Fede Ferrara: jogou no Milan e está no Porto para ser dentista - TVI

Fede Ferrara: jogou no Milan e está no Porto para ser dentista

Federico Ferrara

Entrevista-Maisfutebol com um internacional jovem por Itália, a viver na Cidade Invicta e a cursar Medicina Dentária na Universidade Fernando Pessoa

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Nasceu em Odessa, Ucrânia, por acidente; cresceu em Barcellona Pozzo di Gotto, Sicília, por convicção; jogou no AC Milan, a partir dos 12 anos, por realização; representou a Itália, em seleções jovens, por devoção; caiu na cidade do Porto, e na licenciatura de Medicina Dentária, quase por obrigação.

Federico Fellini não faria melhor do que a vida real de outro Federico, este Ferrara.

Por partes: quem é, afinal, Federico Ferrara? Italiano, 22 anos, aspirante a dentista na cidade do Porto e na Universidade Fernando Pessoa.

O que esconde o seu passado? Nada que ele não nos possa contar.

«Sim, joguei no AC Milan dos 12 aos 16 anos. E nas seleções de Itália. Mas tive de desistir do futebol por uns tempos.»

As primeiras impressões do Maisfutebol nascem num campo de futebol de cinco. Federico destaca-se dos demais, isso é evidente desde o primeiro segundo. E então o que faz ali este talentoso italiano?

«Bem, nesta altura estou a concluir o curso e quero ser dentista. Vou ficar mais dois ou três anos no Porto. Só me falta um clube de futebol. Sou um bocado tímido, tenho vergonha de pedir oportunidades.»

Calma, vamos lá, há aqui pontas soltas. Como se passa do AC Milan e da Squadra Azzurra ao mais perfeito anonimato na Invicta cidade?

Messina-Reggio Calabria: «Entrar e sair de barcos, todos os dias»

Barcellona Pozzo di Gotto, costa norte siciliana, 40 mil habitantes, águas mornas e gentes impulsivas. É aqui que Federico passa os primeiros anos de vida, após o regresso apressado da Ucrânia, onde nasce por acidente e precocemente.

«Estava com pressa. Apanhei a minha mãe desprevenida (risos).»

Federico está há um ano e meio no Porto, expressa-se num Português dirigido por Mastroianni e esculpido por Benigni. Sim, Federico é apaixonado por Cinema, sabedor e sereno, muito sereno. 

Do que ele mais gosta, porém, é de futebol. Calcio, puro e duro. «O meu pai pôs um dia uma baliza no jardim de casa e nunca mais parei. Com cinco anos inscrevi-me no Igea Virtus, um pequeno clube siciliano e aos 11 anos fui contratado pela Reggina.»

Federico apanhava todos os dias o barco que liga Messina a Reggio Calabria. 45 minutos nas ondas suaves do Mediterrâneo, a sonhar futebol, a sentir futebol, a viver futebol.

«Perguntaram ao meu pai se eu podia ir lá treinar… bem, fui e fiquei. Os meus dias eram loucos, mas uma criança nunca se cansa. Acordava muito cedo, ia para a escola, almoçava a correr e apanhava o barco», recorda Federico Ferrara ao Maisfutebol.

«Uma carrinha do clube apanhava-me no porto de Reggio Calabria. Sentia-me importante. Durante um ano inteiro, acho que a minha vida foi isso: entrar e sair de barcos (risos).»


Clone de Schweinsteiger, fã de Nesta, bianconero

Fede remata, Fede rouba, Fede marca de pé esquerdo e pé direito. Neste jogo de amigos, a qualidade do Ferrara italiano é um abuso. É a mesma qualidade que o AC Milan descobriu e quis um dia.

«Fui contratado com 12 anos. E sou tifoso da Juventus (risos). Os senhores do Milan falaram com o meu pai e comigo, aceitei abandonar a minha ilha e apostar a sério no futebol.»

Bianconero militante, em busca de um sonho, em busca de Alessandro Nesta. «Sim, foi sempre o meu grande ídolo. E defesa central, como eu. Conheci muitos craques, olhei e invejei todos eles. Mas agora até dizem que sou parecido com o Schweinsteiger.»

Confirma-se. As fotografias não nos deixam mentir. 

 «Acreditei que podia ser profissional. Tive uma lesão grave e fui obrigado a voltar à Sicília. Por questões familiares. Não podia ficar mais tempo longe de casa.»

Em Itália, aos 16 anos, Federico precisava de um tutor legal. Estava há quatro anos longe dos pais. O clube não se disponibiliza, não assume a responsabilidade, a família Ferrara não arrisca e Fede volta a Barcellona.

«Ainda joguei no SS Milazzo, clube da Serie C na altura, e depois no Messina, na Serie B. Aos 18 anos, com a entrada na universidade, tive de tomar decisões e os meus pais quiseram que apostasse num curso universitário. É assim que surge a Medicina Dentária.»


Uma francesinha e arroz de marisco: bem-vindo ao Porto!

As notas no secundário não chegam para o acesso a Medicina. Federico opta por Dentária e pelo Porto. A influência surge através dos pais de uma amiga e, por conseguinte, dos próprios pais. 

«Falaram-me do Porto, de Portugal e que essa amiga adorava estar cá. Arrisquei e aproveitei o intercâmbio entre universidades. Como estava numa fase de dúvidas dentro do futebol, achei que o melhor era não contrariar o meu pai (risos)».

Outubro de 2015, Fede aterra no Porto, sozinho e sem falar a nossa língua. Conhece a casa e pergunta pelo restaurante mais próximo. Quer provar uma francesinha e comer arroz de marisco.

«Todos me falavam disso. Adorei. Comi tudo na primeira refeição no Porto. Estou cá há um ano e meio e a adorar. Acho que poucos sabem que joguei no AC Milan e na seleção de Itália.»

Federico deseja concluir o curso, mas não consegue estar muito mais tempo longe dos relvados. Com este currículo rico, não arranja um clube em Portugal?

«Fui ao Salgueiros perguntar o que era necessário para me inscrever. Não conheço ninguém, sou um bocado tímido… Talvez alguém leia esta entrevista e me convide.»

Da Sicília ao AC Milan, da seleção de Itália à Medicina Dentária, de Barcellona Pozzo di Gotto à cidade do Porto.

História assim, nem Fellini, nem Mastroianni.


 

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