«O Portimonense foi roubar o título à Luz e ofereceu-o ao FC Porto» - TVI

«O Portimonense foi roubar o título à Luz e ofereceu-o ao FC Porto»

Portimonense 1978

Os algarvios nunca ganharam na casa do Benfica, mas em 1978 empataram e ajudaram os dragões a acabar com uma seca de 19 anos. «O génio do Chalana impediu o escândalo», lembra Nélson Moutinho, pai de João e avançado dessa equipa

A História de Um Jogo é uma rubrica do Maisfutebol. Escolhemos um dos encontros da Liga portuguesa e partimos em busca de histórias e heróis de campeonatos passados. Às quinta-feiras, de 15 em 15 dias.

As camisolas pretas e brancas, listadas na vertical, «fazem comichão». É uma malha pesada, desconfortável e justa. «O nosso suor queimava ao sol.»

O Portimonense avança para o relvado da Luz pela quarta vez na história. O registo anterior assusta e indicia o pior para essa 22ª jornada do campeonato nacional de 1977/78: 5-1, 6-0 e novamente 5-1, sempre favoráveis ao Benfica.

As águias entram em campo no primeiro lugar, de braço dado com o FC Porto. 36 pontos para cada rival e a certeza de que uma escorregadela é «a morte do artista». O Portimonense, na segunda participação no escalão maior, é 15º e penúltimo classificado.

Estádio cheio, anuncia-se a forca do visitante algarvio. É um fuzilamento garantido, pensam as dezenas de milhares de benfiquistas. Tiro ao lado.

«Fizemos uma grande exibição e podíamos ter ganho», recorda ao Maisfutebol um dos dois avançados do Portimonense 77/78, Nélson Moutinho. O outro é brasileiro e chama-se Sapinho. «Perto do intervalo fiz o passe e ele colocou-nos a ganhar. Sentimos o Benfica a tremer, até porque a jogada foi muito bem executada.»

«Fomos apertados na segunda parte e o Chalana evitou o escândalo»

Nélson Moutinho não é uma cara estranha a essa Luz. O pai de João Moutinho faz todo o percurso nas camadas jovens do Benfica e é, por esses dias, «um benfiquista ferrenho».

«Fiquei feliz pelo empate, claro. Na segunda parte fomos mais apertados e o génio do Chalana evitou o escândalo», conta o antigo atacante, agora com 62 anos.

Para mim, o Portimonense foi roubar o título à Luz e ofereceu-o ao FC Porto. Já estávamos perto do fim do campeonato e o Porto foi campeão, com os mesmos pontos do Benfica. Esse jogo fez toda a diferença.»

Assim é. O empate acaba por ser mau para ambos os lados. O Benfica não é campeão, o Portimonense desce de divisão – com Sp. Espinho, Riopele e Feirense – apesar de também empatar no Algarve com o FC Porto (0-0).

«Descemos muito mal, tínhamos uma equipa forte. A primeira volta foi muito má e trocámos de treinador. Saiu o mister José Augusto e entrou o senhor Mário Lino. Como dizemos entre amigo, na altura não havia VAR e fomos muito castigados.»

Portimonense 77/78: Nélson Moutinho está em baixo, ao centro

Nélson Moutinho diz ser «impossível» comparar o jogo de há 43 anos com o do próximo domingo. «As condições são radicalmente opostas. A começar pelas chuteiras, passando pelas bolas, até pelo relvado e os hábitos de treino e sociais.»

O Portimonense chega a 2021 sem saber o que é ganhar em casa do Benfica. ‘Rouba-lhe’ esse título em 1978, sim, mas o registo das visitas à Luz é penoso. Anotem bem: 25 jogos, 21 vitórias para o Benfica e quatro empates apenas.

Além desse - absolutamente marcante -, em 1978, empatam 1-1 em maio de 1987 (golos de Diamantino e Luciano), 1-1 em março de 2011 (Nuno Gomes e Ricardo Pessoa) e 2-2 em dezembro de 2017 (Jonas e Lisandro López; Pires e Jadson).

Será a equipa de Paulo Sérgio capaz de fazer o que nunca o Portimonense fez? «Não me acredito», responde Nélson Moutinho, «mas o Portimonense em 2021 tem condições de trabalho fantásticas e tudo é possível».

«Fui para o Portimonense ganhar o dobro que ganhava no Benfica»

Nélson Moutinho está radicado no Algarve e é responsável pela Associação Escola de Futebol João Moutinho. A equipa compete no campeonato de sub-23 da AF Algarve e tem no grupo, por exemplo, Alexandre Moutinho – recém-saído do Boavista e o mais novo dos quatro filhos.

Eu tenho 1,62 metros e fui sempre ponta-de-lança. Fazia golos de cabeça, não parava. O mundo do futebol no final dos anos 70 era tão diferente… Saí do Benfica nos juniores, mas ainda assinei um contrato de três anos de profissional. Tive a consciência de que ia ter poucas possibilidades de jogar porque os avançados eram o Vítor Batista, o Nené e o Jordão. Por isso aceitei sair para o Portimonense.»

É, precisamente, um histórico do Benfica quem convence Nélson a mudar-se de Lisboa para o Algarve. «O senhor José Augusto era o treinador. Fui ganhar o dobro que ganhava no Benfica. E gostei, gostei muito de representar o Portimonense.»

Beira-Mar, Leiria, Olhanense, Barreirense, Benfica Castelo Branco e Silves (até 1992) são os clubes representados pelo atacante «baixinho e goleador». Histórias, claro, não faltam.

«O nosso autocarro parecia um autocarro da Carris. Demorávamos nove horas a chegar ao Porto. Para ir à Madeira tínhamos de apanhar o avião na quarta-feira e jogávamos no domingo, porque era o único voo semanal», recorda Nélson Moutinho.

No domingo, às 18 horas, o Portimonense joga pela 26ª vez em casa do Benfica. O maior feito continua ainda a ser esse, de 1978, numa época em que as camisolas ainda fazem comichão. «Agora eles nem sentem o tecido. É outro mundo.»

FICHA DE JOGO:

Estádio da Luz, 8 de abril de 1978, jornada 22

BENFICA: Bento; Pietra, António Bastos Lopes, Humberto Coelho, Eurico Gomes (Celso Pita, 75), Alberto, Toni, Shéu, Chalana, Rui Lopes (José Luís, 55) e Nené.

Treinador: John Mortimore

PORTIMONENSE: Jorge; César, Luís Soares, Paulo César, Sota, João Cardoso, Fernando (Diamantino Costa, 69), Arnaldo Silva (Manuel Fernandes, 55), Tião, Sapinho e Nélson Moutinho.

Treinador: Mário Lino

Golos: Sapinho (37) e Chalana (60)

Continue a ler esta notícia

EM DESTAQUE