Papéis do Panamá: Pedro Queiroz Pereira usou offshore para pagar jato privado - TVI

Papéis do Panamá: Pedro Queiroz Pereira usou offshore para pagar jato privado

  • Patrícia Pires
  • Micael Pereira (Expresso), do ICIJ - Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, Miguel Prado (Expresso) e Rolando Santos (TVI)
  • 22 abr 2016, 23:51

Mais nomes portugueses continuam a surgir no âmbito desta investigação. Ângelo Correia, empresário e ex-ministro, e dois membros da família de António Champalimaud, também surgem associados à Mossack Fonseca

Pedro Queiroz Pereira, o dono da Semapa e da Portucel, é um dos empresários portugueses que recorreram aos serviços da sociedade panamiana Mossack Fonseca para criar estruturas offshore. Uma das empresas de Queiroz Pereira foi usada para pagar um contrato de aluguer de jatos privados em 2006 com a Netjets.

Os documentos analisados pelo Expresso e pela TVI, no âmbito da investigação “Papéis do Panamá", revelam que em maio de 2006 foi criada no Panamá a empresa Neeley Marketing SA. Esta sociedade tinha como beneficiário final Pedro Queiroz Pereira e estava associada a uma conta no Clariden Bank, instituição financeira com sede em Zurique que, no ano seguinte, seria absorvida pelo Credit Suisse. A Neeley Marketing foi encerrada em 2010, segundo os registos da Mossack Fonseca que fazem parte dos 11,5 milhões de ficheiros que o jornal alemão Süddeutsche Zeitung obteve e partilhou com o ICIJ - Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação.  

 

 

Uma carta de novembro de 2006 enviada pela firma jurídica AMS Trustees à empresa de jatos privados Netjets revela que a 22 de setembro de 2006 a Neeley Marketing SA contratou à Netjets UK Limited serviços de leasing de aeronaves. Não foi possível apurar os montantes envolvidos neste negócio nem a duração do contrato. A Neeley Marketing, de Pedro Queiroz Pereira, também contratou a AMS como representante legal para um período de dois anos e meio para quaisquer litígios que pudessem ocorrer em Inglaterra com a Netjets.  

Pedro Queiroz Pereira é um dos homens mais ricos do país e na guerra pelo controlo da Semapa levou a melhor sobre Ricardo Salgado, que, curiosamente, também foi cliente dos serviços da Mossack Fonseca. Queiroz Pereira teve pelo menos mais uma offshore no Panamá. Em dezembro de 2005 foi criada nesta jurisdição, com um capital de 10 mil dólares, a Grantfield Overseas Inc, companhia que apenas seria encerrada no final de 2015. Há nos registos da Mossack Fonseca alguns documentos que indiciam que a Grantfield terá tido uma conta na filial suíça do Deutsche Bank. 

Tratadas as formalidades para o fecho da conta de Queiroz Pereira nesta offshore, em novembro de 2015 (há pouco mais de cinco meses) o escritório de advogados português Correia, Seara, Caldas, Simões e Associados submeteu à Mossack Fonseca uma carta de recomendação do empresário português, reconhecendo que “a relação de negócios com o cliente foi, até à data, irrepreensível”.

O Expresso e a TVI tentaram falar com Pedro Queiroz Pereira para obter esclarecimentos adicionais sobre estas empresas, mas fonte do seu escritório explicou que tal não seria possível por o empresário estar fora do país, incontactável.

O próprio grupo Semapa tem há mais de uma década uma empresa no Panamá, a Somera Trading Inc. Esta sociedade, que detém uma navio de transporte de cimento, foi adquirida em 2002 pela Florimar, uma empresa que a cimenteira Secil tinha comprado nesse mesmo ano no centro de negócios da Madeira.

Ângelo Correia em offshore das Ilhas Virgens 

O empresário e antigo ministro Ângelo Correia é um dos nomes que constam da base de dados da Mossack Fonseca, surgindo, durante um curto período, como administrador único de uma offshore incorporada nas Ilhas Virgens Britânicas, a Anchorage Group Assets Limited. Os documentos obtidos pelo ICIJ - Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação mostram que Ângelo Correia foi administrador daquela empresa ente 20 de dezembro de 2004 e 4 de agosto de 2005. A informação sobre a empresa é limitada. Por que esteve o antigo governante ligado durante sete meses a esta sociedade das Ilhas Virgens? 


Ângelo Correia mostrou-se surpreendido com a associação, afirmando desconhecer a empresa. No entanto, o seu nome, assinatura e morada em Portugal constam dos documentos de criação da companhia.

“Trabalhei para muita gente e pode ter sido que me tenham nomeado para essa empresa e eu tenha assinado”, admitiu o empresário.

A documentação dos “Panama Papers” indica que a Anchorage Group Assets Limited voltou, ainda em 2005, a mudar de mãos. Em outubro desse ano a administração da empresa ficou com Roberto Hissnauer, um colaborador da gestora de ativos Leman Asset Management, de Lausanne (Suíça). 

 

A Anchorage era uma empresa com ações ao portador, ou seja, uma sociedade cujo dono não tinha o seu nome inscrito nos registos da Mossack Fonseca, o que dificulta a identificação dos beneficiários e das finalidades deste veículo. Em 2004 Ângelo Correia estava afastado do PSD (voltaria a ter voz ativa no partido em 2007), tendo sido um ano marcado pela sua intervenção no consórcio Luso-Oil, através do qual o grupo norte-americano Carlyle tentou comprar 33,34% da Galp, em parceria com vários investidores portugueses, como a Fomentinvest (de que Ângelo Correia fazia parte), Ilídio Pinho, Grupo Espírito Santo, Horácio Roque, entre outros.

Família Champalimaud também usou a Mossack Fonseca 

Pelo menos dois elementos da família Champalimaud recorreram aos serviços de offshores criadas pela Mossack Fonseca, segundo os documentos recolhidos pelo ICIJ – Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, a partir de uma fuga de informação daquela empresa panamiana. Entre os nome citados nos “Panama Papers” estão Luís de Melo Champalimaud, um dos filhos de António Champalimaud, e Sofia Champalimaud Charters Monteiro, neta do magnata. 

A informação consultada pelo Expresso e pela TVI associa Luís Champalimaud à empresa Newlake Investments SA e a uma conta no banco suíço UBS. A empresa foi criada em 2006 e dissolvida em 2014. Os documentos que ligam o empresário à conta no UBS e ao veículo Newlake identificam igualmente a gestora de ativos suíça Socinvest Finance. Na Newlake houve durante vários anos uma procuração atribuída a um cidadão com o nome Manuel de Brito. O objetivo era a movimentação de títulos financeiros, como ações e obrigações, mas não foi possível apurar os negócios efetivamente realizados nem saber se Luís Champalimaud controlava a empresa ou se apenas utilizava os seus serviços. Ausente do país, o empresário indicou, através de uma funcionária da empresa Confiança Participações SGPS, que “nada sabe sobre o assunto em questão”. 

Igualmente citada nos documentos da Mossack Fonseca está Sofia Palhavã Champalimaud Charters Monteiro, uma das netas de António Champalimaud, que através da empresa Oyster Investments Group Corp, do Panamá, manteve nos últimos anos, juntamente com o seu marido, uma conta no UBS. Em Portugal Sofia Champalimaud detém várias empresas que operam no ramo imobiliário, entre as quais a Primosfera, que tem os seus escritórios no número 19 da Rua Garrett, em Lisboa, no mesmo edifício onde já esteve instalada a Confiança Participações, do seu tio Luís Champalimaud. Contactada, a empresária não respondeu às questões em tempo útil.

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