O SOS Racismo vai apresentar no Ministério Público uma queixa-crime contra Fátima Bonifácio, a autora de uma crónica publicada no jornal Público no passado dia 6 de julho, a propósito das quotas no ensino superior.
Fátima Bonifácio, historiadora, faz uma análise do tema das quotas para minorias étnico-racionais, análise que o SOS Racismo considera apenas "acessória": "A autora poderia ter optado por uma análise das oportunidades e limitações que revelam os exemplos internacionais com décadas de experiência na implementação destas medidas, ou por qualquer outra linha de análise factual e fundamentada. Pelo contrário, o que emerge como a verdadeira tese do artigo é a pretensa inferioridade de “ciganos” e “africanos” e a defesa de uma distância inequívoca que, segundo afirma a autora, separa civilizacionalmente “estes” daqueles que entende que, tal como ela, partilham de “crenças”, “códigos de honra” e “valores” moralmente superiores. Entre os últimos inclui as mulheres, a quem reconhece o direito à igualdade e paridade mas, deduz-se, exclui as mulheres ciganas ou negras", escreve o SOS Racismo em comunicado.
Na mesma nota, a organização refere que Fátima Bonifácio faz "afirmações graves" e "generalizações abusivas e estigmatizantes, de teor explícita e inequivocametne ofensivo", nomeadamente escrevendo que que "“ciganos” e “africanos” não pertencem a uma qualquer “entidade civilizacional” que a autora denomina de “cristandade” e não “descendem” da “Declaração Universal do Direitos do Homem”".
O SOS Racismo defende que Fátima Bonifácio tem "intenção explícita de ofender" e de "traçar uma clara barreira entre "nós", brancos e civilizados, e um "eles", africanos e ciganos, inassimiláveis".
É difícil ignorar que as expressões e argumentos se subscrevem e veiculam um discurso de ódio".
No mesmo comunicado, o SOS Racismo afirma que o artigo de Fátima Bonifácio mais não faz do que "enaltecer a supremacia branca e a defender claramente que os não brancos - "africanos" e "ciganos" - não podem fazer parte da vida pública e social".
Neste processo, a imagem que deixa é a de que “ciganos” e “africanos” são intrinsecamente selvagens, inferiores, incapazes e indomáveis, ou, nas suas palavras “inassimiláveis”, com uma predisposição quase natural para o crime e para a marginalidade. O que escreve é profundamente injurioso, difamatório e falacioso".
Considerando que "a liberdade de expressão não deve resultar numa plataforma para difusão da ignorância e da agressão por via do discurso de ódio e intolerância, escondido no dever de garantir o contraditório e a pluralização do debate", o SOS Racismo assinala que as declarações de Fátima Bonifácio se enquadram no crime de discriminação racial previsto no artigo 240º do Código Penal: "O SOS Racismo irá apresentar a competente queixa ao Ministério Público, porque considera que este comportamento não pode passar incólume. Ofender, injuriar e difamar alguém não pode ser justificado como mera opinião; a liberdade de Fátima Bonifácio se expressar e dizer o que pensa não foi limitada - do que se sabe, escreveu exatamente o que quis. Mas não se pode esperar ou pedir aos/às "africanos"/as e "ciganos"/as atingido/as pelas suas palavras, que vejam diminuídos os seus direitos fundamentais, em especial, o direito à honra, à dignidade, à imagem e à integridade moral".
A organização conclui o comunicado escrevendo que "racismo é crime, não é uma opinião. E o texto de Fátima Bonifácio é um manifesto racista".