De Vila do Conde para Almodôvar: como o Incorpora ajudou Luís a começar uma vida nova - TVI

De Vila do Conde para Almodôvar: como o Incorpora ajudou Luís a começar uma vida nova

  • 30 mar 2021, 09:51

Ex-toxicodependente, Luís Costa estava com dificuldades em encontrar um emprego. Mas com a ajuda das técnicas do Incorpora conseguiu ir morar para perto da família e encontrar um trabalho em que se sente realizado

A primeira coisa em que reparamos é no sorriso. Depois, quando Luís começa a falar, reparamos também na sua voz calma. Estas são duas características que definem Luís Costa, de 52 anos. Ele acrescenta mais uma: a resiliência. Foi com estas armas que conseguiu ultrapassar uma situação complicada de toxicodependência, mudar de cidade e encontrar um emprego.

Hoje, Luís Costa é ajudante de lar na Cercicoa, em Almodôvar, e não esconde a sua enorme felicidade. “É preciso acreditar sempre que é possível. Foi esse acreditar e essa vontade férrea de fazer diferente que levou a reerguer-me e a começar de novo. Deram-me esta oportunidade que eu agarrei com todas as forças”, conta.

A oportunidade surgiu através do Incorpora, o programa da fundação La Caixa que “tem como objetivo promover a integração sócio-laboral de públicos vulneráveis”, como explica a técnica Sandrine Casimiro, acrescentando que públicos vulneráveis podem ser “pessoas desempregadas de longa duração, pessoas com algum tipo de incapacidade ou deficiência, famílias monoparentais” ou outras pessoas que tenham “dificuldade em encontrar emprego”.

Por exemplo, no caso de Luís o seu percurso era claramente um entrave à empregabilidade. “Nestes casos, tem de haver uma sensibilização aos empregadores”, explica a técnica do Incorpora. “Nestes meios mais pequenos existe algum preconceito. E o nosso trabalho passa também por sensibilizar as empresas. Até porque o passado é passado. Falhas todos temos e devemos dar pelo menos uma oportunidade. Ao fecharmos as portas só estamos a contribuir para que as pessoas voltem para as más escolhas.”

Ainda por cima, diz, quando, como Luís, estamos perante uma pessoa que tinha qualificações e que estava disposta a começar de novo. 

Incorpora: procurar o emprego certo para cada pessoa 

Como funciona o Incorpora? As entidades sociais selecionadas como parceiras do Incorpora passam a contar com uma equipa que trabalha em duas frentes: por um lado proporcionando formações para a melhoria da empregabilidade dos beneficiários e acompanhando-os no processo de procura de emprego; por outro lado identificando ofertas de trabalho e colaborando com as empresas de forma a criar novas oportunidades de emprego. 

“Nós recebemos os beneficiários, que chegam por iniciativa própria ou encaminhados pelo IFP (Instituto de Formação Profissional) ou por outra identidade, e fazemos uma entrevista para ficar a conhecê-los e perceber as competências que eles têm”, explica a técnica de acompanhamento Ana Rita Contente. É importante saber qual a sua experiência anterior, quais as suas competências, aquilo que gosta de fazer e também aquilo que não gosta de fazer. A partir daí, a procura de emprego é orientada para as especificidades daquela pessoa.

“As pessoas acham que para arranjar um emprego é só enviar um currículo, mas isso não é suficiente. Tentamos aumentar as competências que estejam mais fragilizadas, damos apoio na construção do currículo ou damos formação de competências digitais e de comunicação”, explica. 

Os técnicos identificam as ofertas de emprego que podem adequar-se mais àquele candidato e acompanham-nos em todo o processo - desde a primeira entrevista até à inserção na empresa. 

Ao mesmo tempo, a técnica de prospeção tem de contactar as empresas, antes de mais para lhes apresentar o programa Incorpora e estabelecer parcerias. “A maior parte das empresas adere ao programa”, garante Sandrine Casimiro. “Algumas são mais reticentes uma vez que trabalhamos com públicos vulneráveis, mas nós tentamos sempre trabalhar a questão da responsabilidade social. Depois destas parcerias estabelecidas mantemos sempre o contacto com as empresas. Contactamos para dizer: tenho um candidato com estas características e estas competências, há algum sítio onde o possa encaixar? Ou o inverso também acontece: temos esta oferta, tem alguém com estas características?”

“É um acompanhamento de proximidade, tanto estamos próximos dos beneficiários como das empresas”, explica a técnica de acompanhamento. 

Finalmente, quando é possível o “match perfeito” entre um beneficiário e um emprego, a equipa continua o seu acompanhamento, garantindo que a integração decorre da melhor forma.

“O que nos distingue das demais respostas na área do emprego é, em primeiro lugar, este acompanhamento personalizado, nós acompanhamos pré, durante e pós seleção, tanto com o beneficiário como com a empresa, até para perceber se as expectativas de ambos se concretizaram. Esta é uma das bases do sucesso do incorpora”, garante Sandrine Casimiro.

A importância do trabalho em rede

Mas há outro aspeto que também é diferenciador do Incorpora: “Nós trabalhamos muito em rede, a nível nacional. Temos contactos diários com os nossos colegas, há partilhas de ofertas permanentemente, há muita articulação. E esta forma de trabalhar traz-nos maior sucesso”, acredita a técnica do Incorpora Sandrine Casimiro.

O caso do Luís é exemplo disso. Apesar de ter crescido em Beja, há alguns anos que morava em Vila do Conde e foi lá que contactou pela primeira vez com o programa Incorpora. A técnica de acompanhamento Marina Pinheiro estava há já um ano à procura de um emprego para ele quando, por causa da pandemia e de todas as alterações que a nossa vida sofreu nos últimos tempos, Luís decidiu voltar para o Alentejo, para perto da família. “Claro que o apoiei, é muito importante ter o suporte familiar. E contactei logo as equipas do Incorpora do Alentejo para perceber de que forma o poderíamos acompanhar e ajudar nesta nova etapa da sua vida”, conta Marina Pinheiro.

Quando Luís chegou a Almodôvar já estavam à espera dele. Mas Marina Pinheiro manteve o contacto, quer com a equipa de Almodôvar quer com Luís. “Já havia uma relação de confiança e era importante que isso não se perdesse. Ele sabe que pode contar connosco, independentemente da distância”, sublinha a técnica de Vila de Conde. “O apoio do Incorpora vai muito além daquilo que é o habitual neste tipo de programas de emprego, é um trabalho de retaguarda, queremos garantir que as pessoas estão bem e ter um emprego é um passo importante mas não é tudo, às vezes é preciso mais.” Sempre que existe esta possibilidade de um beneficiário arranjar um emprego numa região diferente, as técnicas fazem questão de garantir que ele fica bem instalado, de perceber se ele precisa de outro tipo de ajudas e se a sua integração está a correr bem, não só na nova empresa como na nova comunidade.

“Mais do que uma mudança de emprego, é uma mudança de vida. Daí a importância do trabalho em rede”, diz Sandrine Casimiro. “Neste caso, o acompanhamento manteve-se desde Vila do Conde para que o senhor Luís não se perdesse e para que mantivéssemos a procura ativa para aquela pessoa que tem características e competências que deveriam ser valorizadas.”

O desafio de trabalhar num lar especial

A proposta de emprego acabou por surgir ali mesmo, na Cercicoa, a instituição social que acolhe o Incorpora em Almodôvar. Como explica o presidente do conselho de administração, António Matias: “Nós trabalhamos com pessoas desfavorecidas perante o mercado de trabalho há muito tempo, o nosso objetivo é integrar pessoas em situação de exclusão. E o Incorpora vem facilitar esse trabalho, porque coloca aqui uma equipa técnica especializada para esta função, porque tem uma metodologia centrada na especificidade da cada pessoa e, além disso, tem uma dimensão nacional, que permite o contacto com equipas de todo o país e uma mobilidade nacional, tudo isso veio facilitar e complementar o trabalho que nós já fazíamos na área do emprego e da inclusão.”

Sabendo disso, é normal que António Matias recorra ao Incorpora também quando precisa contratar alguém. “Em todas as nossas contratações consultamos o Incorpora para saber se há alguém disponível com o perfil que procuramos. Quando abrimos uma vaga para um determinado lugar, pensamos num perfil ideal em termos de características do trabalhador, da sua disponibilidade, da suas capacidades físicas porque nalguns trabalhos é necessário, e a metodologia Incorpora permite ter esse perfil identificado”, o que facilita o processo.

No caso do Luís, a Cercicoa procurava, para o seu lar residencial, de “uma pessoa para preencher horários mais difíceis, os fins de semana e alguns turnos noturnos. E é difícil encontrar pessoas com disponibilidade para esses horários e ao mesmo tempo com alguma formação na área da relação com pessoas”, conta António Matias.

Quando o entrevistou, o diretor da instituição percebeu que Luís Costa tinha não só as qualificações necessárias para o trabalho como tinha também as qualidades humanas necessárias: “O Luís teve muita facilidade em integrar-se, ele tem muita facilidade na relação humana e isso permite-lhe rapidamente ganhar a confiança das pessoas”, garante António Matias. O lar da Cercicoa acolhe adultos de idades muito diversificadas que têm em comum terem algum tipo de deficiência intelectual, como por exemplo paralisia cerebral, autismo ou alguma doença mental. São, por isso, um público muito especial. E especiais devem ser também os funcionários que ali trabalham. “As pessoas têm que ter confiança em quem trata delas para se deixarem tratar”, sublinha António Matias. O Luís conseguiu facilmente ter a confiança não só dos residentes, como de toda a equipa técnica e administrativa do lar. 

No seu currículo, Luís tinha um curso técnico-profissional de animador social e, entre outras, experiência de trabalho numa IPSS com crianças e jovens institucionalizados, como animador socio-cultural e também como monitor na clínica de reabilitação onde tinha feito o seu tratamento. Todas essas experiências foram importantes para este novo emprego, na Cercicoa, onde tem funções como vigilante e como ajudante e, ao fim de semana, também como animador. “Fazemos trabalhos de colagem e pintura, cantamos, fazemos relaxamento, contamos histórias… no fundo tento que eles dêem algo, porque eles têm imensas capacidades, eu sou só um veículo que permite que eles mostrem o seu melhor”, explica Luís.

“Sou uma pessoa muito comunicativa e já tinha alguma experiência no trato com pessoas. Sou muito compreensivo e tenho uma relação ótima com todos eles, facilmente houve uma relação de empatia e confiança com todos os residentes, o que é muito importante. Eles adoram-me e eu adoro-os. Dou muito mas recebo muito mais. Quando saio daqui vou de coração cheio, vou muito feliz.”

Luís ainda está a trabalhar há pouco tempo mas todos à sua volta já repararam como eles está satisfeito com esta nova etapa da sua vida. “Estou muito contente, estou muito feliz e muito grato. Tem sido muito importante, sinto-me realizado a cada dia a fazer algo de que gosto e que me dá imenso prazer”, diz ele. E a técnica Marina Pinheiro concorda: “Um emprego é um trampolim, um ponto de partida para começar uma vida. A partir daqui tudo pode acontecer”.

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