Covid-19: filhas ficaram 30 horas ao telefone com o pai, até ele morrer - TVI

Covid-19: filhas ficaram 30 horas ao telefone com o pai, até ele morrer

Nos Estados Unidos, uma enfermeira colocou um telefone ao lado de um homem infetado com o novo coronavírus, internado em estado crítico, para que as filhas pudessem, em casa, acompanhar o pai até ao último suspiro

À semelhança do que acontece em Portugal, nenhum norte-americano que esteja internado com Covid-19 pode receber visitas. Por isso mesmo, Abby Adair Reinhard não pôde estar no hospital com o pai, Don Adair, a morrer vítima do novo coronavírus.

Foi então que uma enfermeira se ofereceu para colocar um telefone junto ao ouvido do homem em estado crítico, para que a filha Abby, e as três irmãs, conseguissem falar com o pai, até ele morrer.

A mulher deu um testemunho impressionante ao jornalista Anderson Cooper, na CNN, relatando uma chamada que durou praticamente 36 horas.

Foi uma grande bênção. Aquilo permitiu-me ter alguma proximidade. Pude dizer o que precisava de dizer, sabendo que aquilo era o fim, e mesmo que eu não o pudesse ver e dar-lhe a mão, ter aquela ligação através do telefone foi de um valor extraordinário".

As irmãs de Abby, que se juntaram à chamada telefónica a partir da Dinamarca e do Texas, partilharam memórias, cantaram para o pai e disseram-lhe quanto o amavam.

Na verdade, não pudemos falar, mas pudemos ouvi-lo a respirar. E tivemo-lo junto de nós. Eu agradeci ao meu pai, por estar ali para mim. Eu pedi-lhe desculpa por aquilo que tinha de pedir, eu perdoei-o por aquilo que tinha de perdoar, e começámos a partilhar memórias", relatou Abby, emocionada, ao canal norte-americano.

Na verdade, o episódio não durou mais de um dia e meio, mas tendo em conta a intensidade do momento, o relato da norte-americana parece a história de quase uma vida inteira: "Nós conseguíamos ouvi-lo a sofrer, mas ouvir a respiração dele era como se fosse a nossa conexão com ele, e a forma de saber que continuava vivo".

A par da entrevista que deu à CNN, Abby Reinhard fez uma longa publicação no Facebook, dirigida diretamente ao pai, onde conta os últimos minutos da chamada telefónica. 

Os quatro concordámos que precisávamos de dormir, e tu queres que tomemos conta de nós. Pode levar horas ou dias, e não há como saber. (...) Eu fiquei em silêncio em linha, enquanto preparava as crianças, e me arranjava a mim, para dormir. Adormeci por volta das 11. Nenhum de nós desligou a chamada, caso quiséssemos falar a qualquer momento, mas combinámos afastar-nos dos telefones e descansar um pouco. Então, depois da meia noite, veio a chamada telefónica. Eu sabia o que ia ouvir, e preparei-me. Foste, foste embora!"

My dad just died from COVID-19. Here below is my chronicle of the last two days. Stay safe. Sending love.

April 5th,...

Publicado por Abby Adair Reinhard em  Terça-feira, 7 de abril de 2020 

Quando olhei para o meu telefone, ainda ligado à linha do hospital, queria tanto falar contigo novamente, mesmo sabendo que já não estavas lá. Imaginei o teu corpo deitado na cama, e o teu espírito a subir. Disse ao telefone 'eu amo-te, pai', fiz uma pausa e carreguei no botão vermelho para terminar a chamada".

Don Adair era advogado especialista em direito comercial, e ajudava pessoas a começarem o seu negócio de sonho. 

Esta é uma história, dura, com nomes, com rostos, com datas e locais, porém episódios de perda e de dor multiplicam-se nos Estados Unidos, o país do mundo com maior número de infetados por Covid-19, mais de 825 mil casos confirmados, dos quais já resultaram mais de 45 mil mortes.

Continue a ler esta notícia