Moedas virtuais: o futuro ou um papão? - TVI

Moedas virtuais: o futuro ou um papão?

Estão a dividir analistas, investidores e exigem atenção redobrada das entidades regulatórias em todo o mundo. Esta pode ser mais uma desmaterialização dos pagamentos ou correr muito mal a quem investiu

Bem-vindo ao mundo virtual, das moedas que andam por aí a circular, mas não lhes podemos tocar. Chamam-se criptomoedas.

Tal como os Estados Unidos tem o dólar, a União Europeia o euro e o Japão o iene, o mundo digital tem estas criptomoedas”, disse Tiago da Costa Cardoso, analista da corretora XTB, no espaço da Economia24, do “Diário da Manhã”, da TVI.

Será a nova forma digital de pagar bens e serviços? Vai desaparecer rapidamente? Ou terá vindo para ficar?

É que os pagamentos já são desmaterializados para muitas pessoas, que praticamente não utilizam papel-moeda, mas apenas transferências bancárias, cartão de débito e crédito - dígitos que entram e saem de contas bancárias. O problema é tornar estas moedas um meio reconhecidamente aceite por todos, para pagar algo.

O senior trader do Banco Carregosa, Paulo Rosa, diz que “o ceticismo tem a ver com a fidúcia que uma moeda transmite, sendo trocada com base na confiança no seu valor. As principais moedas (USD, EUR, CHF, GBP e JPY) continuam a ter esse estatuto e as criptomoedas não o conseguiram alcançar.” Não sabemos se alguns dia o conseguirão, mas até lá a incerteza e o risco.

Existem mais de 1.500, entre as quais a mais famosa é a bitcoin, criada por Satoshi Nakamoto, que também poderá ser o “nome de código” para um grupo de pessoas entendidas em questões financeira e tecnologia. Seja quem for, está entre os mais ricos do mundo com a valorização da moeda que criou.

À espera de igual sorte muitos investidores em todo o planeta têm apostado nestas moedas e, diz a lei da oferta e da procura que, se a procura aumenta, para a mesma oferta, o preço dispara.

Como se pode verificar nos gráficos abaixo, desde 21 de fevereiro de 2017, a bitcoin evoluiu 920%, segundo os cálculos do analista da XTB.

A correção desde 1 de janeiro de 2018 trouxe-nos até ao momento uma revisão de 19% e, desde os mínimos de 6 de fevereiro, a subida já vai nos 71,7%, segundo as contas do analista da XTB.

Evolução desde 1 de janeiro de 2018

Evolução desde 6 de fevereiro de 2018

Curiosamente esta recuperação surgiu exatamente após a audiência da Securities and Exchange Commission (SEC) e da Comissão de Negociação de Contratos Futuros de Commodities  (CFTC) no senado americano, que trouxe uma maior confiança ao mercado, depois de todas as notícias negativas que se vieram a alastrar desde o início do ano”, comenta o especialista.

As moedas da discórdia

As criptomoedas estão longe de gerar consensos, sobretudo quando aparecem nomes conhecidos do mundo das tecnologias, como Bill Gates, ou do mercado de capitais, como Warren Buffet, a dizerem que estes investimentos não terão bom fim.

Tal como os investidores, os países também parecem confusos sobre os benefícios.

Enquanto a Venezuela acaba de anunciar a pré-venda da petro, a criptomoeda estatal do país que, no limite, poderia ser trocada por petróleo, segundo presidente Nicolás Maduro, um "sistema financeiro mais justo,". Da Rússia surge o alertar: irá analisar a moeda venezuelana com muita cautela antes a utilizar em transações de petróleo.

Do outro lado do mundo, a Coreia do Sul, um dos países onde as criptomoedas conseguiram valorizações mais elevadas, foi, já este ano, protagonista de fortes desvalorizações quando deu sinais de que iria restringir, se não mesmo proibir, a negociação destas moedas. Na China também há sinais de que o regulador pretende acabar com a atividade de geração da criptomoeda.

Tiago da Costa Cardoso, acredita que as criptomoedas vieram para ficar e que só por desconhecimento é que há vozes contra, mas o risco é igual a qualquer outro investimento. "Quando vemos um ativo a subir, 100 ou 200% é normal que haja um entusiasmo grande e muita gente queira entrar no mercado. Seja o de criptomoedas, ações ou matérias-primas. Já está provado, do ponto de vista psicológico. Da mesma forma que, quando cai, existe um pânico geral.”

Paulo Rosa é menos entusiasta e assegura que “o risco é bastante elevado e espelha-se na elevada volatilidade que a negociação e as cotações das criptomoedas apresentam.”

Neste momento ninguém pode garantir o sucesso das criptomoedas. Porém, também não sabemos como irá reagir a comunidade mundial como um todo às criptomoedas. Por enquanto, é apenas um fenómeno alimentado por uma restrita comunidade de jovens informáticos, entusiastas das novas tecnologias e defensores da desestatização das moedas, exponenciado por especuladores que negoceiam na “dinâmica preço””, acrescenta.

Deco recomenta prudência

Se ligar para a Deco, e concretamente, no que toca às bitcoins, vai ser aconselhado a ser prudente.

É um investimento especulativo. Não só por não ser reconhecido, mas também porque pode ser abandonado a qualquer momento e o investidor ficará sem nada", refere o economista da Deco/ Proteste, André Gouveia.

Se é verdade que, em outros casos também é possível perder tudo, o que está aqui em causa é mesmo o valor intrínseco: “como investimento sério de longo prazo não recomendamos.”

Acresce que, com a falta de regulação, não há forma de corrigir uma transferência errada ou participar um roubo de moedas, acrescenta o economista da Deco.

A associação de defesa do consumidor tem estado em contato com os reguladores nacionais e com a própria Comissão Europeia que, já tomou medidas no passado no sentido, pelo menos, de se saber quem são os clientes das tais bolsas de moedas onde os investidores depositam o seu dinheiro. Uma forma de tornar mais transparente o processo e minimizar qualquer risco desta esta moedas estarem a ser utilizadas para levar o dinheiro de A para B, para fins menos lícitos e com dados encriptados, sem menor possibilidade de se seguir o rasto do dinheiro.

Mas a final o que posso fazer com a famosa bitcoin?

A bitcoin tem a utilidade de poder fazer uma transação em valor e ter aceitação comercial, se do outro lado estiver alguém disposto a receber esta moeda.

Estando em qualquer ponto do mundo posso transferir este valor para qualquer outra pessoa, para adquirir bens e serviços ou apenas para fazer a transação deste mesmo valor”, esclarece Tiago da Costa Cardoso.

Inicialmente é necessário ter uma carteira – wallet – onde guarda estes valores. Cada pessoa tem a sua, visível em qualquer dispositivo digital. Se quiser fazer uma transferência precisa de uma espécie de IBAN – endereço como o que tem no banco onde tem conta – para onde transfere esse valor.

Cada transferência é guardada publicamente num “livro de registos”, onde todas as transferências são guardadas, verificadas, controladas.

Verificadas por quem?

Por aquilo a que se chamam mineiros. Computadores poderosos que, através de software de verificação destas transações, conseguem garantir que não são duplicadas – quando tenho uma bitcoin não a vou gastar duplamente. Só a posso gastar em uma transação”, diz o analista.

Estes mineiros funcionam como se fosse, mais ou menos, um gestor do banco que vai verificar se a transação com um cheque está correta, se existe capital para ir do ponto A para o ponto B.

No que é que o risco de investir em criptomoeda é maior que o de investir em ações? Por exemplo?

Não é maior. Dependendo da empresa ou da criptomoeda, poderá existe maior ou menor risco. Uma empresa vale pelos resultados que consegue gerar e pela sua qualidade. Quanto melhores os resultados menor será o risco de ter ações dessa empresa. Também uma criptomoeda quanto mais atualizada for, menor será o risco”, afirma o senior trader do Banco Carregosa, Paulo Rosa.

As criptomoedas encerram a tecnologia blockchain, que mais não é que um livro de registos encriptados – o tal onde todas as transferências são guardadas, verificadas, controladas -, e que cada vez mais é usada pelas fintech.

Uma empresa pode criar a sua própria moeda, nomeadamente as startups, para financiarem o seu o começo e crescimento. Essa moeda poderá adquirir posteriormente bens e serviços dessa empresa e ser trocada, caso haja aceitação pela comunidade, por outras criptomoedas ou produtos de outras empresas. Uma espécie de crownfunding”, explica o economista do Carregosa.

Ninguém, nem os bancos, são obrigados a aceitar as bitcoins porque estas instituições não fazem a custódia deste capital, mas sim as pessoas que aceitam, ou não essa transação. O objetivo destas criptomoedas é, precisamente, afastar estes terceiros, como o banco ou outros que vão cobrar comissões.

Será talvez isso que falta: a aceitação geral. Até lá ainda há um vasto caminho: “para já não preenchem os requisitos de uma moeda: ser comumente aceite, servir como unidade de conta e ser uma reserva de valor”, reafirma.

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