Cristian Rodríguez: «Trocar Benfica pelo Porto foi ato de coragem» - TVI

Cristian Rodríguez: «Trocar Benfica pelo Porto foi ato de coragem»

Cristian Rodríguez

Entrevista exclusiva ao futebolista uruguaio mais titulado da história e antigo jogador de águias e dragões. Aos 34 anos continua a ser um ídolo e um herói no Peñarol

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A entrevista estava apalavrada desde agosto e tinha o Benfica-FC Porto da terceira jornada como pano de fundo. Adiamentos e cancelamentos em cima da hora trouxeram-nos até aqui, ao final de outubro. Mas para falar com o futebolista uruguaio mais titulado de sempre [26 troféus] a altura é sempre boa. 

Principalmente se esse futebolista, Cristian Rodríguez, tiver um passado riquíssimo - 110 jogos pelo Uruguai, dois Mundiais e quatro Copas América - e um discurso desassombrado, típico de quem não leva o futebol com a seriedade banal de um filisteu. 

Cristian, o Cebola, responde ao Maisfutebol com uma amabilidade que a postura guerreira em campo sempre nos escondeu. Uma conversa longa, onde não podia faltar o regresso ao verão quente de 2008: o verão em que trocou a Luz pelo Dragão. 

PARTE II: «Os problemas no FC Porto surgiram porque não quis renovar»


Maisfutebol – Aos 34 anos mantém a paixão de sempre dentro do campo?
Cristian Rodríguez – Só sei jogar assim, com paixão. Estou muito feliz por estar no clube do meu coração há dois anos e meio. Ganhámos dois campeonatos, este está mais difícil (risos). Mas vamos atrás do tri uruguaio. Sobre a paixão, o que posso dizer? É a minha forma de jogar, deixar o sangue e o suor todo lá dentro da cancha. É meu, não se explica.

MF – Fora dos relvados consegue ser mais calmo?
CR – Tenho de ser, para não dar em louco (risos). Sou mais calmo, mas muito ansioso. Sou um homem de família, dedico-me às minhas duas filhas e pouco ligo ao futebol. Vejo muito pouco futebol na televisão e quando deixar de jogar vou afastar-me completamente desse mundo.

MF – O que pretende fazer profissionalmente quando já não for futebolista?
CR – Vou dedicar-me aos cavalos. São outra paixão. Tenho uma propriedade grande e pretendo criar estes animais extraordinários. Imagino-me a fazer isso, a ter uma vida tranquila, sem futebol. E viajar, quero viajar e voltar ao Porto, a minha segunda cidade. Tenho muitas saudades, mas os compromissos do futebol não me têm permitido voltar lá.  

MF – Por falar em futebol, sabe que é o futebolista uruguaio com mais títulos oficiais?
CR – Sim, sim, mas só há pouco tempo (risos). Tenho 26 troféus, não é? Informaram-me recentemente e só posso ficar orgulhoso. Atrás de mim, no segundo lugar, está o Cavani e isso diz quase tudo. Em quatro anos no FC Porto ganhei dez títulos, por isso acho que o clube foi decisivo para me incluir nesta condição histórica. Tenho de agradecer-lhe.  

MF – No seu FC Porto era fácil ganhar títulos?
CR – Fácil nunca é, mas o Porto obriga-te a ganhar. Campeonatos, taças, tudo. Foi no FC Porto que aprendi a gerir a pressão da vitória, a pressão de não poder falhar.

MF – Já falaremos mais sobre o Cristian e o FC Porto. Antes gostaríamos de ir até ao Mundial de 2018 e ao Uruguai-Portugal dos oitavos-de-final.
CR – Ui, que partido difícil!

MF – Mas com um final feliz para o Uruguai.
CR – Foi muito duro, equilibrado, até fechado. O Cavani lesionou-se, fizemos um jogo muito tático. Conhecíamos bem Portugal, sabíamos que não podíamos deixar espaços nas costas da defesa e havia Cristiano Ronaldo. Gerimos bem o jogo, vencemos e seguimos em frente.

Rodríguez em 2007 a celebrar um golo pelo Benfica

MF – Esteve em dois Mundiais (nove jogos). O que levava no coração para o jogo de estreia no torneio mais importante do planeta?
CR – Nervos, nervos (risos). Um Mundial é o máximo, estamos a representar a nossa família, o nosso país, a nossa bandeira. Tive essa sorte e o privilégio de estar com o Uruguai em dois Mundiais. Inesquecível.

MF – Chegou aos ‘oitavos’ em 2014 e aos ‘quartos’ em 2018. História encerrada?
CR – Sim, decidi isso depois do Mundial na Rússia e da derrota contra a França [2-0]. Em 2018 pensei que iríamos mais longe, até ao título. Foi um torneio muito equilibrado. Foi pena termos jogado esse jogo contra a França com muitas baixas.

MF – Saiu de Portugal e do FC Porto em 2012. Nunca quis voltar?
CR – Não, segui outro caminho. Na altura saí para o Atlético Madrid e depois tinha o objetivo de voltar à América do Sul. Fiz uma promessa à minha família e cumpri-a: regressar ao Peñarol, no máximo, com 31 anos. Estou feliz e a desfrutar do meu país.

MF – Paris, Lisboa, Porto, Madrid e Parma: onde foi mais feliz na Europa?
CR – No Porto, claramente. Passou a ser a minha segunda casa. Vivi quatro anos muito marcantes no clube e na cidade. Fiz grandes amizades, adorava a zona de Matosinhos onde vivia.

MF – Ainda segue a vida do FC Porto?
CR – Sim, os resultados vejo sempre. Estamos no primeiro lugar com o Benfica.

Moutinho e Cristian em abril de 2011

MF – Agora não, o FC Porto empatou na Madeira e o Benfica ganhou.
CR – Sim? Não sabia. Então agora estamos dois pontos atrás? O FC Porto tem sido menos vezes campeão e isso não é normal. O futebol nem sempre é fácil de explicar.

MF – Falemos então do Benfica. Chegou ao clube em 2007 com 22 anos.
CR – Sim, emprestado pelo PSG. Precisava de jogar, de ter minutos e a liga portuguesa pareceu-me muito bem. Fiz uma época bastante boa, havia até a possibilidade de continuar na Luz, mas as coisas não andavam e, entretanto, fui abordado pelo FC Porto. O Benfica era um clube… confuso. Toda a gente reclamava muito. Ficámos no quarto lugar, trocámos de treinador logo no início da época [Fernando Santos por Camacho] e senti que era no Porto que podia ser feliz e ganhar tudo.

MF – Mas sabia que ao sair do Benfica para o Porto ia ser criticado e acusado de traidor.
CR – Sabia, claro, mas para mim foi um ato de coragem e não uma traição. Eu só sou adepto do Peñarol, na altura era o único clube do meu coração. Depois passei a ser adepto também do FC Porto. Mas, como dizia, eu só seria incapaz de trocar o meu Peñarol pelo Nacional de Montevideu. Isso sim, seria uma traição. O Porto confiou em mim, aceitei o desafio e senti-me rapidamente parte dessa família.

MF – Demorou mesmo só cinco minutos a optar pelo FC Porto, como se dizia na altura?
CR – Acho que foi menos até (risos). Sim, reuni-me em Milão com a direção e foi muito fácil dizer ‘sim’ ao Porto.

MF – Os números dizem que acertou ao mudar da Luz para o Dragão.
CR – Três campeonatos, três taças, três supertaças e uma Liga Europa, não é? Não é preciso dizer mais nada. 

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