambiente e da Ação Climática já veio dizer que esta é uma lei que terá um limite temporal.

A verdade é que, entre os diferentes fatores que contribuem para o preço da gasolina e do gasóleo, o Governo recusa-se a mexer num deles: os impostos. A lei das margens, de resto, deixa isso bem claro. A mexer em alguma coisa, será sempre no lucro das gasolineiras.

Um mecanismo que tenta convencer alguém que o problema esteve na margem. A margem até desceu de 12,5% para 9%", lembrou Paulo Portas.

A descida de impostos foi posta de lado pelo primeiro-ministro, que até admitiu um aumento da taxa de carbono. Apesar disso, e face ao contínuo aumento dos preços, o ministro da Economia já veio admitir que o Governo poderá vir a mexer nas taxas.

O que pagamos quando vamos encher o depósito

Como referiu Paulo Portas, o recente aumento está relacionado com a variação da cotação internacional e do frete. Mas o que está em causa?

A cotação internacional varia muito com a procura. Por exemplo, em meses mais frios há uma tendência para uma maior procura de gasóleo, nomeadamente para aquecimento. O mesmo acontece com a gasolina no verão, onde são feitas mais viagens. Mas o preço pode também variar com a menor ou maior dificuldade em extrair e exportar o crude. Isso mesmo se vê quando existem problemas em zonas de extração de petróleo, como é o caso do Médio Oriente.

O frete é o custo do transporte do produto petrolífero para o território nacional, quanto custa fazer chegar a matéria prima aos países, no fundo. Estes dois parâmetros em conjunto significam cerca de 30% do preço final. Juntando esses 30% aos impostos, o restante fica para os postos de comercialização.

O resto é pago em impostos, que se dividem de várias maneiras. Só o IVA, por exemplo, entra de duas formas na fatura. Grande parte é o imposto sobre o preço de referência, mas há uma taxa adicional sobre a comercialização.

A DECO também concorda que a mexida nas margens é uma medida limitada: "A intervenção nas margens brutas de comercialização será sempre uma medida limitada, tendo em conta a reduzida expressão que as mesmas têm na formação do preço final", refere.

De acordo com a proposta de Orçamento do Estado para 2022, apresentada esta semana, o Governo espera arrecadar 3.503 milhões de euros em Imposto sobre os Produtos Petrolíferos, um aumento da receita fiscal de 98 milhões de euros (mais 3%) face a 2021.

O documento justifica o aumento de receita com a "evolução esperada para o consumo privado e procura interna", sendo que este imposto vai ser atualizado em 1%, acompanhando a taxa de inflação prevista para o próximo ano.

PSD ponderaria baixar os impostos

O presidente do Conselho Estratégico Nacional do PSD admitiu esta quarta-feira, na TVI24, que o partido "ponderaria" uma mexida nos impostos sobre os combustíveis. Para Joaquim Sarmento, Portugal está dividido entre "dois países".

Há um país que vive nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto que é servido por uma rede de transportes que permite ter uma utilização razoável, e o resto do país, basta ir à maior parte das capitais de distrito, não tem uma rede de transportes públicos disponível. Nesse país o automóvel é quase a única alternativa de mobilidade", disse.

O social-democrata lembra a subida do preço do crude, afirmando que é preciso "atuar sobre o preço da gasolina", atacando o Governo quanto à razão para a subida dos preços.

Dos combustíveis mais caros na Europa

Segundo os mais recentes dados da Comissão Europeia, Portugal tem o quarto preço final mais caro por litro de gasolina na União Europeia. Com um preço estimado em 1,71 euros, o nosso país fica apenas atrás de Itália (1,713.07 euros por litro), Suécia (1,745.8) e Dinamarca (1,779.28), sendo que o preço médio a pagar por litro nos 27 está em 1,610.43 euros.

Em sentido contrário, Roménia (1,257.2 euros por litro), Polónia (1,276.53) e Eslovénia (1,288.2) são, por esta ordem, os países onde menos se paga por litro de gasolina. 

Em relação ao gasóleo, Portugal apresenta um preço final por litro de 1,513 euros, acima da média comunitária, que é de 1,465.73 euros por litro, mas em linha com grande parte dos países, havendo muitos que passam a barreira dos 1,50 euros por litro.

De resto, na Suécia paga-se cerca de 1,897.53 euros por litro de gasóleo, de longe o valor mais elevado na União Europeia. Bélgica (1,593.35 euros por litro) e Dinamarca (1,584.42) fecham o top dos mais caros.

Polónia (1,273.65 euros por litro) e Roménia (1,233.23) voltam a figurar nos dois países onde menos se paga por litro de gasóleo, mas é em Malta que esse custo é menor, com um preço final de 1,21 euros por litro.

Quanto disto são ou não impostos?

Portugal é um dos seis países onde o preço da gasolina sem impostos é mais caro. Segundo a Comissão Europeia, o nosso país está a pagar 710.07 euros por cada mil litros daquele combustível, o que dá 0,71 euros por litro, quando a média europeia é de 697.22 euros por litro (0,697 cêntimos por litro).

Suécia (0,76 euros por litro), Espanha (0,72), Países Baixos (0,72), Alemanha (0,75) e Dinamarca (0,79) completam o lote dos países onde a gasolina sem impostos custa mais de 0,70 euros por litro.

No gasóleo a questão volta a ser mais equilibrada. Com uma média de 0,70 euros por litro, são muitos os países que pagam acima disto, sendo Portugal (0,71 euros por litro) um deles.

Acompanhando os preços finais, a Suécia é também aqui quem tem o gasóleo mais caro, sendo a única que está acima de um euro por litro (1,05, mais especificamente).

Refira-se que, os países onde os combustíveis são mais caros no preço final, sobretudo a gasolina, todos têm um nível de salários muito mais elevado que em Portugal.

Dinamarca, Itália e Suécia não têm um salário mínimo nacional, mas os mais recentes dados do Eurostat apontam que o nível de vida nesses três países é bem diferente. Dinamarca tem um salário médio anual de 30 mil euros, valor que na Suécia é superior a 24 mil euros e que em Itália chega acima dos 17 mil euros. Em Portugal, os dados mais recentes dão conta de que esse valor está um pouco abaixo dos 11 mil euros.

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