A Comissão Europeia até adiou a decisão sobre se aplica ou não sanções a Portugal a propósito do défice de 2015, mas quer uma contrapartida: mais medidas. Por isso, deixou uma série de recomendações que quer que Portugal siga desde já. Em apenas dois meses - até ser conhecida aquela decisão - o Governo tem de dar provas. Bruxelas contabiliza as medidas adicionais em cerca de 730 milhões de euros, mas o primeiro-ministro continua a recusar que sejam necessárias.
Bruxelas detalha o caminho a seguir pelo Executivo de António Costa já em 2016, indicando medidas, embora algumas genéricas, que acredita que terão consequências positivas em 2017, no sentido de uma consolidação orçamental estável.
O foco deverá estar sobretudo na área da saúde, da Segurança Social e do setor empresarial do Estado, nomeadamente os transportes. Quanto à banca, pede que seja o chamado banco mau, uma instituição para liderar com o elevado malparado em Portugal, seja criado em menos de meio ano, até outubro.
Saúde | Corte na despesa que garanta "a sustentabilidade de longo prazo", mas “sem comprometer o acesso aos cuidados primários de saúde”: -Medidas "abrangentes" destinadas a promover a prevenção de doenças e políticas de saúde pública - No curto prazo, planear e implementar nos hospitais a liquidação de dívidas em atraso, o que "continua a ser um desafio importante". |
Reforma da segurança social | Reduzir a "dependência" do sistema de pensões das transferências do Orçamento do Estado |
Função Pública | "Aumentar a transparência e a eficiência na contratação pública no que diz respeito a parcerias público-privadas e às concessões” "Até o final de 2016”, melhorar e acelerar os procedimentos administrativos e de licenciamento |
Setor empresarial do Estado | Reorientar até ao final de 2016 os "planos de reestruturação em curso das empresas públicas”, em particular nos transportes |
Quanto a este último ponto, basicamente a Comissão Europeia quer que o Governo siga o caminho que o anterior Executivo PSD/CDS-PP, liderado por Passos Coelho, estava a fazer, concessionando os transportes a privados, algo que a equipa de António Costa reverteu.
Outras medidas
Impostos | Aumentar a receita fiscal (mas aqui não concretiza como) |
Salário mínimo | Garantir, em conjunto com os parceiros sociais, que “os salários mínimos são consistentes com os objetivos de promover o emprego e a competitividade” |
(Des)emprego | “Assegurar a ativação efetiva dos desempregados de longa duração" "Melhorar a coordenação entre o emprego e os serviços sociais” “Reforçar os incentivos às empresas para contratarem através de contratos permanentes”. |
Banca | Bruxelas quer um banco mau “até outubro de 2016”, ao pedir que se facilite a limpeza dos balanços das instituições de crédito e que se combata o problema do crédito malparado |
A Comissão Europeia considera que ainda existe espaço para um maior controlo da despesa, do ponto de vista do Orçamento do Estado. É o que pede ao Governo, estabelecendo um prazo: “até fevereiro de 2017, uma revisão ampla da despesa em todos os níveis da administração pública” e "reforçar o controlo da despesa, a eficiência dos custos e uma orçamentação adequada”.
Salientando que "é bom para Portugal" que Bruxelas tenha adiado uma decisão sobre o défice, o comissário europeu Carlos Moedas pediu ao Governo uma execução orçamental "sem falhas" até julho.
Costa faz finca-pé
O primeiro-ministro entende que não é preciso desviar-se do caminho que escolheu para a economia portuguesa, recusando, portanto, medidas adicionais. Até porque está convencido que vai chegar, como prometido nas últimas previsões que apresentou, a um défice de 2,2% este ano.
Acontece que o ponto de partida do Governo e de Bruxelas é completamente diferente. A Comissão Europeia não acredita que se consiga chegar àquela meta: a previsão de Bruxelas é de um défice de 2,7% este ano, mas hoje exige que Portugal chegue ao final de 2016 com um défice de 2,3%. Essa diferença de 0,4 pontos percentuais, feitas as contas, vale entre 720 milhões e 740 mjilhões de euros. Daí ser esse o esforço adicional que Bruxelas considera ser necessário realizar. António Costa refuta, tentando virar o jogo noutro sentido:
"As previsões da Comissão têm estado em evolução, aliás positiva. Começaram em 3,4, já vão em 2,7, diz agora que temos de alcançar uma meta de 2,3. A nossa meta no Orçamento, com as medidas que já temos é de 2,2. Nós continuamos tranquilos sobre a forma como o Orçamento tem vindo a ser executado. Não encaramos a necessidade de medidas adicionais para alcançar o objetivo que nos propomos, quanto mais para alcançar um objetivo menos ambicioso"
O chefe de Governo mostra-se convicto de “que se tudo continuar a correr normalmente” na economia e na execução orçamental, em julho a Comissão estará “a dar um novo passo de aproximação” às previsões do executivo português.
De recordar que o próprio Presidente da República antecipou ontem a necessidade de o Executivo ter de rever as suas previsões para o desempenho da economia. Hoje, a propósito das eventuais sanções a Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa disse não haver "razões para alarmismos" e que o país deve aguardar serenamente até julho.