Tiago Dantas: «Pensei em trocar o futebol pelo xadrez» - TVI

Tiago Dantas: «Pensei em trocar o futebol pelo xadrez»

  • João Pedro Óca
  • 25 out 2019, 09:05

Entrevista exclusiva ao médio de 18 anos das águias

Tiago Dantas, 18 anos, está às portas da equipa principal do Benfica. Não estabelece prazos, mas diz que espera lá voltar, depois de ter feito a pré-época às ordens de Bruno Lage, um treinador que o conhece muito bem. O médio criativo, que até já esteve perto do Manchester City, diz que está «num dos melhores da Europa» para se fazer jogador. Hoje, sabe bem o que quer – «ganhar a Liga dos Campeões pelo Benfica» – mas já esteve perto de trocar o futebol… pelo xadrez.

Maisfutebol - Como se apresenta como jogador?

Tiago Dantas - Sou um jogador elegante, que as pessoas gostam de ver jogar, um jogador que gosta que ele e a sua equipa tenham bola, a bola é coisa mais importante para mim durante o jogo. Sou um daqueles jogadores que as pessoas vêm ao estádio para ver.

MF - Jogadores mais técnicos e criativos, como se define, fazem falta ao futebol?

TD - Sim, hoje o futebol é mais físico e cada vez é mais raro existir este tipo de jogadores, mas, aqui no Benfica, as pessoas dão muita atenção ao individual e à qualidade do jogador.

MF - Tem 1,69 e 58 kg. Alguma vez teve problemas com a estrutura física no futebol?

TD - Aqui no Benfica, as pessoas sempre foram muito honestas comigo. Nunca puseram em causa a minha qualidade por ser mais baixo ou menos forte do que outros. Aqui as coisas sempre foram fluindo da forma mais correta, na minha opinião.

MF - E a prova disso é que está no Benfica há 14 anos (tem 18 de idade). Há alguém, atualmente no clube, com mais anos de Benfica do que o Tiago?

TD - O presidente talvez (risos)… Eu entrei aos quatro anos, comecei a jogar futebol aos três, e tenho vindo a percorrer todos os escalões no clube. Sinto-me muito privilegiado por fazer este percurso, já vi muitos jogadores a entrar e a sair do clube, e isso muitas vezes não é fácil, porque perdemos o contacto com pessoas que se tornam amigas.

MF - É de Tires, por isso percorria quase 80 kms todos os dias para treinar. Como recorda essa altura?

TD - Os meus pais ou meus avós iam-me buscar à escola e levavam-me, inicialmente, até ao campo dos Pupilos do Exército (junto ao Estádio da Luz). Quando começámos a vir para o Seixal, havia uma carrinha que nos trazia dos Pupilos, mas a partir dos sub-14 comecei a vir de transportes públicos. Saía da escola, apanhava o comboio, depois o barco, e fazia o resto do caminho a pé. Para casa, era o inverso.

MF - Já que falamos da infância, trouxe, para esta entrevista, um tabuleiro de xadrez porque sei que jogava quando era mais novo…

TD - Na minha escola era obrigatório ter aulas de xadrez, era uma paixão que eu tinha, e houve um momento em que cheguei a ponderar o que queria fazer: ou jogava futebol ou xadrez.  Cheguei a falar com os meus pais e com o meu treinador na altura, que era o Nuno Azevedo, e ele, bem, aconselhou-me a ficar no futebol, que era o que estava certo. Mas adorava jogar xadrez, cheguei a participar em campeonatos nacionais.

MF - E hoje, se não fosse jogador de futebol, o que seria?

TD - Eu gosto muito de jogar ténis... É um hobby que tenho, procuro jogar sempre que tenho oportunidade, passo tardes e noites a ver o Estoril Open e outros torneios. Nas folgas costumo jogar ténis ou padel.
 

MF - Reconhece esta pessoa?

TD -  É a minha irmã, joga no Sporting, e também na Seleção…

MF - Como é lá em casa? O Tiago joga no Benfica, a Joana no Sporting…

TD - Há que respeitar, ela está no Sporting, dá tudo pelo clube, honra a camisola, mas não falamos muito de futebol em casa. Falo mais com o meu pai. Já passamos tanto tempo fechados nos centros de estágios, e passamos tantas horas a pensar exclusivamente no futebol, por isso, em casa, temos de falar de outras coisas.

MF - Como é que recebeu a notícia de que ia fazer a pré-época com a equipa principal do Benfica?

TD - Estava de férias quando me ligaram a informar. Fiquei extremamente feliz, liguei logo aos meus familiares, ao meu agente. Estar ao lado de jogadores que idolatro foi o concretizar de um sonho.

MF - O que realça do que aprendeu naquele mês e meio a treinar-se sempre às ordens de Bruno Lage na equipa principal?

TD - Deu para perceber o nível que é preciso para estar no mesmo grupo daqueles jogadores. Na formação ensinam-nos muito, desde muito novos, para quando chegarmos a estes patamares estarmos preparados.

MF -  Depois da pré-época voltou para a equipa B. Compreendeu essa decisão do treinador?

TD -  A porta da equipa principal está aberta, mas não está escancarada. Temos de continuar a trabalhar e percorrer o nosso caminho. É um caminho individual, depende de jogador para jogador, temos de fazer as coisas bem porque as pessoas estão atentas - a direção, o treinador da equipa principal - àquilo que fazemos dentro e fora de campo.

MF - Já conhece Bruno Lage desde os tempos da equipa B. Que importância tem esse aspeto para os jogadores da formação?

TD - É bom ter uma pessoa com quem já trabalhámos num patamar superior. Acho que o Ferro, o Jota, o Florentino, e outros jogadores, que transitaram para a equipa principal em Janeiro passado, têm esse sentimento.

MF - Teve alguma espécie de padrinho na equipa principal?

TD - Quem me acolheu de forma especial foi o Pizzi. Ainda hoje falamos, trocamos algumas mensagens. É um grande jogador e um excelente ser humano…

MF - Vocês têm algumas semelhanças no estilo de jogo, jogam na mesma posição…

TD -  Sim, pode dizer-se que sim…

MF - Já é o segundo ano na equipa B, com apenas 18 anos. Está cada vez mais preparado para enfrentar os desafios dos campeonatos profissionais?

TD - A transição de júnior para sénior foi mais difícil. Tinha vindo de uma lesão de três meses, fui para a equipa B e os primeiros dois meses foram complicados. Depois, começou o campeonato, fui utilizado muitas vezes, depois voltei para os juniores. Este é o ciclo que fazemos para estarmos preparados para quando chegar a oportunidade de me fixar na equipa principal.

MF – A UEFA Youth League, competição em que o Benfica tem tradição, é também um bom palco para os jovens jogadores, como o Tiago, que já tem três golos em três jogos?

TD -  Sim, temos um grupo unido e competitivo, com um bom espírito. São jogadores dos sub-19, dos sub-23 e da equipa B que se juntam alguns dias antes dos jogos.

MF - Sente que está num dos melhores clube do mundo para se formar como jogador?

TD - Sem dúvida, o Benfica dá-nos todas as condições de que precisamos para singrar. Como disse há dias o Guga Rodrigues [do Famalicão], que passou pela formação do Benfica, só não dá jogador aqui quem não quer. É mesmo verdade. Aqui, todas as infra-estruturas são do melhor que existe, não sei se há muitos clubes na Europa com as condições que nós temos aqui. Só temos de aproveitá-las.

MF - Além disso que referiu, há muita proximidade entre direção e jogadores da formação. O presidente Luís Filipe Vieira passa muitas horas no centro de Estágios e fala constantemente sobre este projeto…

TD - Sim, é muito importante para nós que o presidente conheça cada vez mais os jogadores, que veja cada vez mais o que fazemos dentro do campo. Há uma ligação direta à restante estrutura e ao treinador da equipa principal.

MF - É difícil não encarar isso como uma pressão extra para confirmarem as expectativas que depositam em vocês?

TD -  Cada um é como é. Não nos podemos comparar ao que outros já fizeram e é assim que vamos chegar longe, como eu espero chegar. O caminho certo é ser humilde, simples e dar o melhor de nós dentro do campo, para, quando acabar o jogo, irmos ter com as nossas famílias de consciência tranquila.

Tiago Dantas no jogo de apresentação do Benfica

MF - O que significa para o Tiago o dia 10 de julho de 2019?

TD -  O dia 10 de julho?

MF -  O dia em que se estreou no Estádio da Luz, na pré-época, num jogo com o Anderlecht…

TD - Ah, como é que me esquecia (risos)…? Esse dia foi estranho, nunca pensei realmente em ter essa oportunidade, e entrar para o lugar do Jonas, que foi o jogador que foi no Benfica, a estreia no Estádio da Luz, que estava cheio, foi algo único. Tudo farei para voltar a competir nesse estádio.

MF - O que lhe disse o Jonas no momento em que saiu para entrar o Tiago?

TD -  Ele estava muito emocionado, era a sua despedida do Benfica, desejou-me apenas boa sorte.

MF - Já tinha estado na Luz, com o estádio cheio, mas como adepto, ou apanha bolas, a entrar de mão dada com os jogadores…

TD - Cheguei a entrar no estádio agarrado ao Miccoli…Foram várias as vezes em que entrei de mão dada com jogadores da equipa principal, e recordar esse tempo, ver a evolução que tive até entrar como jogador do Benfica na Luz, é incrível.

MF - Tem feito tudo o que está ao seu alcance para se fixar na equipa principal do Benfica?

TD - Penso que tenho feito as coisas bem, as pessoas têm-me dito isso e só tenho de continuar assim.

MF - Estabelece algum prazo para lá chegar?

TD - Não ligo a isso. Se tiver um prazo na cabeça, e depois falhar o objetivo, podia pensar que as coisas não estavam a correr bem. Mais vale não criar essas expectativas e continuar a fazer o meu caminho porque as coisas vão acontecer.

MF - Mas essas expectativas em relação ao Tiago já estão criadas. Já se escreveu que pode ser o sucessor de João Félix… Como é que lida com essas comparações?

TD - É uma questão de nos abstrairmos, às vezes não é fácil, porque hoje em dia a informação chega de todo o lado. Mas as pessoas do Benfica, sobretudo da área da Psicologia, aconselham os jogadores a tentar abstraírem-se desse tipo de notícias, que temos de encarar como aspetos extra que não nos favorecem.

MF - Na sua opinião, o João Félix é o maior talento que passou pela formação do Benfica?

TD -  Daqueles com quem joguei e que vi jogar, o Félix é, sem dúvida, um dos melhores. Não me surpreende o que ele tem feito, tem muita qualidade, muito à-vontade à frente da baliza, e isso faz dele o jogador que é.

MF - Qual é o seu maior sonho no futebol?

TD - Ganhar uma Liga dos Campeões no Benfica e ser campeão do Mundo por Portugal.

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