«Sem o cinto de segurança teria morrido»: um herói da taça em lágrimas - TVI

«Sem o cinto de segurança teria morrido»: um herói da taça em lágrimas

Nick Tsaroulla (Associated Press)

Nick Tsaroulla teve um grave acidente de viação há três anos, quando era uma das promessas maiores da academia do Tottenham. Parou um ano de jogar, caiu até à 4ª divisão e reapareceu com um golo histórico ao Leeds de Marcelo Bielsa. «Passei por dias muito negros.»

O verão de 2017 prometia ser um verão de desejos cumpridos. Nick Tsaroulla tinha 18 anos e a ambição de fazer a pré-temporada com o plantel principal do Tottenham. Estava há seis épocas no clube, era visto como um dos maiores talentos da academia e o treinador Mauricio Pochettino elogiara-o em público semanas antes.

No dia 18 de julho desse ano, porém, tudo mudou. Nick saiu de casa, perto de Essex, e encaminhava-se para o centro de treinos dos Spurs quando sofreu um gravíssimo acidente de viação. O carro do futebolista foi violentamente abalroado numa rotunda e as lesões atiraram-no para uma cama de hospital durante um ano.

Tsaroulla desapareceu completamente dos radares dos melhores clubes ingleses. Muitos julgavam, de resto, que tinha sido obrigado a deixar o futebol. Três anos e meio depois, o apelido de origem cipriota voltou aos televisores britânicos: Crawley Town, 3 – Leeds United, 0, golos de Tsaroulla, Nadesan e Tunnicliffe.

Nick Tsaroulla contra o português Hélder Costa no Crawley-Leeds (Foto: AP)

Tsaroulla? Nick Tsaroulla, o miúdo do Tottenham que quase morrera num acidente de carro? Ele mesmo. Vivo, saudável e a fazer o que mais gosta num clube do quarto escalão. Nick marcou o mais bonito golo da tarde e tornou-se herói na FA Cup. Acabou o jogo em lágrimas e a recordar «os dias muito negros» na cama do hospital que o recebeu.

«O acidente foi muito feio. Os médicos disseram-me que sem o cinto de segurança teria morrido. O meu estômago foi perfurado e precisei de muito tempo para recuperar. Tive dores horríveis», contou Nick Tsaroulla, no dia da sua ressurreição para o futebol profissional.

«Os médicos tentaram tudo e nada parecia resultar no início. Dores abdominais, consequências neurológicas, uma confusão permanente. Fiquei um ano assim, com avanços e recuos, entre o hospital e a reabilitação.»

Em 2018, um ano após o fatídico embate, o contrato de Nick com o Tottenham acabou e o clube decidiu não oferecer a renovação. O lateral esquerdo lutava apenas por poder voltar a correr e contrariar as previsões mais pessimistas.

«Tive outra vez azar. Comecei a treinar com cautelas, bastante limitado, e o meu corpo reagiu mal. Contraí uma grave infeção de pele, fiquei com bolhas horríveis nos pés e as pernas vermelhas. Voltei de urgência ao hospital e fui salvo por um cocktail de antibióticos. Se tivesse esperado mais tempo, provavelmente tinham-me amputado as pernas.»

Nick com 13 anos num treino do Tottenham (Foto Facebook)

Não há mal que sempre dure e esse foi o derradeiro revés para Nick Tsaroulla. Sem contrato e em miseráveis condições físicas, o atleta percebeu que tinha de apagar tudo o que fizera antes no futebol. E começar do zero. Estava quase há dois anos sem competir e decidiu começar a bater à porta de pequenos clubes.

«Não quero falar mal do Tottenham. Eles fizeram tudo o que podiam por mim, encaminharam-me para vários médicos. O problema era grave e eu precisava de tempo, mas num clube grande esse é um bem escasso. Lutei para voltar ao futebol e provar que eles se enganaram ao não continuar comigo. Só isso.»

E Nick voltou. Depois de algumas tentativas frustradas, o Brentford decidiu dar-lhe uma oportunidade. Mas só na equipa de reservas. O lateral esquerdo fez 31 jogos ao longo da temporada 2019/20, mas sempre longe da equipa que competia no Championship.

«Não joguei com o plantel principal, mas provei a mim mesmo que estava em forma. Provei que podia voltar a jogar sem limitações. Voltei a apaixonar-me pelo futebol e a sentir borboletas na barriga antes de cada jogo.»

A pandemia encurtou a temporada e isso deu alguns meses a Nick Tsaroulla para ficar melhor. Mais forte ainda. Frequentou ginásios especializados, leu um livro de Tim Grover, uma espécie de guru dos futebolistas ingleses, e no verão procurou um novo destino.

A porta do futebol abriu-se em Crawley, a cidade originária dos The Cure. Nick assinou contrato em outubro de 2020 e fez seis jogos pelo emblema da League Two até marcar um golo e ajudar a eliminar o Leeds United de Marcelo Bielsa na FA Cup.

«Sinto-me abençoado e só posso agradecer ao treinador John Yems a confiança. Há dois anos mal conseguia correr e agora marquei um golo a uma equipa da Premier League. E só tenho 21 anos, os meus sonhos estão intactos.»

Com uma história destas, todas as lágrimas lhe são permitidas. Principalmente aquelas que fez questão em não esconder no final do jogo contra o Leeds.

«Estou na lua. Marquei o meu primeiro golo como profissional. Para mim a estrada tem sido dura e longa. Tem sido duro, sim. Este golo significa muito.»

E que golo, Nick. Que golo!

VÍDEO: o momento genial de Tsaroulla contra o Leeds

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