Perturbações sexuais e de sono, depressão, lesões: a Covid-19 e os atletas - TVI

Perturbações sexuais e de sono, depressão, lesões: a Covid-19 e os atletas

Espanhóis na ponte de Toledo, em Madrid, nos primeiros dias de desconfinamento, a 3 de maio (AP/Manu Fernandes)

Estudo da Universidade de Lisboa faz um levantamento preocupante sobre as consequências da pandemia no mundo do desporto em Portugal. Liliana Pitacho, uma das investigadoras, lança um alerta sério através do Maisfutebol

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Os números perturbam: mais de 50 por cento dos atletas evidencia «níveis patológicos de stress» provocados pela suspensão das atividades desportivas; mais de 75 por cento sente-se «mais infeliz» do que antes do bloqueio social imposto pela pandemia; mais de 40 por cento passou a sofrer de perturbações do sono, «com risco elevado para a saúde»; mais de 50 por cento não teve «nenhum tipo de apoio» por parte do respetivo clube no período pós-pandemia. Apenas 13,3 por cento recebeu suporte psicológico dos mesmos clubes.

Os dados estão incluídos no estudo ‘Da paixão ao Abismo: O Impacto Indireto do Covid-19 na Saúde Psicológica dos Atletas’, um levantamento efetuado pela Universidade de Lisboa, «poucas semanas depois» da declaração de pandemia mundial por parte da OMS.

A doutora Liliana Pitacho é um dos investigadores responsáveis pelo documento e assume ao Maisfutebol a sua «preocupação» perante a dimensão das consequências provocadas pelo confinamento e, em muitos casos, abandono da atividade desportiva. Liliana foi ao longo de duas décadas praticante de hóquei em patins.

O estatuto, aqui, nem é o mais relevante. Profissionais, semi-profissionais, amadores, todos sofreram na pele a ditadura do abandono. «Os números são claros em relação a isso e evidenciam, além disso, uma incerteza generalizada sobre a retoma da normalidade», sublinha Liliana Pitacho.

O Estádio Universitário de Lisboa foi hospital de campanha nos dias mais duros da pandemos



Esse é outro dos lados perversos de tudo isto. O lado mental e o lado financeiro andam, «em muitos casos», de mãos dadas. «Todos os números que constam do nosso trabalho são agravados pelos cortes salariais verificados na interrupção competitiva», assinala a docente da Universidade de Lisboa.

O fluxo noticioso é brutal e já não deixa espaço para grandes novidades. Fala-se, essencialmente, da mudança abruta de paradigmas que constituíam as nossas vidas. No mundo do desporto, e para tantos e tantos atletas, esse corte de rituais foi particularmente danoso.

Neste dossier da Universidade de Lisboa foram ouvidos «mais de 1400 atletas de oito modalidades coletivas» e inclui jovens e menos jovens. O que se segue? Quais as soluções e os horizontes possíveis em dias de tanta incerteza.

«Essa incerteza é generalizada», concorda Liliana Pitacho. «Não tem um dado concreto em relação ao número de atletas infetados pela covid-19, dentro do universo dessas 1400 pessoas que ouvimos, por exemplo. É muito importante que este estudo seja conhecido, para que haja real consciência real relativamente à saúde mental, e não só, dos desportistas em Portugal.»

Um dos pontos mais relevantes da investigação está ligada ao «aumento da probabilidade de lesões». «Há um aumento de problemas musculares, de vulnerabilidade à lesão. E a isso temos de juntar a quebra de produtividade, de baixa de rendimento. As alterações metabólicas provocadas pela falta de descanso podem também provocar mais fadiga e falta de energia. Tudo isto está bem patente nos testemunhos recolhidos pela nossa equipa.»

O organismo humano não estava preparado para este choque. Falamos de saúde mental, do aumento assustador do número de depressões e em tudo o que o acompanha. Tensão, problemas sexuais, diabetes, doenças cardíacas e cerebrovasculares, sistema imunitário fragilizado e alterações comportamentais: irritabilidade, falta de memória e concentração, ansiedade e, em casos extremos, recurso ao consumo de substâncias estupefacientes.

A Universidade de Lisboa organiza e oferece um verdadeiro trabalho de serviço público. As consequências já conhecidas são devastadoras e o otimismo ainda não tem hora marcada. É um estranho mundo novo, na sociedade e no desporto.

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