O presidente do Zimbabué, Robert Mugabe, foi detido pelo exército esta quarta-feira. Os militares tomaram o controlo dos centros do poder, depois de uma escalada de tensões no país, que teve início na demissão do vice-presidente, Emmerson Mnangagwa.
O exército assumiu o controlo da televisão estatal para fazer um anúncio ao país, eram cerca das 4:00 (hora local). O porta-voz dos militares disse que o que está a decorrer "não é um golpe de Estado", mas um processo de transição do poder "sem sangue". E acrescentou que, depois da detenção de Mugabe e dos seus familiares, esta operação visa agora as pessoas próximas do presidente, que causaram "sofrimento social e económico" ao país.
Ao nosso povo e ao mundo para lá das nossas fronteiras, queremos dizer que isto não é um golpe militar. O que as Forças Armadas do exército estão a fazer é dar paz à situação política, social e económica que está degradada no nosso país, algo que, se não acontecesse, poderia resultar num conflito violento", disse o general S.B. Moyo, nesta comunicação ao país.
O mesmo general disse que o presidente estava sob custódia em escritórios governamentais, mas, entretanto, o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, disse, em comunicado, que já falou com Mugabe e que ele está "bem", ainda que "confinado à sua casa".
Há ainda relatos de que a mulher, Grace Mugabe, já saiu do país e que terá fugido para a Namíbia, mas não é certo qual o seu paradeiro.
O partido no poder, o Zanu-PF, escreveu, no Twitter, que Mugabe e a família foram detidos e estão em segurança. Na mesma mensagem, diz que "nem o Zimbabué, nem o Zanu são propriedade de Mugabe e da mulher" e que Mnangagwa vai ajudar a alcançar "um Zimbabué melhor", dando a entender que o 'vice' demitido deverá voltar ao país, depois de ter saído em exílio.
Hoje começa uma nova era e o camarada Mnangagwa vai-nos ajudar a alcançar um Zimbabué melhor", lê-se na publicação.
Last night the first family was detained and are safe, both for the constitution and the sanity of the nation this was necessary. Neither Zimbabwe nor ZANU are owned by Mugabe and his wife. Today begins a fresh new era and comrade Mnangagwa will help us achieve a better Zimbabwe.
— ZANU PF (@zanu_pf) 15 de novembro de 2017
Apesar da cuidada escolha de palavras, que dão a entender que o que está a decorrer não é um golpe militar, observadores internacionais dizem que o que está a acontecer "não tem outro nome senão golpe".
Isto não tem outro nome senão golpe. Podem tentar dar a entender que o presidente Mugabe ainda é o líder, mas eles é que são a força militar", explicou Alex Magaisa, um antigo assessor do ex-primeiro-ministro Morgan Tsvangirai, à CNN.
A tomada do poder por parte dos militares aconteceu às primeiras horas desta quarta-feira, depois de uma noite de grande agitação na capital, Harare, com soldados armados, veículos militares nas ruas e o registo de pelo menos três explosões. Os militares bloquearam os acessos aos principais edifícios do governo, do parlamento e dos tribunais.
Antes, durante a tarde, várias testemunhas disseram que havia tanques de guerra a avançar sobre a capital, sugerindo uma intensificação das tensões no país.
ONU apela à moderação
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou hoje “à moderação” no Zimbabué. António Guterres pediu “calma, ausência de violência e moderação”, indicou um porta-voz da ONU, Farhan Haq.
Para o responsável da ONU devem preservar-se “os direitos fundamentais, entre os quais a liberdade de expressão e de reunião que é de uma importância vital".
As diferenças políticas devem ser resolvidas de forma pacífica e através do diálogo, de acordo com a Constituição do país".
Portugueses vivem na "maior normalidade"
O ministro dos Negócios Estrangeiros português também apelo à calma e ao respeito pelas instituições no Zimbabué e disse existir uma situação da “maior normalidade na sua vida profissional e social” para os mais de mil cidadãos nacionais registados naquele país.
Hoje de manhã, mencionou, havia “algumas ruas interditas ao trânsito, mas não a peões, mas as escolas estão a funcionar, o comércio está aberto e as questões administrativas salvaguardadas”.
“Faço minhas as palavras da União Europeia. Pedimos que não haja nenhuma forma de violência, que as instituições sejam respeitadas, e apelamos à calma de parte de todos aqueles que estão envolvidos num debate político muito aceso interno ao regime do Zimbabué”, disse ainda Augusto Santos Silva, questionado pelos jornalistas no parlamento.
A escalada de tensões no Zimbabué teve início na demissão do vice-presidente, Mnangagwa. O antigo número dois, que tem fortes ligações ao Exército depois de ter sido ministro da Defesa, era visto como o preferido na sucessão a Mugabe, de 93 anos. Foi demitido e expulso do partido por uma alegada "falta de lealdade e honra na execução dos seus deveres".
Na segunda-feira, o comandante das Forças Armadas, Constantino Chiwenga, deixou um aviso, como nunca tinha acontecido: disse que os militares estavam preparados para acabar com o que consideraram ser uma "purga" contra apoiantes de Mnangagwa. Numa conferência de imprensa em que Chiwenga esteve acompanhado de 90 oficiais do Exército, o chefe das Forças Armadas disse que os militares não iam tolerar o afastamento das pessoas que estiveram envolvidas na luta pela independência.