Finanças não mostram ter toda a informação sobre venda do Novo Banco - TVI

Finanças não mostram ter toda a informação sobre venda do Novo Banco

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  • Publicada por ALM
  • 30 jul 2020, 07:51
Novo Banco - Banca - Bancários (arquivo)

Tribunal de Contas divulgou na quarta-feira uma auditoria à Autoridade Nacional de Resolução de Bancos, a cargo do Banco de Portugal, que inclui perguntas ao Ministério das Finanças

O Tribunal de Contas considera que o ministério das Finanças não demonstra ter toda a informação sobre o Novo Banco e a operação de venda à Lone Star, segundo a auditoria divulgada na quarta-feira ao fim da noite.

O Tribunal de Contas (TdC) divulgou na quarta-feira uma auditoria à Autoridade Nacional de Resolução de Bancos, a cargo do Banco de Portugal, que inclui perguntas ao Ministério das Finanças sobre a estabilidade do sistema financeiro (incluindo o Novo Banco), as respetivas respostas e a apreciação que faz dessas respostas.

Uma das perguntas está relacionada com o cumprimento dos contratos para o Estado emprestar dinheiro ao Fundo de Resolução, para este recapitalizar o Novo Banco, respondendo as Finanças que "o acordo tem vindo a ser cumprido integralmente" e indicado os valores disponibilizados em cada ano (430 milhões de euros em 2018, 850 milhões de euros em 2019, 850 milhões de euros em 2020).

Na apreciação, o TdC diz que, “não obstante o reportado, não foi entregue toda a evidência necessária e pretendida para justificar resposta positiva a esta questão, nomeadamente toda a documentação sobre a operação de venda [em 2017] de 75% do capital social do Novo Banco” ao fundo de investimento norte-americano Lone Star.

Constata-se, assim, que o Ministério das Finanças não dispõe de toda a informação sobre essa operação, apesar de ter sido o ministro de Estado e das Finanças a celebrar (pelo Estado português) o acordo-quadro para disponibilização de meios financeiros para a satisfação das obrigações do Fundo de Resolução”, lê-se na apreciação da resposta pelo TdC.

Questionada sobre se os ativos incluídos no balanço do Novo Banco foram objeto de auditoria ou de outro processo de validação, as Finanças responderam que na resolução do BES houve uma avaliação da PWC determinada pelo Banco de Portugal e que as contas do Novo Banco estão sujeitas a validação externa.

Contudo, diz novamente o TdC que a resposta nao é acompanhada da evidência necessária: “Constata-se que o Ministério das Finanças não dispõe de evidência sobre a validação do limite máximo de 3.890 milhões de euros de perdas nesses ativos que o mecanismo de capital contingente, contratualizado em 2017, obriga o Fundo de Resolução a cobrir. E que também não dispõe de evidência sobre o processo de auditoria às contas do Novo Banco nem sobre os processos de verificação do acordo de capitalização contingente, que são acompanhados pelo Fundo de Resolução, visto também não ter remetido essa evidência”.

Já sobre se têm sido cumpridos os acordos celebrados com a Lone Star, o Ministério das Finanças responde que “não é parte nos contratos associados à operação de venda”, sendo essas entidades o Fundo de Resolução e a Lone Star.

Para o TdC, “não foi entregue evidência do cumprimento dos acordos em causa”, pelo que “constata, assim, que o ministério das Finanças não dispõe dessa informação sobre a operação referida”, apesar de ter celebrado o contrato para financiar o Fundo de Resolução.

Outra das perguntas do TdC é sobre se o BES “foi a mais desastrosa resolução bancária alguma vez feita na Europa”, usando uma frase do ex-ministro das Finanças Mário Centeno no Parlamento.

Em resposta, as Finanças dizem que estas são “declarações feitas em contexto de debate parlamentar”, mas que os ativos tóxicos que permaneceram no Novo Banco indicam que "a resolução foi feita sem conhecimento de toda a informação contabilística sobre o efetivo valor dos ativos" de tal modo que, "até ao momento, o capital injetado no Novo Banco ascende a mais de 10.000 milhões de euros, muito superior ao considerado necessário no momento da resolução em 2014”.

Na apreciação da resposta, o TdC afirma que a frase citada foi dita logo “na intervenção inicial” e que a resposta permite concluir que “o ministério não dispõe de outra evidência” documental para a comprovar.

Nascido na resolução do BES (em 03 de agosto de 2014), 75% do Novo Banco foi vendido em outubro de 2017 ao fundo de investimento norte-americano Lone Star, mantendo o Fundo de Resolução bancário 25%, numa solução acordada entre Banco de Portugal e Governo.

Aquando da venda, foi acordado um mecanismo de capital contingente, que prevê que até 2026 o Fundo de Resolução compensa o Novo Banco por perdas de capital num conjunto de ativos que ‘herdou’ do BES até 3.890 milhões de euros.

Desde então e até hoje, o Fundo de Resolução já injetou 2.976 milhões de euros e ainda poderá colocar mais de 900 milhões de euros, valores que em cada ano têm impacto nas contas públicas uma vez que o Fundo de Resolução é uma entidade da esfera do Estado.

TdC quer mais planeamento na resolução de bancos para evitar peso sobre dívida pública

O TdC sugere também que haja mais planeamento na resolução de bancos em Portugal, desde logo para minimizar os riscos sobre a dívida pública, a qual tem vindo a financiar as intervenções em bancos.

O TdC divulgou na quarta-feira ao fim da noite uma auditoria à Autoridade Nacional de Resolução (ANR) de bancos, a cargo do Banco de Portugal, em que fala também sobre os custos da resolução de bancos e os riscos da atual crise pandémica para a estabilidade do sistema financeiro e, logo, para as contas públicas.

Ainda antes da entrada em vigor do Mecanismo Único de Resolução europeu, Portugal fez duas intervenções em bancos (BES e Banif) em que o Governo teve um papel relevante na decisão e no financiamento do Fundo de Resolução (FdR) com empréstimos para este poder intervir nesses bancos.

Como o Fundo de Resolução não tem tido dinheiro suficiente para financiar as intervenções, obtém empréstimos do Estado que pagará a longo prazo, tendo o Estado de se endividar para emprestar esse dinheiro, como tem vindo a acontecer no caso das injeções de capital do Novo Banco.

Como os empréstimos concedidos pelo Estado para financiar as resoluções do BES e do Banif podem ser pagos pelo FdR até 2046, foi dívida pública contraída pelo Estado que, na prática, financiou 72% do recurso ao mecanismo de capital contingente [do Novo Banco]”, lê-se no relatório do Tribunal de Contas.

Em final de 2019, o Fundo de Resolução tinha recursos próprios negativos em 7.021 milhões de euros e uma “avultada dívida” de 6.233 milhões de euros, 89% da qual devida ao Estado por empréstimos pedidos para financiar as resoluções do Banif, mas sobretudo do BES.

Já em 2020, o Estado deu outro empréstimo ao Fundo de Resolução, de 850 milhões de euros, para este capitalizar o Novo Banco em 1.035 milhões de euros, ao abrigo do mecanismo de capital contingente acordado em 2017 na venda da participação de 75% do Novo Banco à Lone Star.

Há ainda mais 914 milhões de euros que o Novo Banco pode ir buscar ao Fundo de Resolução, lembra o TdC, uma vez que ao abrigo daquele mecanismo o banco pode ir buscar 3.890 milhões de euros até 2026 e para já recebeu 2.976 milhões de euros.

Segundo o Tribunal de Contas, há, assim, o risco de “pressão adicional sobre a dívida pública nacional”, defendendo que seja prevenido esse risco através de mais planeamento na resolução de bancos.

“Prevenir este risco exige minimizar a margem de erro no planeamento de resolução bancária, não só das IMS [instituições/bancos menos significativos] cuja competência é da ANR, como das instituições cuja competência é do CUR [Conselho Único de Resolução europeu], mas nas quais a intervenção da ANR tem sido determinante”, afirma o Tribunal de Contas.

O Tribunal de Contas considera ainda um risco a eventual instabilidade do sistema financeiro devido ao impacto da pandemia da covid-19, uma vez que tal “também agrava os demais riscos para o exercício adequado das competências de resolução bancária pela ANR”.

Assim, defende na auditoria, é importante “prevenir e reduzir o risco de instabilidade” do sistema financeiro, que vem consumindo “de forma recorrente avultados recursos públicos”.

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