Um beco sem saída. Como se as ondas de choque e estilhaços da guerra sem quartel que se vive na Síria entrassem pela sala do Conselho de Segurança da ONU. Em vez de consensos, sobraram as acusações, em especial contra a Rússia. A começar pela embaixadora norte-americana, Samantha Power.
O que a Rússia está a patrocinar e a fazer não é contraterrorismo, é uma barbaridade", disse aos quinze membros do Conselho, a embaixadora.
No passado recente está o fim do cessar-fogo acordado entre o secretário de Estado, John Kerry, e o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, devido ao bombardeamento de camiões que integravam uma coluna de ajuda humanitária.
Em vez de perseguir a paz, a Rússia e Assad fazem a guerra. Em vez de ajudarem a que a ajuda chegue aos civis, estão a bombardear comboios humanitários, hospitais e os que estão na linha da frente desesperadamente a tentar manter as pessoas vivas", acrescentou Samantha Power.
O ataque ao comboio humanitário na passada semana perto da cidade de Alepo levou à suspensão das missões da ONU no terreno. E provocou também uma troca de contrainformação, entre Rússia e Estados Unidos, sem se saber ainda quem terá bombardeado os camiões.
"Crimes de guerra", dizem França e Grã-Bretanha
O representante francês nas Nações Unidas foi igualmente duro com o regime sírio e com os aliados russos.
Falando antes do início da reunião, o embaixador François Delattre considera que estão a ser cometidos crimes de guerra na cidade síria de Alepo
Não devem ficar impunes”, sustentou o embaixador, falando sobre as ações do regime sírio e dos aliados russos.
Para o diplomata francês, Rússia e governo de Damasco apostam numa solução militar na Síria e, segundo o mesmo, servem-se das negociações como uma “cortina de fumo”.
Por seu turno, o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Marc Ayrault, pediu à Rússia e ao Irão que deixem de apoiar a estratégia do regime sírio ou “serão cúmplices dos crimes de guerra cometidos em Alepo”.
Pelo mesmo diapasão afinou o embaixador britânico, Matthew Rycroft, com mais uma mão cheia de acusações a Moscovo.
O regime sírio e a Rússia desencadearam um novo inferno em Alepo. A Rússia é parceira do regime sírio na execução de crimes de guerra", afirmou o embaixador.
Rússia não desarma
O clima de discórdia foi tal durante a reunião que, quando o embaixador sírio começou a falar, os representantes dos Estados Unidos, França e Grã-Bretanha saíram da sala, segundo afirmaram diplomatas à agência noticiosa Reuters.
Por seu turno, o representante russo também não deu o braço a torcer. Antes pelo contrário, lembrou que a situação no terreno começa a tornar-se impossível de ser revertida.
Na Síria, centenas de grupos estão a ser armados, o território está a ser bombardeado indiscriminadamente e conseguir a paz é uma tarefa quase impossível agora por causa disto", sustentou o embaixador, Vitaly Churkin.
Apelo ao entendimento
O ainda secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, voltou a apelar às potências mundiais para que se empenhem mais para “acabar com o pesadelo” na Síria, onde os ataques nos últimos dias causaram perto de 150 mortos.
Que desculpa há para algo menos que uma ação determinada para travar o caos? Durante quanto tempo mais todos aqueles que têm influência vão permitir que tal crueldade continue? Eu apelo a todos os envolvidos para que acabem com o pesadelo”, afirmou Ban Ki-moon, na reunião de urgência do Conselho de Segurança, convocada para analisar a escalada de violência dos últimos dias na Síria, em particular sobre uma zona controlada pelos rebeldes na cidade de Alepo.
Ajuda chegou a quatro locais
À margem da reunião, um comboio de ajuda humanitária constituído por 71 camiões conseguiu hoje chegar às localidades sírias sitiadas de Madaya e Zabadani, nos arredores de Damasco, e a Fua e Kefraya, no norte. Foi a primeira vez que tal aconteceu desde abril.
O Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) confirmou à agência noticiosa espanhola Efe, que o comboio humanitário por si organizado, juntamente com o Crescente Vermelho e a ONU, conseguiu entregar a ajuda humanitária, composta por alimentos, medicamentos e produtos higiénicos às populações.
Em Madaya, com 40.000 habitantes, e em Zadani, com apenas mil moradores, chegaram 52 camiões com ajuda.