Portugueses estão a consumir de forma mais consciente e não se importam de pagar - TVI

Portugueses estão a consumir de forma mais consciente e não se importam de pagar

Coordenadora científica do estudo, Mónica Truninger, esteve na Economia 24. O "fantasma de crise" ainda não passou para mais de metade dos inquiridos

Mais de metade dos portugueses diz que a crise não passou e uma das maiores preocupações é o desemprego, mesmo depois de os níveis terem caído para metade dos valores de há quatro anos.

Já sobre a sustentabilidade do que consomem as preocupações estão lá. Mesmo as classes mais baixas preferem pagar mais por algo sustentável e que não prejudique a saúde.

As conclusões são do II Grande Inquérito de Sustentabilidade em Portugal, desenvolvido por investigadores do Instituto de Ciências Sociais (ICS), da Universidade de Lisboa (UL), com o apoio da Missão Continente, e noticiado pelo Lusa esta madrugada.

A coordenadora científica do estudo, Mónica Truninger, esteve na Economia 24 e revelou mais alguns detalhes do documento.

“Fizemos uma pergunta abertas sobre estas questões e o que surgiu mais foi a sustentabilidade económica do dia a dia. As tais questões do desemprego, do custo de vida e dos salários baixos. Todas as outras como as sociais, as de governança e cidadania estavam mais diminuídas”, disse a responsável.

Mesmo a ligação ao tema ambiental revelou mais preocupações gerais ao nível da poluição, por exemplo, do que os problemas que o país enfrenta relacionados com os incêndios ou a seca.

Sendo mais específico, o facto de mais de 50% das pessoas entender que a crise não passou acaba por ter consequências determinantes nos modos de consumo.

“Notou-se uma bipolaridade dos portugueses em relação ao consumo. Por um lado, uma preocupação com a poupança [é substituída no top das preocupações pela saúde, dado o envelhecimento da população] e gestão do orçamento familiar. No caso dos mais jovens, a preocupação com a habitação”, referiu.

Face ao Inquérito de 2016, a coordenadora ressalvou mudança de hábitos que, em certa medida também são consequência da crise que, pelo caminho, ajudam à sustentabilidade. Se é verdade que se manteve o uso de espaços públicos gratuitos, como os jardins e parques, sobretudo as famílias com crianças, em detrimento dos centros comerciais, também é verdade que o conceito da “marmita” veio para ficar.

É um perfil de consumidor prosumidor – ele próprio faz as suas coisas – que veio à tona nestes dois anos. Tal como o consumidor ético, o consumidor constrangido e o consumidor suficiente. Este último é o que está preocupado em não causar grandes excessos de consumo, sobretudo no que toca ao desperdício alimentar”, afirmou.

O tema da preocupação com o desperdício é transversal às várias faixas etárias entrevistadas. Já sobre a noção dos inquiridos que menores gastos podem levar a mais sustentabilidade, Mónica Truninger acrescentou: “as pessoas com menos rendimentos podem estar a fazer prática de sustentabilidade quase por necessidade, sem estarem ligadas à dimensão ambiental. Mas há um grupo crescente na população portuguesa, constituído pelas mulheres, pelos mais escolarizados e pelos mais jovens, esses sim com muita ligação à sustentabilidade, ambiental e outras dimensões.” Para conclui que o “pendor pró ecológico está muito presente em todas as faixas etárias, embora surja mais nas mais jovens.”

Mais vegetais no prato, mais taxas aos “maus produtos”

Neste contexto nota-se grande preocupação dos inquiridos “para reduzirem o consumo de carne, para comprarem carne de natureza mais sustentável e até uma alimentação de base mais vegetal”, disse.

Segundo os dados do inquérito, a carne e o peixe ainda ocupam uma posição central nas refeições dos portugueses, mas a maioria (65%) já come uma refeição de base vegetal pelo menos uma vez por semana. Os homens tendem a comer quase mais uma refeição semanal com carnes vermelhas do que as mulheres.

É nesta linha de comer “melhor” que os inquiridos apoiarem a taxação dos refrigerantes.

“Cerca de 60% concorda com a medida e próximo de 47% diz que pode ser alargada, nomeadamente aos sumos, bolo, doces. Aqui há grande recetividade há intervenção do Estado, como também no caso nas mudanças de hábitos alimentares desde que sejam mais sustentáveis e saudáveis.”

Contas feitas, oito em cada 10 portugueses consideram que o Governo deve intervir para promover hábitos alimentares mais saudáveis e a maioria apoia de forma expressiva o alargamento de medidas como a redução de açúcar nalguns alimentos.

Ainda segundo os resultados deste inquérito, face ao realizado em 2016, “os supermercados de proximidade ultrapassaram os hipermercados/centros comerciais como os espaços mais frequentados para as compras alimentares”.

O estudo mostra igualmente que “a generalidade dos inquiridos se mostra familiarizada com o conceito de agricultura biológica”.

“Há uma adesão progressiva ao modo de produção biológica. Relativamente ao anterior inquérito, as pessoas já conhecem bem a agricultura biológica, valorizam-na e compram produtos nacionais. Têm mais confiança e defendem até a introdução nos refeitórios e cantinas escolares, sobretudo porque há também uma preocupação muito grande com os mais novos”, explicou.

As investigadoras agregaram as principais preocupações manifestadas pelos inquiridos num conjunto a que chamaram “sustento corrente da vida” (60,6%), incluindo o desemprego (38,8%), o baixo poder de compra/baixos salários (29,2%) e o custo de vida (9,6%).

Ao segundo grande conjunto de preocupações os investigadores chamaram “abalo de confiança no Estado”. Neste grupo, o que os inquiridos apontaram com mais frequência remete para a “corrupção” (26%), mas a falência funcional do Estado que mais os preocupa é o “sistema de saúde” (24,5%), o seu funcionamento e acesso. Em seguida, os inquiridos apontam a quebra de “credibilidade da classe política” (16,1%).

O terceiro grande conjunto de preocupações gira em torno de diversas manifestações de “desarmonia e de discórdia social” (35,4%), incluindo a pobreza/exclusão (16,8%), a fragilidade da vida económica do país (12,8%) e as desigualdades sociais (9,9%).

O estudo analisou 1.600 inquéritos a residentes em Portugal, maiores de 18 anos, estratificado por região, género e idade e tem 95% de intervalo de confiança. Decorreu entre 7 de novembro e 13 de dezembro de 2018.

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