Imprimir armas 3D em casa é nova ameaça nos EUA - TVI

Imprimir armas 3D em casa é nova ameaça nos EUA

Administração Trump permitiu que possa ser partilhado um manual que ensina a montar armas de fogo sem número de série, mas um juiz federal bloqueou temporariamente os códigos por considerar que põe em causa a segurança dos cidadãos

A organização Defense Distributed, com sede no Estado norte-americano do Texas, viu gorados os planos de voltar a publicar no seu site, esta quarta-feira, manuais de instruções para pistolas e espingardas de plástico impressas em três dimensões e com capacidade para disparar e matar como qualquer outra arma de fogo. A intenção tinha sido anunciada pela organização depois de ter chegado a um acordo com o Governo federal em Junho, mas no último instante um juiz federal bloqueou temporariamente os códigos que permitem a impressão.

A ordem judicial foi publicada na terça-feira, depois de um grupo de oito procuradores-gerais de oito Estados norte-americanos ter preenchido um pedido para bloquear a medida autorizada pela Administração Trump, que consideram ser uma "séria ameaça à segurança nacional", refere o jornal espanhol El País. O travão judicial tem efeito nacional e traduz-se na suspensão temporária da autorização para a produção de armas letais caseiras através da impressão 3D em todo o país.

Robert S. Lasnik, o juiz responsável pelo bloqueio, explicou que existem "constrangimentos relacionados com a Primeira Emenda" que deverão ser revistos mais tarde em tribunal, mas que, para já, "as instruções de como produzir armas 3D na internet deviam ser suspensas". O caso voltará a ser discutido no tribunal de Seattle a 10 de Agosto.

"As armas imprimidas em 3D são armas funcionais que regra geral não são reconhecidas por detetores de metais, por serem feitas por outros materiais, como o plástico, além de que não é possível rastreá-las, uma vez que não contêm o número da série", lia-se no documento entregue ao juiz e citado pela Associated Press. "Qualquer pessoa com acesso a ficheiros CAD e a uma impressora 3D pode produzir, ter ou vender estas armas."

 

Batalha legal

A permissão para imprimir armas em 3D foi a conclusão de uma batalha legal de cinco anos, na qual o Governo do presidente Barack Obama (2009-2017) argumentou perante dois juízes federais que os manuais para fazer essas impressões em três dimensões violavam as leis de exportação de armas de fogo, tendo o Supremo Tribunal recusado ouvir o caso.

Cody Wilson, o fundador do grupo no centro da polémica, disponibilizou em 2012 na Internet os planos e o software necessários para produzir a Liberator, a primeira arma impressa em 3D. O documento foi descarregado mais de 100 mil vezes até que o Governo norte-americano bloqueou o site por infringir as regras sobre exportações internacionais.

Numa decisão abrupta, a Administração de Donald Trump chegou em junho deste ano a acordo com a Defense Distributed para permitir a esse grupo texano voltar a distribuir as instruções de impressão de armas 3D via Internet a partir desta quarta-feira, 1 de Agosto.

O acordo estipulou também que os manuais de impressão estão aprovados "para sua publicação de qualquer forma" e que o Governo norte-americano pagará 40 mil dólares (34,203 euros) para cobrir os honorários legais de Cody Wilson.


A era da arma descarregável começa", pode ler-se no site da empresa.

Embora até agora fosse ilegal fabricar armas de fogo em casa, não era ilegal montá-las, e a Defense Distributed já vendia as peças necessárias para o fazer: peças sem número de série, que portanto impediam as autoridades de seguir o historial de uma arma até à sua origem.

O fundador da Defense Distributed defende que a intenção de publicar os manuais está conforme à Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que protege o direito à liberdade de expressão. Em declarações ao The Washington Post, Cody Wilson, considera que o que está em causa é o "acesso à informação" e não o direito de ter armas.

Cody Wilson é uma figura controversa nos EUA desde que a empresa que fundou publicou os manuais de impressão da arma de fogo Liberator em 2013. Wilson considera-se um defensor radical da liberdade do indivíduo e um inimigo da intervenção do Estado. É um admirador de Julian Assange, o cérebro do WikiLeaks e afirma que vai buscar as ideias ao filósofo francês pós-moderno Jean Baudrillard. O Southern Poverty Law Center, uma organização que analisa grupos de ódio nos EUA, define-o como o resultado de "um tipo de pós-libertarianismo extremo".

Acordo “assombroso”

A decisão de imprimir armas em 3D tem sido altamente criticada, com várias entidades a pedirem que as autoridades tomem todas as medidas possíveis para limitar a fabricação doméstica desses aparelhos.

Bob Ferguson, procurador do Estado de Washington, emitiu um comunicado na segunda-feira em que pergunta ao governo de Trump por que razão está a dar "acesso fácil" a essas armas a "criminosos perigosos". O procurador alerta que as pistolas para download não só são rastreáveis porque não têm um número de série, como não seriam reconhecidas por detetores de metal por serem de plástico e estariam ao alcance de qualquer pessoa independentemente de idade, saúde mental ou histórico criminal.

Em carta aberta, cinco senadores democratas disseram que o acordo é "assombroso" e pediram explicações à Administração Trump.

O acordo permitirá que estes manuais sejam publicados na internet para distribuição ilimitada a todos, incluindo criminosos e terroristas, tanto aqui nos Estados Unidos quanto no Exterior", acrescentaram.

Na passada quinta-feira, 42 deputados democratas lamentaram a decisão da Administração Trump, alegando que a mesma "só agravará a epidemia de violência com armas nos Estados Unidos".

A decisão permite a "qualquer residente dos Estados Unidos (...) ter acesso, discutir, usar, reproduzir ou se beneficiar da informação", disponível ao público no site do grupo de Wilson, alertam os deputados.

O senador Edward Markey disse que Trump será "responsável por todas as armas descarregadas na Internet que circulam nas nossas ruas se ele não agir hoje". Na mesma linha, o senador Richard Blumenthal afirmou que se o presidente não intervir, ele acabará "com as mãos manchadas de sangue".

Trump reconhece

Na terça-feira, o presidente norte-americano reconheceu que "não faz muito sentido" a entrada em vigor da autorização para imprimir armas 3D em casa.

A declaração de Trump chegou já depois de depois de a empresa que fornece os códigos para a impressão de armas ter disponibilizado modelos de nove armas diferentes. Entre sexta-feira e domingo foram descarregados mais de mil ficheiros com guias e códigos para produção caseira. 

Estou a ver [o tema de] as armas de plástico 3D que se vendem ao público. Já falei com a NRA [Associação Nacional de Espingardas], não parece fazer muito sentido!", escreveu Trump no Twitter. 

 

 

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