Mário Soares "odiava a Europa dos desistentes" - TVI

Mário Soares "odiava a Europa dos desistentes"

  • CM
  • 31 jan 2018, 13:47
Mário Soares (1924-2017)

Parlamento Europeu recorda papel fundamental do antigo Presidente da República na construção da Europa

O primeiro-ministro, António Costa, realçou, nesta quarta-feira, em Bruxelas, a "militância europeia" de Mário Soares, que "via na Europa unida uma das mais admiráveis construções políticas e morais da história humana" e "odiava" a Europa dos tecnocratas, resignados e desistentes.

Cerca de um ano sobre o falecimento de Mário Soares, o Parlamento Europeu homenageou hoje o antigo chefe de Estado e de Governo português atribuindo o seu nome a uma das salas da assembleia em Bruxelas, numa cerimónia muito concorrida, na qual António Costa iniciou a sua intervenção saudando esta homenagem à “memória de um grande homem, de um grande português, de um grande europeu e de um grande cidadão do mundo”.

Soares via na Europa Unida uma das mais admiráveis construções políticas e morais da história humana, de que os cidadãos e os povos europeus tinham o direito, e até o dever, de se orgulhar. Por isso, odiava a Europa dos burocratas e dos tecnocratas, a dos resignados e a dos conformistas, a dos financistas e a dos cínicos, a dos céticos e a dos desistentes”, disse.

Lembrando o percurso de Mário Soares e o seu papel de “resistente à ditadura”, assim como à “radicalização da Revolução (do 25 de Abril de 1974) e à tentação totalitária que a acompanhava”, António Costa apontou que, “no desempenho dos mais altos cargos - secretário-geral do PS, dirigente da Internacional Socialista, primeiro-ministro, Presidente da República - o grande e permanente objetivo de Soares foi instituir, consolidar, aprofundar e enraizar em Portugal, sem ambiguidades, adiamentos ou álibis, uma democracia europeia, civilista, pluralista, pluripartidária e desenvolvida”.

Soares conseguiu e isso foi um grande feito. Ganhou ele, ganhou Portugal, ganhou a Europa. Com uma ousada visão estratégica, que não vacilou um instante, foi Soares quem subscreveu, logo em 1977 o pedido de adesão de Portugal à então CEE. Foi ainda ele que, em 1985, logrou concluir as negociações e assinar o Tratado de Adesão”, recordou.

António Costa sublinhou que “se Soares lutou sempre por um Portugal europeu, lutou e militou também sempre por uma Europa moderna que esteja à altura da sua melhor tradição e dos altos desígnios dos seus pais fundadores”.

Ao longo dos anos, Mário Soares esteve entre os políticos europeus que mais falaram e escreveram sobre a Europa. Os seus escritos testemunham as suas alegrias e os seus apelos, as suas euforias e as suas preocupações, as suas advertências e as suas deceções, as suas propostas e as suas indignações. Soares foi um militante da Europa”, tendo mesmo sido deputado ao Parlamento Europeu (1999-2004), assinalou.

Regozijando-se por, com esta homenagem, o nome de Mário Soares se juntar, “merecidamente, no Parlamento Europeu aos nomes de outros europeus ilustres, como Konrad Adenauer, Altiero Spinelli, Willy Brandt e Simone Veil, de alguns dos quais foi amigo”, António Costa defendeu que, “num tempo de mudanças, dificuldades e perplexidades (…) os grandes europeus e o seu exemplo edificante são um património” que deve ser valorizado e divulgado.

“Agradeço, como português e cidadão europeu, e em nome do Governo português e de Portugal, esta homenagem. Estamos muito reconhecidos aos que dela tiveram a iniciativa e a todos os que a tornaram possível. Portugal tem muito orgulho em Mário Soares, e sabemos que a Europa a que, em grande parte graças a ele, pertencemos e que ele ajudou a construir, partilha connosco este orgulho reconhecido e inspirador”, completou.

Parlamento Europeu recorda papel fundamental

O vice-presidente do Parlamento Europeu recordou hoje, na cerimónia de homenagem a Mário Soares, o papel fundamental do antigo chefe de Estado e de Governo português na construção da Europa, considerando-o como “um dos nobres pais” da União Europeia.

Este é um dia e um momento importante para a história da Europa. Temos de perceber que não podemos tomar como um dado adquirido a democracia, a República. Temos de lutar por isso. Sabemos como a batalha e o caminho seguidos por pessoas como Mário Soares foram fundamentais para a Europa”, salientou David-Maria Sassoli.

O vice-presidente do PE enalteceu o papel de Mário Soares como “grande estadista do século XX”, mas, sobretudo, como “grande personalidade que deu um sentido completo à ideia da política como serviço público”.

Mário Soares é o pai fundador do Portugal democrático e um dos nobres pais da União Europeia. Estes são dois mecanismos da mesma engrenagem. Mário Soares, com a sua obra, deixou-nos tantas reflexões que podem ser úteis ainda nos dias de hoje. O seu legado político deverá servir-nos como um manual de instruções para os dias que correm. Para o PE, este é um dia de festa”, reconheceu.

Cerca de um ano sobre o falecimento de Mário Soares, a instituição homenageou hoje o antigo chefe de Estado e de Governo português, atribuindo o seu nome a uma das salas da assembleia em Bruxelas, numa cerimónia em que estiveram presentes o primeiro-ministro, António Costa, deputados portugueses com assento no PE, dos vários quadrantes políticos, o comissário europeu da Investigação, Ciência e Inovação, Carlos Moedas, e o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, entre outros.

O primeiro a discursar diante da sala repleta foi o líder da delegação do PS no PE, Carlos Zorrinho, que lembrou o “grande defensor do ideal europeu e dos seus valores” e revelou o unanimismo que os socialistas encontraram no apoio à sua proposta de homenagem a Soares.

“O seu nome, hoje gravado nesta sala, está também gravado a letras de ouro e cravos na história da Humanidade”, prosseguiu, frisando que a presença do primeiro-ministro na cerimónia supõe o reconhecimento de Mário Soares como pai fundador do PS.

Quebrando a toada de discursos institucionais, prolongada pelo presidente do Grupo dos Socialistas e Democratas (S&D), Gianni Pitella, que definiu o antigo governante como “um gigante da vida política europeia”, Isabel Soares arrancou o maior aplauso à audiência, ao recordar, emocionada, o pai.

“A homenagem de hoje, que deixa o seu nome indelevelmente ligado ao PE, é, para nós, seus filhos, emocionante e profundamente justa”, disse, partilhando um sentimento corroborado pelo irmão poucos minutos depois.

Numa longa intervenção, na qual reviveu o percurso político do pai, João Soares elogiou ainda o Governo de António Costa, que considerou demonstrar o espírito do pensamento de Mário Soares, e o ministro das Finanças, Mário Centeno, de quem se assumiu “admirador e apoiante”.

“Não foi só um companheiro, foi um amigo, um amigo da alma. Hoje quero prestar-lhe uma homenagem como amigo: o facto de esta sala ter o seu nome em vez de um número é dar espírito à construção europeia do parlamento. Esta sala tem identidade do espírito europeísta de Mário Soares”, defendeu ainda Felipe González, antigo chefe do Governo espanhol, que partilhou, “durante quase meio século”, “as mesmas trincheiras, a mesma batalha” do político português.

Continue a ler esta notícia