"Se estivesse aqui podia ler nos lábios ‘não há aumento de impostos’” - TVI

"Se estivesse aqui podia ler nos lábios ‘não há aumento de impostos’”

Duarte Pacheco (PSD) afirmou que o ministro das Finanças “pode dizer 100 vezes que não há aumento de impostos”, mas que eles existem. Centeno reparou na ausência do deputado durante a resposta em que reiterou o contrário. E Camões 'voltou' ao Parlamento

Duarte Pacheco (PSD) afirmou que o ministro das Finanças “pode dizer 100 vezes que não há aumento de impostos”, mas que eles existem. O deputado social-democrata, que acusou Mário Centeno de não responder às questões da oposição, ausentou-se da sala na altura da resposta e o ministro fez o reparo, com uma alusão a uma famosa frase de George H. W. Bush: “O senhor deputado Duarte Pacheco não está na sala, mas se estivesse teria oportunidade de ouvir 101 vezes que não há aumento de impostos e se conseguisse ler nos lábios seria um dois em um: ‘não há aumento de impostos’”.

À segunda ronda de questões no debate sobre o Orçamento do Estado, esta quinta-feira, Duarte Pacheco levou para a discussão o orçamento na Educação.

“Leu a errata que nos enviou? Diz que não existe diminuição na despesa da Educação, mas o que está orçamentado é menor que o estimado gastar este ano. Não há aumento, há diminuição.”

O ministro das Finanças levou os números da Educação de 2012 e de 2015 para o hemiciclo. “Podem tirar notas e depois entregar ao senhor deputado”, afirmou, começando a fazer a comparação.

“Em 2012 a execução orçamental foi de 6398 milhões de euros, em 2015 foi de 5920 milhões de euros, uma queda . Em 2012, a dotação inicial foi de 6297 milhões e em 2015 foi de 5540 milhões, uma queda. Em 2016 a execução aumentou para 6122 milhões. A dotação inicial de 2016 para 2017 foi de 6023 milhões. Não são tantos números que não os possam passar ao senhor deputado Duarte Pacheco.”

Antes de se ausentar da sala, Duarte Pacheco tinha criticado ainda o novo imposto sobre o património: “Diminuir a taxação do património acima de um milhão de euros para tributar sobre a generalidade das empresas e dos negócios? São escolhas ideológicas?”.

Para Mário Centeno, a questão do adicional ao IMI, que vem substituir o imposto de selo, “é um verdadeiro imposto sobre o património”, que traz "justiça fiscal". E exemplificou: “um contribuinte que tivesse 10 casas de 900 mil euros estava isento” e agora não. “A isto chama se alargamento da base e com um alargamento da base é possível reduzir a taxa; isto é justiça fiscal”, vincou o ministro.

Já o CDS, por Nuno Magalhães, afirmou, nesta ronda de pedidos de esclarecimento, que este Orçamento é “uma oportunidade perdida”, acusando o Governo de fugir à responsabilidade quanto ao fraco crescimento da economia.

“Este Governo nunca tem responsabilidade, ou é Angola ou o Brasil ou os mercados.”

O deputado centrista disse que Centeno fala sobre a dívida pública com “ligeireza” e que o seu plano, “o plano Centeno”, “evaporou-se”.

“Previa que a dívida ia chegar a 124% do PIB, corrigiu para 129,7% e hoje é 131% do PIB. E depois diz que vai ser para o ano.”

O governante respondeu que o valor apontado pelo deputado (131% do PIB) "não é de novembro, mas de setembro" e que “em outubro há um pagamento de uma obrigação de tesouro próximo dos 4.000 milhões de euros que vai fazer reduzir a dívida para o valor que está inscrito no Orçamento do Estado.”

Uma "revanche" contra os pobres

O CDS tem insistido na questão dos pequenos pensionistas, que ficaram de fora do aumento de dez euros estabelecido no Orçamento do Estado, e no debate sobre a proposta orçamental do Governo, esta quinta-feira, no Parlamento, não foi diferente. Pedro Mota Soares acusou mesmo o Executivo de uma “revanche” contra “um milhão de portugueses, que são os mais pobres dos pobres”.

“O senhor ministro está a dizer a cerca de um milhão de portugueses que eles não vão ser aumentados porque no passado já receberam, como se isso fosse um privilégio. É uma revanche contra estes portugueses que são dos pobres mais pobres em Portugal.”

O deputado centrista deu valores concretos: “No ano em que um pensionista de 7.500 euros vai ter um aumento de 263 euros por mês, um pensionista de 263 euros tem um aumento de pouco mais de um euro. São cerca de um milhão de portugueses que vão ficar pior, que vão perder poder de compra em 2017”.

Pedro Mota Soares acusou o PS de ter um preconceito com as pensões mínimas, lembrando que, no memorando acordado com a Troika, o congelamento das pensões incluía estas reformas mais pequenas.

"Vai ou não vai corrigir esta injustiça flagrante? Vai ou não vai parar esta 'revanche' contra um milhão de portugueses que são muitas vezes os mais pobres, os mais fracos e os mais excluídos da sociedade portuguesa?", questionou o deputado.

Sem responder diretamente à questão, Centeno sublinhou que todas as pensões serão aumentadas, segundo a taxa de inflação, e lembrou que o Orçamento não traz um corte de 600 milhões de euros nas pensões como queria o anterior Governo PSD/CDS-PP. 

"Não consta nenhum corte de 600 milhões de euros nas pensões como constava no Programa de Estabilidade de 2015. Não consta o congelamento de cerca de dois milhões de pensões que desde 2010 não foram atualizadas, pensões dessas muitas próximas de 300 euros com carreiras contributivas próximas de 30 anos. Esse congelamento não consta dos documentos orçamentais", respondeu Centeno.

"Camões com Camões se paga"

Ainda esta semana, o ministro das Finanças esteve a ser ouvido pelos deputados, na Comissão de Orçamento de Finanças, durante nove horas. Uma audição marcada pela citação de uns versos de Camões por parte de Mário Centeno.

Ora, o poeta voltou hoje ao Parlamento, pela voz de Miguel Morgado, também do PSD, ao dizer que o ministro "não percebeu que versos dão toda a razão ao PSD para condenar violação grave da mais elementar informação e transparência".

"De si para si os versos que dizem qualquer coisa como isto: se não queres assumir a responsabilidade da sua governação ataca sem freios a oposição". Atirou de seguida com a rima e ainda introduziu uma história literária no debate, a do Estranho Caso do Dr. Jekyll e do Mr Hyde.

Ele era um homem de ciência, consciente dos seus deveres, investou uma poção e bebeu essa poção e transformou-se no senhor Hyde que troca a racionalidade pela irracionalidade e joga no lixo regras da vida civilizada. O senhor desde que bebeu essa poção, o OE2017 é a certidão de óbito da sua política, falhou em toda a linha. O que agora tem para propor em alternativa? Nada, zero".

O mesmo deputado acusou ainda o ministro e o Governo de terem protagonizado "momentos de pura propaganda, uma sequência de embustes: sobretaxa, escalões de IRS (mais para o ano); pensões aumentadas em véspera de eleições autárquicas; ISP (compensação nada, vamos pagar muito mais, famílias e empresas); embuste da aceleração dos fundos europeus, que este governo retardou".

O deputado reparou que Mário Centeno estava "tão risonho" e saiu em defesa de Assunção Cristas, do CDS-PP, a propósito da lição de economia que o ministro lhe tentou dar.

"Olhe que aqui neste caso regras da macroeconomia parece que só valem para si. Em Portugal manda a regra de que Camões com Camões se paga. Trouxe aqui uns versos para si que acho que vão dar que pensar: E sou já do que fui tão diferente / Que, quando por meu nome alguém me chama, / Pasmo, quando conheço / Que ainda comigo mesmo me pareço".

Centeno constatou que o deputado "fez da sua intervenção duas coisas: um conjunto de previsões de cartomancia" e "um conjunto de análises económicas" que o ministro quis comentar.

"Em termos económicos, o modelo que o senhor deputado terá na sua cabeça (que é quase pecaminosa a procura interna), tenho a dizer que o crescimento da economia portuguesa em 2015  [ainda anterior governo] foi feito à custa da procura interna, com um contributo foi 2,6%. O equilíbrio externo, que também é um conceito muitas vezes glosado pelo senhor deputado, o contributo da procura externa líquida foi negativo. As virtudes do seu modelo já lá não estavam em 2015", afirmou, para defender a política económica seguida pelo atual executivo, baseada na procura interna pela via da recuperação de rendimentos.

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