Estilo de liderança de Sérgio Conceição ajudou a ganhar o campeonato - TVI

Estilo de liderança de Sérgio Conceição ajudou a ganhar o campeonato

«FC Porto contratou-me para eu ter mau perder»

Treinador do FC Porto é um líder entre o autoritário e o modelo, o que numa época anormalmente crítica fez a diferença nos momentos determinantes.

Todos sabemos que esta foi uma época atípica. Por isso, o papel do treinador e os seus estilos de liderança, tiveram uma influência ainda mais determinante na definição do histórico campeonato 2019-2020.

Num outro artigo que escrevi - «Líder Camaleão: o que se pede a um treinador desportivo» -, já foi explorada a temática dos diferentes estilos de liderança e quais as suas características, enquadrando-os no contexto desportivo. Quando olhamos para as características vincadas e naturais dos treinadores Sérgio Conceição e Bruno Lage, conseguimos claramente captar os seus principais estilos de liderança.

No caso do primeiro, varia entre três estilos: o autoritário, o visionário e o pacesetting (que podemos traduzir como lider modelo). Para Goleman, qualquer um destes três estilos tem probabilidade de sucesso quando é necessário uma mudança clara de direção e, no caso dos estilos autoritário e pacesetting, para lidar com crises ou ter resultados positivos rapidamente.

Ao longo da época, situações como a reprimenda a Nakajima, as picardias com outros técnicos ou as críticas internas ao clube (sobretudo depois de derrota na final da Taça da Liga) demonstram estes estilos de liderança de forma clara. Vale a pena lembrar, já agora, declarações como «não vim aqui para aprender, vim ensinar» ou «quem me conhece sabe que gosto de rigor e disciplina», que também denunciam um líder autoritário ou pacessetter.

Bruno Lage utiliza preferencialmente três estilos: coaching, afiliativo e democrático. Todo estes estilos são excelentes numa perspetiva a longo prazo, o que pode ajudar a explicar o passado dele enquanto treinador de formação. Para além disso, os discursos pacificadores nas conferências de imprensa, sair sempre em defesa dos atletas de forma paternal (mesmo que signifique apostar num jogador incerto em detrimento de um de créditos firmados) ou tentar recuperar um jogador aparentemente esquecido (Adel Taarabt, por exemplo) são ações que vincam estes estilos do treinador. No próprio discurso de Lage encontramos frases como: «O Rui Costa disse-me que eu é que mandava», «quero agradecer aos jogadores porque estão a fazer de mim treinador» ou «não poderia abandonar Fejsa ou Jardel», que evidenciam estes seus estilos predominantes.

Como referimos anteriormente, os estilos preferenciais de Conceição produzem excelentes resultados quando se pretende um ganho rápido e em momentos de grande pressão, já que o líder orienta a equipa passo a passo para o que se pretende. Por isso, não é de estranhar que, ao longo de toda a época, quando o FC Porto jogou a seguir ao Benfica, venceu 90 por cento das vezes. Já quando jogou antes venceu apenas 45 por cento das vezes. Mais interessante ainda de analisar, depois da pausa provocada pelo coronavírus, quando jogou a seguir ao seu rival o FC Porto venceu 100 por cento dos jogos. Já quando jogou primeiro, venceu apenas 33 por cento.

Mesmo sabendo que o FC Porto já estava num ciclo positivo de resultados antes do confinamento, a verdade é que foi depois de um momento de crise - derrotas com Sp. Braga - que novamente os estilos de liderança de Sérgio Conceição demonstraram a sua eficácia. Todos certamente se recordam do discurso sobre a falta de união no clube quase deixando transparecer que se quisessem vencer tinham de o apoiar a 100 por cento. Nos sete jogos seguintes, venceu seis e empatou um.

Se fizermos a mesma análise ao Benfica, verificamos que quando jogou primeiro a percentagem de vitórias foi de 75 por cento ao longo de toda a época. Já quando jogou a seguir ao FC Porto, esta cai para 67 por cento. Não existe uma diferença substancial, mas se isolarmos o espaços temporal entre as jornadas 25 e 31, percebemos que a percentagem de vitórias do Benfica cai para 29 por cento. O que produziu resultados catastróficos na classificação.

Até aqui já todos sabemos que o campeonato ficou marcado por dois momentos: jornada 20 (jogo FC Porto-Benfica) e jornada 25 (retoma pós-confinamento). Outro dado que reforça o impacto do tipo de liderança na produtividade da equipa: golos marcados na primeira e segunda partes. O Benfica, até à paragem do campeonato, tinha 77 por cento dos golos marcados na segunda parte, numa clara demonstração que a pressão não existia e que marcar «era uma questão de tempo». Contudo, a partir da jornada 25 até à 31, o número de golos marcados na segunda parte caiu para 45 por cento.

Se analisarmos os dados do FC Porto verificamos o inverso: até ao confinamento, marcava 44 por cento dos golos na segunda metade do jogo, mas depois da retoma, com a necessidade de ganhar, mesmo a jogar contra o relógio, marcou 80 por cento das vezes nesse período.

Aos estilos de liderança mais salientes em Sérgio Conceição - autoritário, visionário e pacesetting - é reconhecida a capacidade aglutinadora e motivadora a curto prazo. Por isso não é difícil imaginar que os discursos ao intervalo terão instigado à eficácia da sua equipa. Não conseguimos comprovar esta ideia, mas pelos exemplos de outros líderes com estes estilos de forma vincada - vejam, por exemplo, Pep Guardiola na série All or Nothing: Manchester City - sabemos que a arte de comunicar está constantemente presente.

Ao longo deste campeonato observámos o quanto uma equipa é o reflexo do seu líder, tanto das suas ideias como da sua mentalidade. Os dois clubes que têm partilhado o trono do futebol português deram-nos o privilégio de assistir a um confronto de estilos de liderança pelos seus treinadores e possibilitaram-nos excelentes reflexões. Na montanha-russa da performance de uma equipa de alto rendimento, o líder de maior sucesso será aquele que consegue agir em função das necessidades que surgem, tornando-se num treinador camaleão.

Todos os estilos de liderança podem levar um clube ao sucesso? Sem dúvida. Depende daquilo que é a cultura da instituição, dos jogadores disponíveis, da margem para errar, dos líderes superiores, enfim. Se na época anterior, um estilo de liderança mais focado no futuro, paciente e democrático, em que os jogadores, quando estão na flow e não sentem pressão, levou ao sucesso; este ano, nos momentos de crise de resultados, pela pausa causada pela pandemia ou pela concentração decisiva de jogos num curto espaço de tempo, um estilo de liderança mais diretivo fez do FC Porto campeão.

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