O campeão olímpico que tenta travar a Covid-19 fardado de polícia - TVI

O campeão olímpico que tenta travar a Covid-19 fardado de polícia

Saul Craviotto

Saul Craviotto, canoísta espanhol com quatro medalhas olímpicas, voltou às ruas no combate à pandemia

São quatro as medalhas olímpicas que Saul Craviotto tem guardadas em casa. Duas delas de ouro. Contudo, por estes dias, as medalhas valem-lhe de pouco.

Afinal, é um crachá da Polícia Nacional que o canoísta espanhol traz ao peito e é com ele que tenta travar a pandemia da Covid-19, controlando quem circula nas ruas de Gijón, em Espanha.

E naquela tarefa, Craviotto deixa de ser o atleta que tinha sido escolhido como porta-estandarte espanhol para a adiada cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim.

Ali, ele passa a ser apenas mais um elemento da autoridade. Mais um soldado a tentar travar a progressão da pandemia num país no qual se registavam 17.489 mortes, num total de quase 170 mil infetados, segundo números desta segunda-feira.

«É o meu trabalho, não sou nenhum herói»

Nascido na Catalunha, em Lleida, a carreira de Craviotto chegou ao topo do Olimpo em 2008, em Pequim, quando se tornou campeão olímpico de canoagem, em K2 500, juntamente com Carlos Pérez Rial.

Desde então, o canoísta de 35 anos nunca mais desceu do pódio. Na edição seguinte, em Londres, Craviotto foi vice-campeão olímpico em K1 200m, para duplicar as medalhas na edição de 2016, no Rio de Janeiro, somando uma de bronze também em K1 200m, a um novo título olímpico, desta feita em K2 200, na companhia de Cristian Toro.

Se somarmos às medalhas olímpicas aquelas que conquistou em Mundiais, é fácil compreender que o Comité Olímpico espanhol tenha decidido conceder-lhe a honra de transportar a bandeira do país naquelas que devem ser as suas últimas olimpíadas.

O palmarés que ostenta, porém, não o fez hesitar um segundo quando se percebeu que a pandemia estava a colocar em causa a saúde pública espanhola. E que todos seriam poucos para ajudar.

Perante a escalada do número de casos de infetados e de mortos, Craviotto informou o superior de que estava disponível para voltar ao serviço, apesar de estar liberado disso devido aos Jogos.

«Quando decretaram o confinamento, enviei uma mensagem ao comissário principal a comunicar a minha disponibilidade para voltar às ruas como mais um», disse ao jornal AS, depois de ter sido ‘descoberto’ pela TVE, televisão pública espanhola, numa ação de controlo de trânsito.

«Perante a necessidade provocada pela situação que vivemos, voltei ao meu trabalho. Não sou nenhum herói por isso», desvalorizou, em declarações ao El País, concluindo: «O desporto neste momento está em quarto plano. Temos de nos concentrar na saúde.»

O dia em que foi reconhecido… pelo traficante que prendia

Canoísta desde os oito anos, por influência do pai, Saul Craviotto nunca descurou a formação profissional. Nesse sentido, optou por integrar uma unidade desportiva que existe na polícia espanhola, que dá maior facilidade em conciliar com a vertente desportiva.

A mudança para as Astúrias, e para Gijón, mais concretamente, aconteceu precisamente para que Craviotto pudesse treinar com Miguel García, um técnico asturiano.

Foi também com esse intuito que Carlos Pérez Rial, com quem venceu o primeiro título olímpico, se mudou de Sevilha para o norte de Espanha. Ele que também é polícia e com quem Craviotto partilhou uma história surreal em serviço.

Numa altura em que pertenciam ambos à Unidade de Prevenção e Reação da Polícia Nacional espanhola, e pouco depois do ouro conquistado em Pequim, os canoístas foram reconhecidos… por um traficante que estavam a deter.

Tudo aconteceu numa operação contra tráfico realizada num bar de Gijón, quando tentavam algemar um suspeito. «De repente, ao virar-se de frente para mim, perguntou-me ‘Tu não és um dos que ganhou uma medalha em Pequim?’», relatou Perucho, numa outra reportagem do AS. «Foi uma situação hilariante, deu-nos uma vontade de rir enorme», assumiram os dois canoístas.

Fama televisiva obrigou-o a deixar as ruas

Tendo em conta as medidas de proteção que a pandemia exige neste momento a todos aqueles que têm de trabalhar, seja nas ruas ou nos hospitais, torna-se mais difícil que o atleta olímpico seja reconhecido na rua quando está no cumprimento da sua profissão.

Mas a verdade é que a cara de Saul Craviotto se tornou bastante conhecida, mesmo que protegida por uma máscara.

Porque se o reconhecimento desportivo já era bastante, tendo em conta os resultados desportivos de excelência que tem acumulado nos últimos anos, a situação ‘descontrolou-se’ em 2017, depois de o canoísta ter vencido um programa televisivo: o Masterchef famosos.

O atleta tornou-se de tal forma mediático, que teve de optar por mudar de área na polícia, deixando as ruas para integrar a equipa de ‘Participação de cidadania’, sendo presença assídua em ações de sensibilização em escolas e outros espaços públicos.

«É uma forma de preservar a minha segurança e a da minha família. Ser reconhecido durante uma detenção pode fazer-me rir no momento, mas é demasiado sério», justificou ao AS.

Agora, porém, o dever falou mais alto. E enquanto a sua ajuda puder ser útil as ruas, é por lá que vai continuar.

 

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