Do basebol ao Santa Clara em oito anos: «Foi tudo muito rápido» - TVI

Do basebol ao Santa Clara em oito anos: «Foi tudo muito rápido»

Entrevista ao futebolista venezuelano do Santa Clara, Mikel Villanueva – Parte II

Chegou aos Açores em agosto para representar o Santa Clara. Nascido em San Cristóbal, na Venezuela, a 14 de abril de 1993, Mikel Villanueva tem um percurso pouco comum no futebol. Até aos 19 anos, o defesa central, que tem ascendência espanhola – um avô era basco, uma avó galega – jogou basebol cerca de 15 anos. Mas num dos desportos de referência no seu país natal, viu que não ia dar para ser profissional. Ingressou então na universidade para estudar engenharia industrial, aí começou a jogar futebol e despontou a atenção do clube da sua cidade, o Deportivo Táchira.

Em oito anos, foi do basebol ao futebol. Da Venezuela a Portugal. Pelo meio, uma viagem incrível em Espanha. Começou e acabou no Málaga, onde foi dos campos modestos da quarta divisão até à Liga em um ano. Jogou contra Ronaldo no Bernabéu, contra Neymar em Camp Nou. Viveu, no Reus, uma crise sem precedentes num clube que foi expulso do futebol profissional. Agora, em Portugal, quer singrar, de olho numa inédita qualificação com a Venezuela de José Peseiro para o Mundial 2022. Tem 27 internacionalizações e dois golos pela 'vinotinto'.

Maisfutebol (MF) – Tem raízes espanholas. Foi um sonho concretizado jogar em Espanha?
Mikel Villanueva (MV) –
Claro, foi um sonho jogar lá na liga, muito importante. Estive depois na segunda liga e agora continuo a viver o sonho, porque em Portugal há uma liga muito boa.

MF – O seu avô era basco, a sua avó galega. Desfaça a curiosidade: gostava de jogar no Celta, no Depor, na Real Sociedad ou no At. Bilbao? Chegou a ser falado para o Athletic…
MV –
Na verdade, sim. Sempre quis jogar no Athletic, o meu avô era de lá, gostava muito de futebol e encantar-se-ia que algum dos seus netos pudesse jogar no At. Bilbao.

MF – Como aconteceu a mudança para Espanha?
MV –
Fiz uma época boa na Venezuela e o meu representante conseguiu uma oportunidade na filial do Málaga [Atlético Malagueño]. Não pensei muito, queria sair. Ir para Europa, mais ainda. Foi para um clube bom em Espanha e foi a melhor decisão.

MF – Vai para a equipa secundária do Málaga no quarto escalão em 2015/2016. Na época seguinte, dá o salto para a principal na I Liga. Só fez 17 jogos, mas alinhou em cinco dos estádios mais míticos: Santiago Bernabéu, Camp Nou, Sánchez Pizjuán, Mestalla e no Vicente Calderón…
MV –
Para todos os jogadores, jogar aí é muito bonito e ficam as recordações, oxalá possa voltar a jogar lá no futuro e há que continuar a trabalhar para poder conseguir isso.

MF – Defrontou Ronaldo, Neymar ou Griezmann nesses jogos...
MV –
Tenho memórias, fotografias guardadas, recordações bonitas desses jogos importantes.

MF – Como foi defrontá-los?
MV –
Muito bom. Eu às vezes defronto jogadores assim quando vou à seleção. Na América do Sul as seleções já têm jogadores bons a nível mundial. Aqui na Liga também há jogadores muito bons e temos de ter concentração a 100 por cento em qualquer jogo. Contente por jogar contra todos estes jogadores de topo.

Mikel Villanueva contra Cristiano Ronaldo, num Málaga-Real Madrid, em 2017 (Daniel Tejedor/AP)

MF – Em Espanha esteve ainda três épocas na II Liga e viveu aquela crise no Reus em 2018, desde a falta de pagamentos à expulsão do clube do futebol profissional. Como foi a sua situação?
MV –
Foi difícil passar por essa situação. Todos os jogadores ficaram livres. O futebol é isto: decisões. Não sei se foi má decisão ir para lá, mas tive de passar por este momento incómodo para mim e para todos os jogadores. São coisas que fazem com que cresçamos e aprendamos como jogadores e pessoas. Não me arrependo de ter ido para lá, tínhamos uma grande equipa, mas lamentavelmente, por coisas alheias a nós, por coisas do clube, passámos por isso.

MF – É verdade que é fã do Dani Agger, que jogou no Liverpool?
MV –
Sim, gostava muito dele, da sua maneira de jogar, de defender. Há bons jogadores que sigo agora, o Sergio Ramos... o Van Dijk também é muito bom, mas não tenho uma referência.

MF – Tem um passado ligado ao basebol. Conte-nos esse percurso.
MV –
Eu joguei basebol a minha vida toda, nunca joguei futebol, só jogava com os meus amigos na rua. Mas no basebol não ia ser profissional, entrei para estudar na universidade e a equipa da minha cidade [Deportivo Táchira] viu-me a jogar [futebol] e perguntou-me se eu queria jogar futebol. Eu disse que sim, mas sem qualquer tipo de compromisso, só como hobbie. Depois vi, aos poucos, que estava a sair-me bem, fui levando mais a sério e assim começou. Comecei a jogar com esta equipa profissional da minha cidade, depois passei a outra equipa na Venezuela [Deportivo Lara, em 2014/2015], joguei lá um ano e fui para Espanha. Foi tudo muito rápido. [Ao fim de] três anos a jogar futebol já estava em Espanha.

MF – Porque é que não chegou a ser profissional de basebol?
MV –
Não sei… não tive o nível suficiente para ser profissional no basebol.

MF – Em que posição jogava?
MV –
Shortstop [ndr: interbases, joga entre as segunda e terceira bases].

MF – Então foi na universidade que começou a jogar futebol. Que idade tinha?
MV –
Comecei a jogar aos 19 anos. Eu jogava antes, desde miúdo, mas nunca [joguei] numa escola. Nunca joguei nos sub-20… na Venezuela só joguei na seleção principal.

MF – Com que idade começou no basebol?
MV –
Quatro anos, mais ou menos.

Mikel Villanueva jogou basebol cerca de 15 anos (Fotografia cedida pelo atleta)

MF – Acabou por ser uma boa decisão seguir o futebol…
MV –
Sim. No basebol, na verdade, não ia ter oportunidades. Dediquei-me a estudar, já pensando que não ia poder dedicar-me ao basebol e deu-se a oportunidade de jogar futebol. Saiu-me tudo bem e cá estou.

MF – Na universidade estudou engenharia industrial. Era algo que gostava de seguir?
MV –
Estive dois anos e meio, mais ou menos, na universidade, em San Cristóbal. A minha carreirauniversitária está parada, não sei se vou retomar. Agora, estou focado na minha carreira no futebol e terei de pensar no que vou fazer depois. Esta carreira é curta. O meu pai é engenheiro civil e a engenharia sempre me chamou a atenção.

MF – Longe da Venezuela, vai mantendo contacto com a família, acompanhando a situação do país? No domingo, inclusive, houve eleições legislativas, ganhas por Nicolás Maduro.
MV –
Tenho a minha família lá, estou atento a tudo: como está a viver a família e estar consciente da situação do país. Para nós, que estamos fora, é importante saber se a nossa gente está bem, se se vê que vai mudar o panorama político. Estamos atentos a tudo.

MF – No futebol foi tudo rápido. Para futuro, que sonhos ainda tem?
MV –
Continuar na Europa. Para mim é importante continuar aqui, jogar nas melhores ligas do mundo. Não tenho uma liga específica, mas quero continuar na Europa e competir ao mais alto nível.

MF – Em Portugal, gostava de chegar mais longe?
MV –
Sim, parece-me uma liga muito boa e é importante jogar aqui. Como disse, na Europa, sem dizer uma liga em específico, esta liga também é boa.

Continue a ler esta notícia