Prisão preventiva de empresário Carlos São Vicente prolongada por dois meses - TVI

Prisão preventiva de empresário Carlos São Vicente prolongada por dois meses

  • .
  • HCL
  • 22 jan 2021, 14:36
Angola

Estão em causa crimes de lavagem de dinheiro cometidos pelo empresário luso-angolano num montante superior a 750 milhões de euros

A prisão preventiva do empresário luso-angolano Carlos São Vicente, detido desde setembro, em Luanda, por suspeitas de corrupção, foi prolongada por mais dois meses, de acordo com despacho da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola a que a Lusa teve acesso esta sexta-feira.

De acordo com o despacho da PGR angolana, de dia 20 de janeiro de 2021, o prazo é "excecionalmente" prorrogado pela "necessidade de se realizarem as diligências em falta", pela complexidade do processo, nomeadamente pelos contornos transnacionais.

Carlos São Vicente está também a ser investigado na Suíça por suspeita de branqueamento de capitais.

Para o efeito prorrogo excecionalmente o prazo de prisão preventiva do arguido Carlos Manuel São Vicente (...), por mais dois meses, em função da necessidade de se realizarem as diligências em falta, porque o processo reveste-se de particular complexidade e do particular circunstancialismo em que foi cometido, mormente as conexões transnacionais, que na eventualidade de o arguido ser posto em liberdade, o risco de se colocar em fuga mostrar-se-ia em nível alto, o que caso acontecesse poderia comprometer a conclusão da instrução e a realização da sã justiça", lê-se no documento.

A prisão preventiva de Carlos São Vicente, segundo um parecer do constitucionalista e professor de direito Jorge Miranda, pedido pela família do empresário, a que a Lusa teve acesso, "ofende elementares princípios do Estado democrático de Direito".

O parecer do constitucionalista, datado de 11 de janeiro, refere ainda que os procedimentos da PGR angolana violam a Constituição angolana.

Não se divisam no processo indícios dos crimes imputados que pudessem justificar a prisão preventiva” e com o património de Carlos São Vicente já nas mãos do Estado e dada a sua saúde precária “não se divisa nenhum perigo de fuga no despacho do Ministério Público, nem de perturbação do processo”, sublinha-se no mesmo parecer.

Numa entrevista à Lusa, este mês, a mulher do empresário e filha do primeiro Presidente da República de Angola, Irene Neto, que se encontra em Portugal, disse que tinha pedido pareceres a alguns "reputados constitucionalistas portugueses e que o de Jorge Miranda considerava inconstitucional a medida".

O despacho que determinou a prisão preventiva do empresário angolano Carlos São Vicente refere que este levou a cabo “um esquema ilegal” que lesou a petrolífera estatal Sonangol em mais de 900 milhões de dólares (cerca de 763,6 milhões de euros).

De acordo com o despacho a que a Lusa teve acesso na altura, o empresário angolano, que entre 2000 e 2016 desempenhou, em simultâneo, as funções de diretor de gestão de riscos da Sonangol e de presidente do conselho de administração da companhia AAA Seguros, sociedade em que a petrolífera angolana era inicialmente única acionista, terá levado a cabo naquele período "um esquema de apropriação ilegal de participações sociais” da seguradora e de “rendimento e lucros produzidos pelo sistema” de seguros e resseguros no setor petrolífero em Angola, graças ao monopólio da companhia.

Desta forma, Carlos São Vicente passou a ser o “detentor maioritário das participações nas AAA Seguros, com 89,89%, em detrimento da Sonangol, que viu as suas participações sociais drasticamente reduzidas em 10% [a 10%], num prejuízo estimado em mais de USD 900.000.000,00 [cerca de 763,6 milhões de euros ao câmbio atual]", não tendo a petrolífera “recebido qualquer benefício”, em contrapartida, adianta-se no documento.

Cedências de participação, que de acordo com o despacho, o arguido terá referido que foram feitas "com base num acordo informal" entre ele, enquanto representante da AAA Seguros, e o então presidente do conselho de administração da Sonangol, e mais tarde vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente.

Ainda de acordo com o despacho transcrito, “grande parte do Ativos das AAA Seguros, SA, que já cessou a atividade, pertencem a outras empresas do mesmo grupo detidas/controladas pelo arguido Carlos Manuel de São Vicente”, através de “um processo fraudulento em prejuízo do Estado angolano”.

Perante o exposto, o documento conclui “não restarem dúvidas, dos suficientes indícios de estar o arguido Carlos Manuel de São Vicente, incurso na prática dos crimes de peculato (…), recebimento indevido de vantagens (…), corrupção (…), participação económica em negócio (…) tráfico de influências”.

O AAA, liderado por Carlos São Vicente, é um dos maiores grupos empresariais angolanos, operando na área de seguros e da hotelaria.

 

PGR angolana enviou cartas rogatórias para ouvir filho de Carlos São Vicente em Portugal

O procurador-geral da República de Angola, Helder Pitta Grós, afirmou que foram elaboradas cartas rogatórias para ouvir o filho do empresário Carlos São Vicente em Portugal, cuja tramitação está em curso.

Ivo São Vicente foi recentemente constituído arguido no mesmo processo do pai, preso em Angola, podendo ser ouvido em Portugal, onde se encontra atualmente, ao abrigo de mecanismos de cooperação judiciária entre ambos os países.

A possibilidade já tinha sido avançada à Lusa anteriormente, com Ivo São Vicente a mostrar-se disponível para ser ouvido no processo, o que lhe permitirá conhecer "de uma vez por todas os factos que alegadamente [lhe] são imputados e terão levado à decisão do congelamento das [suas] contas bancárias, pessoal e empresarial", há quatro meses.

Continue a ler esta notícia

EM DESTAQUE