«Mal saí do avião, pensei: vai ser impossível jogar aqui» - TVI

«Mal saí do avião, pensei: vai ser impossível jogar aqui»

Bruno Moreira

Num país com calor e humidade constantes, e comida «muito, muito, muito picante», os adeptos tratam Bruno Moreira quase como Ronaldo ou Messi. Há um presidente que «só anda de mota com dez seguranças atrás», e a mulher dele que lidera a claque

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Estórias Made In é uma nova rubrica do Maisfutebol que olha para os portugueses no estrangeiro. Há um português a jogar ou a treinar em cada canto do mundo e este é o espaço em que relatamos as suas vivências:

Aos 28 anos, Bruno Moreira embarcou numa nova aventura. Pegou na família e mudou-se para Buriram na Tailândia, uma cidade de 30 mil habitantes, numa província com 1,5 milhões de pessoas, a mais de 10 mil quilómetros de Paços de Ferreira, cidade onde jogou nas últimas duas épocas. Do outro lado do mundo, tudo é diferente e quando chegou, pensou que nem conseguiria jogar ali.

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«Não conhecia o país, foi a primeira vez que cá vim, e no início foi um pouco complicado, tanto para mim como para a minha família. Estamos noutro continente e é tudo diferente», conta o avançado ao Maisfutebol.

O choque aconteceu logo à chegada. «O clima foi a primeira coisa que estranhei. Mal saí do avião apanhei aquele choque térmico e pensei: vai ser impossível jogar aqui». É que, em qualquer altura do ano, «o calor e a humidade estão sempre presentes».

«De vez em quando temos chuvas torrenciais, mas duram 15, 20 minutos, e passam. Depois está novamente sol e até fica mais calor», explica, garantindo: «Agora já estou habituado, rotinado neste tempo».

As diferenças não se esgotam por aí. «Quando cheguei, fiquei dois, três dias, em Banguecoque e, logo aí, foi um contraste enorme. É uma cidade enormíssima, onde tem tudo, muito movimentada, milhões de pessoas… podem ser 10 da manhã, três da manhã, que o trânsito é sempre o mesmo. Incrível, incrível, incrível».

«Depois vim para Buriram e é completamente o oposto. É uma vilazinha pequenina, em construção, com pessoas muito humildes. Do género de uma aldeia em Portugal. E foi mais um choque depois da enormidade de Banguecoque. Mas, aos pouquinhos, depois de conhecer a cidade, já estamos adaptados. É uma cidade tranquila, que tem tudo o que é preciso para viver bem e com qualidade. E, como profissional de futebol, acho que prefiro viver aqui do que em Banguecoque».

Há coisas a que a família não se habitua. «Não gostamos de comida tailandesa, é muito, muito, muito picante. Sempre que vamos jantar fora, a primeira coisa que fazemos é pedir para trazerem sem picante. Não sei como é que eles conseguem alimentar-se assim. E depois também comem alguns bichinhos, insetos. Nunca experimentei, nem tenho vontade de experimentar», garante.

Alguns hábitos também causaram estranheza. «Os tailandeses têm o costume de se descalçarem em todos os sítios em que entram. Têm uma rotina de alimentação diferente da nossa. Almoçam por volta das três, quatro da tarde e ao pequeno-almoço comem comida normal, igual à das outras refeições».

E circular, para quem não está habituado, pode ser uma aventura. «Senti um pouco de dificuldade na estrada, porque eles conduzem ao contrário e são muito loucos a conduzir. Usam muito a mota, mais até do que os carros. É uma confusão porque muitos deles também não respeitam as regras da estrada e temos que estar precavidos». Ainda assim, Bruno Moreira conta que é de mota que se desloca.

«O clube ofereceu o carro, mas eu deixo-o com a minha esposa porque ela ou a minha filha podem precisar de algo, e optei por alugar uma vespa, que é o veículo em que eu me dirijo sempre para o treino, todos os dias. Tenho que ter muito cuidado porque eles são bastante perigosos, mas, pelo calor que faz, e por ser uma distância curta, por acaso gosto».

Contudo, o avançado deixa uma garantia: «Em Banguecoque não experimentei, nem experimento. É impossível».

Apesar de ser caótica, a capital da Tailândia já está nas preferências do jogador. «Adoro estar em Banguecoque». E nas folgas dá para visitar destinos de sonho. «Já fui para as Phi Phi, para Phuket, Krabi, já conheci muitas praias da Tailândia. São lindíssimas».

E as pessoas também já ocupam um lugar especial no coração do jogador português. «O povo tailandês é tão fácil de lidar, mesmo que não se saiba falar tailandês, nem eles saibam português. São tão simples, tão humildes. As pessoas mais fantásticas que eu já conheci».

E, para facilitar a comunicação, a família também já foi apreendendo «algumas palavras em Tailandês, como “obrigado” e “bom dia».

A tirar fotos com os adeptos

Diferentes dos europeus são também os adeptos, garante Bruno Moreira. «Em todos os sentidos». «São fervorosos. Apoiam, quer a equipa ganhe, quer a equipa perca. Do primeiro ao último minuto, não param na bancada. Acho que eles até fazem mais quilómetros e desgastam-se mais do que os próprios jogadores. Estão sempre a cantar, com tambores, mesmo quando jogamos fora. São incríveis», conta.

E há uma particularidade. «A esposa do nosso presidente é a chefe da claque, é ela que organiza tudo, que move as pessoas para fazer barulho e nos apoiarem».

«Na rua é quando aqui nos sentimos mais jogadores porque eles têm uma admiração fantástica por nós. A nossa marca, a nossa imagem, está espalhada pela cidade. Há panfletos dos jogos que vamos ter, publicidades… tudo com a nossa imagem. Não somos Cristiano Ronaldo nem Messi, mas aqui somos parecidos. Somos os heróis deles, as pessoas que os fazem felizes», relata, contando que o carinho dos adeptos vai aumentando. «As pessoas vão-me reconhecendo e gostam cada vez mais de mim. Por vezes vou ao shopping e as pessoas ficam a olhar, pedem para tirar fotografias».

«E é incrível como a cidade se veste com a camisola do clube. A maior parte das pessoas não anda com roupa normal, anda com a camisola do clube, quer haja jogo, quer não haja», explica.

Se a mulher do presidente lidera a claque, o presidente lidera sempre a comitiva. «Ele é um ex-político, uma das pessoas mais ricas da Tailândia, muito conhecido e adorado por muitos e odiado por outros tantos. Está sempre presente em todos os jogos e em todos os treinos», começa por contar.

«Ele só anda de moto e anda sempre com dez seguranças atrás também de moto. Quando vamos de estágio, por exemplo em Banguecoque, saímos do hotel para o estádio e, à frente do nosso autocarro, vai ele e os dez seguranças. Aquilo é impressionante».

Com o presidente do clube, Newin Chidchob

Quase a fazer três anos, a filha de Bruno Moreira foi quem menos estranhou a mudança. «Como ainda é uma bebé, não teve grandes dificuldades em relação ao que estava habituada em Portugal. Agora já anda na escola. Abriu uma escola nova de inglês, e ela anda lá na escola com os miúdos de outros colegas meus. E isso também é importante para ela».

Os pais também encontraram os seus espaços de socialização. «Tive sorte porque encontrei quatro brasileiros na equipa, pessoas que falam a mesma língua. Há também um espanhol e tenho treinadores que falam espanhol. Isso ajuda logo. Nos dias de folga juntamo-nos sempre em casa de um ou de outro, fazemos aqueles churrascos. E esses momentos são importantes para quem está fora do país para ganharmos mais energia para enfrentar o dia-a-dia».

Bruno Moreira e a família posam para uma foto

Ainda assim, não hesita quando lhe perguntam se sente falta das terras lusas. «Sentimos todos falta de Portugal, desde o dia em que partimos. O campeonato termina em final de outubro e ainda tenho mais dois anos de contrato».

Mas garante: «Estou feliz. Estou num grande clube onde as pessoas me tratam super bem e me ajudaram bastante na adaptação, principalmente aos costumes daqui. Nunca, em momento algum, me arrependi de ter vindo para cá. Sinto-me bem, estou a gostar bastante, e com confiança de que, daqui em diante, tudo vai correr bem e que a vontade de estar aqui ainda vai ser maior».

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