Sarajevo sangrou, endureceu, transformou-se dramaticamente.
Duas décadas depois, a capital bósnia floresce. Modernidade, cultura, artes, vida eloquente, revigorante. Algumas fachadas renovadas escondem o passado asceta, outras exibem orgulhosamente os buracos de balas cravejadas nos edifícios. Feridas curadas, cicatrizes eternas.
Miss Sarajevo está mais insinuante do que nunca e um nobre português é testemunha privilegiada.
«O panorama atual é bem tranquilo, está longe do que se imagina ser uma atmosfera de guerra. Mas as marcas são visíveis em edifícios e casas, ao contrário do que esperava. As paredes continuam metralhadas. Conheci muitos casos de pessoas que, por opção, não fazem obras nas suas casas para se lembrarem do que passaram.»
Cristiano Luís, 24 anos, médio do FK Olimpik, de Sarajevo, fala ao Maisfutebol sobre a experiência no futebol e na sociedade bósnia. O seu clube ocupa o quinto lugar da I Divisão e prepara a final da taça.
CRISTIANO LUÍS: 300 kms em sete horas, história de um rapto
Outro Cristiano a viver dias felizes.
«A liga bósnia surpreendeu-me em vários pontos. Há quatro equipas que lutam pelo título e competições europeias, mas é frequente os primeiros classificados perderem pontos com equipas que lutam pela manutenção. Há sempre muitas surpresas», continua Cristiano Luís.
«As equipas que lutam pela manutenção são extremamente agressivas. Os bósnios são apaixonados por futebol, quase todas as equipas têm claques organizadas e em 80 por cento dos jogos temos escolta policial. Só o Olimpik é que não tem claque. É um clube com poucos anos de existência e tem poucos adeptos».
LIFE BEGINS AT THE END OF YOUR CONFORT ZONE! EVERYDAY IS A CHANCE TO GET BETTER!
Posted by Cristiano Luís on Wednesday, March 25, 2015
«Cristiano? Cristiano Ronaldo? Perguntam-me sempre isto»
Nascido em Felgueiras e formado essencialmente no Vitória Guimarães [sete épocas, além das passagens por Felgueiras e Leixões], Cristiano aplaude a estratégia do clube bósnio. «Tem condições razoáveis, forma jovens e tem o intuito de vendê-los no mercado de transferências».
Após os empréstimos a Lousada e Serzedelo, a transferência para Espanha (Cartagena) e uma experiência de loucos na Arménia (Gandzasar FC), Cristiano está a saborear a vida nesta antiga república da Jugoslávia.
E como chegou este filho de Felgueiras ao futebol da Bósnia?
«Na minha vida as coisas acontecem quando menos espero. Surgem-me lugares que jamais imaginava», explica Cristiano ao Maisfutebol.
«Cheguei a Sarajevo por intermédio de um agente que não conhecia de lado nenhum.
Um empresário que me conhecia mandou-lhe o meu CV e vídeo, o senhor apresentou tudo ao meu treinador no Olimpik e surgiu muito rapidamente a proposta».
«Num sábado a noite ligaram-me», prossegue Cristiano, «e durante a semana seguinte fiz as malas e aterrei aqui em Sarajevo».
Cristiano Luís (à direita) num jogo do FK Olimpik
Num país maioritariamente muçulmano, os costumes são compreensivelmente distintos. Cristiano não sente, porém, qualquer desconforto perante «as orações nas mesquitas e as mulheres de burka».
Na verdade, ser português e chamar-se Cristiano é um excelente cartão de visita para conquistar estranhos.
«Fazem comparações em todo lado! (risos)», confirma o médio do FK Olimpik.
«Na Espanha, na Arménia e agora na Bósnia perguntam sempre: ‘Cristiano? Cristiano Ronaldo?!’ Eu costumava brincar em Espanha com os meus colegas no balneário, dizendo: ‘Ser português e chamares-te Cristiano neste país não é fácil!’», atira este Cristiano, menos mediático.
«Ainda por cima estive em Espanha numa altura em que se falava que o Cristiano Ronaldo estava triste e que queria uma melhoria salarial. A comunicação social que falava do Cartagena sempre que podia ironizava com isso e dizia ‘este Cristiano não está triste e o Cartagena joga!’» .
Cristiano Luís e Miss Sarajevo, uma relação prometedora.