Proposta de Orçamento para 2018 com défice de medidas para o futuro - TVI

Proposta de Orçamento para 2018 com défice de medidas para o futuro

Teodora Cardoso

Conselho das Finanças Públicas diz que "trajetória [de redução de défice e dívida] continua a beneficiar mais do contributo dos juros e da recuperação do ciclo económico do que do efeito líquido de medidas estruturais". Há metas que podem não ser cumpridas

Juros e recuperação do ciclo económico são os maiores motores da redução do défice e da dívida.

Esta é, talvez, a nota mais relevante da análise que o Conselho das Finanças Públicas (CFP) faz à proposta de Orçamento do Estado para 2018 (POE) e que foi antecedida pelo parecer do CFP sobre as previsões macroeconómicas subjacentes à mesma.

Esta trajetória [de redução de défice e dívida] continua a beneficiar mais do contributo dos juros e da recuperação do ciclo económico do que do efeito líquido de medidas estruturais, em particular do efeito em 2018 de medidas adotadas em 2017”, diz o documento. À medida que recorda que, para 2018, a POE mantém o objetivo de 1% para o défice apresentado no PE/2017, prosseguindo uma correção de desequilíbrio orçamental e de redução da dívida, a qual deverá voltar a baixar, para 123,5% do PIB.  

Com base na informação fornecida pelo Ministério das Finanças, a melhoria do saldo orçamental em 2018 em resultado direto das novas medidas de política é de 228 milhões de euros (equivalendo a 0,1% do PIB [Produto Interno Bruto], “integralmente sustentada pelo efeito das medidas previstas no lado da receita (309 milhões de euros)”, nota a instituição liderada por Teodora Cardoso.

Mas do lado da despesa há mais preocupações.  O CFP adverte que Portugal deverá registar um "desvio" no objetivo da despesa em 2018 e que também não deverá cumprir a redução mínima da dívida no ano que vem.

Crescimento de algumas componentes da despesa 

Do lado da despesa as medidas incluídas na POE/2018 implicam uma expansão ligeira do seu volume total face ao ano anterior. As medidas de expansão previstas para a despesa (718 milhões de euros) são justificadas em cerca de três quartos (72%) pelas relativas ao descongelamento gradual das carreiras dos funcionários púbicos e às alterações introduzidas na despesa social, em concreto a reforma nas longas carreiras contributivas, a atualização extraordinária de pensões e a prestação social para a inclusão.

Contudo, o impacto negativo no saldo é atenuado por medidas de redução da despesa no montante de 637 milhões de euros, dos quais 330 milhões correspondem a despesa primária (despesa sem juros) e 307 milhões a uma redução de juros, só parcialmente justificada por medidas de política. O contributo das novas medidas de política é, contudo, insuficiente para compensar o impacto líquido negativo de medidas aprovadas no ano anterior”, conclui o documento da CFP.

No que se refere às regras orçamentais de natureza estrutural, a POE/2018 “tira sobretudo empenhada em tirar partido da conjuntura favorável e em cumprir as regras apenas nos mínimos indispensáveis para obviar a desaprovação da Comissão Europeia.”

De facto, beneficiando das condições propícias da procura externa e dos mercados financeiros, propõe medidas que usam a margem daí decorrente – traduzida no aumento da receita fiscal e contributiva e na redução dos encargos com juros – não só para aumentar o investimento, mas também as componentes mais rígidas da despesa primária”, continua. 

País poderá falhar regras europeias da despesa e da dívida 

E depois chegam mais preocupações. Diz o CFP que, quanto às regras numéricas, “não é claro que o seu cumprimento esteja assegurado no biénio de 2017/2018.” De facto, com base na informação disponível e na classificação própria de medidas temporárias e não recorrentes, o CFP estima que a melhoria programada do saldo estrutural subjacente à POE/2018 ascenda a 0,1 p.p. em 2017 e a 0,3 p.p. do PIB em 2018.

“Estes valores comparam com a variação recomendada de 0,6 p.p. do PIB em cada um dos anos, tendo em conta a conjuntura económica. De igual modo, o desvio do crescimento programado da despesa primária líquida de medidas discricionárias incidentes na receita excede em média a taxa de referência aplicável em 1% do PIB em cada um dos anos”, diz ainda a instituição.

Já estimativa do MF para o défice nominal das AP em 2017 aponta para que este seja inferior ao previsto no OE/2017 e no PE/2017. Esta estimativa coloca o défice de 2017 em 1,4% do PIB, valor que compara com o défice de 1,6% do PIB apresentado no OE/2017 e de 1,5% avançado posteriormente pelo MF no PE/2017. "Este resultado a confirmar-se, constitui uma revisão em baixa do défice respetivamente de 0,2 e 0,1 p.p. do PIB, assim como uma correção do desequilíbrio orçamental superior à apresentada naqueles dois documentos de programação orçamental."

"A confirmar-se, este desvio aponta para a necessidade de uma avaliação global que pode ser conducente à abertura de um procedimento por desvio significativo", alerta ainda a instituição.

Teodora Cardoso afirmou ainda que a proposta orçamental para 2018 “é insuficiente” em matéria de ajustamento estrutural, havendo o “sério risco” de ser uma oportunidade perdida.

Em declarações à Lusa à margem de uma conferência esta tarde na Academia das Ciências de Lisboa, Teodora Cardoso afirmou que Portugal tem agora uma “situação favorável a nível conjuntural, quer de crescimento económico quer dos mercados financeiros”, considerando que o país devia “passar de facto e em profundidade ao ajustamento estrutural”.

“E é aí que me parece que o programa deste orçamento é insuficiente”, afirmou a economista, que, quando questionada sobre se este OE2018 se arrisca a ser uma oportunidade perdida, respondeu que “corre um sério risco de o ser”.

O ministro das Finanças assumiu hoje uma divergência de opiniões com o Conselho de Finanças Públicas (CFP), rejeitando que o Orçamento do Estado para 2018 (OE2018) cumpra apenas os “mínimos”.

À saída de uma reunião de ministros das Finanças da União Europeia, em Bruxelas, Mário Centeno, questionado sobre a crítica do Conselho de Finanças Públicas ao projeto orçamental para o próximo ano, começou por dizer que “já é um avanço (o CFP) dizer que se faz o mínimo para cumprir as regras”, mas ainda assim discorda da análise.

“As instituições também vão amadurecendo as suas análises, e é assim que espero que o Conselho de Finanças Públicas também faça. O mínimo é uma avaliação do CFP que, como deve imaginar, não corresponde à minha avaliação nem à nossa avaliação”, declarou.

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