Cimeira do clima chega ao fim sem entendimento sobre mercados de carbono - TVI

Cimeira do clima chega ao fim sem entendimento sobre mercados de carbono

  • SS - atualizada às 13:18
  • 15 dez 2019, 10:07

O acordo só foi alcançado quase dois dias após a data marcada para encerrar a conferência COP25. A cimeira terminou sem qualquer entendimento sobre a regulação dos mercados de carbono. As organizações ambientalistas Oikos e Zero responsabilizam EUA, Austrália e Brasil por resultado "pouco positivo"

A Cimeira do Clima da ONU já tem documento final acerca da ambição climática em 2020 e cumprimento do Acordo de Paris que limita os países para impedir a subida da temperatura média do planeta este século acima de 1,5 graus. A cimeira terminou sem qualquer entendimento sobre a regulação dos mercados de carbono. A decisão fica adiada para o próximo ano, assim como os compromissos de metas adicionais para o combate às alterações climáticas.

O acordo, intitulado "Chile-Madrid, hora de agir", foi alcançado quase dois dias após o dia marcado para encerrar a conferência COP25.

O documento foi aprovado pela presidente da COP25, a chilena Carolina Schmidt, após um tenso debate com o Brasil, que inicialmente não aceitou dois parágrafos incluídos no acordo sobre oceanos e uso da terra.

O acordo final da COP25 estabelece que os países terão de apresentar em 2020 compromissos mais ambiciosos para reduzir as emissões (as chamadas Contribuições Nacionais Determinadas) para enfrentar a emergência climática.

Segundo o acordo, o conhecimento científico será "o eixo principal" que deve orientar as decisões climáticas dos países para aumentar a sua ambição, que deve ser constantemente atualizada de acordo com os avanços da ciência.

O texto inclui "a imposição" de que a transição para um mundo sem emissões tem de ser justa e promover a criação de emprego.

O acordo também reconhece a ação climática de atores não-governamentais, a quem convida a aumentar e generalizar estratégias compatíveis com o clima.

A regulação dos mercados de carbono foi um dos temas mais debatidos durante a COP25. Inicialmente estava incluído no documento final, mas decidiu-se debatê-lo em separado. Muitos delegados disseram que nesta matéria era melhor um não acordo do que um mau acordo.

O acordo reconhece a importância do protagonismo da dimensão social da COP25 de que as pessoas devem estar no centro da resposta à crise climática. Reconhece o imperativo de que a transição para um mundo livre de emissões deve ser justa e impulsionar a criação de emprego decente e de qualidade.

Na COP25 foram mobilizados 89 milhões de dólares (80 milhões de euros), provenientes de diversos países para o Fundo de Adaptação e mais de 80 países anunciaram que apresentarão compromissos de luta contra as alterações climáticas mais ambiciosos do que os atuais em 2020.

O número de multinacionais comprometidas com a neutralidade carbónica (não produzir mais emissões de gases com efeito de estufa do que aquelas que tem capacidade de fazer desaparecer) em 2050 passou de 90, na cimeira de Nova Iorque, em setembro passado, para 117 na cimeira de Madrid.

O número de grandes cidades comprometidas com a neutralidade passou de uma centena, na cimeira de Nova Iorque, para 398, na COP25.

O número de países comprometidos com a neutralidade carbónica passou de 66 para 73.

 

Brasil quase bloqueia acordo final

O Brasil quase bloqueou o acordo da cimeira ao negar-se inicialmente a reconhecer o papel que os oceanos e o uso da terra têm nas alterações climáticas.

A presidente da cimeira, a ministra chilena Carolina Schmidt, submeteu esta manhã a votação o acordo político e principal da conferência e chegou mesmo a dá-lo como aprovado.

No entanto, segundos depois, os representantes de várias delegações pediram a palavra para apresentar objeções, como a Suíça, que disse não ter conhecido o acordo com antecedência, ou o Egito e a Malásia, que estavam com dificuldades em aceder aos documentos na página da cimeira.

E de seguida o Brasil pediu a palavra para dizer que tinha dúvidas em aprovar um texto no qual se incluem referências expressas em dois parágrafos (30 e 31 do acordo) ao papel dos oceanos e do uso da terra (referido em vários documentos científicos nos últimos meses) no clima global.

A intervenção do representante brasileiro provocou uma série de protestos e de respostas sobre a importância dos oceanos e da terra no clima.

Intervieram contra a proposta do Brasil de eliminar esses parágrafos os representantes da Indonésia, Costa Rica, Tuvalu, Belize, Austrália, Nova Zelândia, Ilhas Marshall, a União Europeia, o Egito, o Canadá, a Argentina, o Butão, a Suíça e a Rússia, que pediram à delegação brasileira que renunciasse ao pedido para não bloquear o acordo.

Entre os países que tomaram a palavra para defender esse papel dos oceanos e da terra esteve a Espanha, com a ministra da Transição Ecológica, Teresa Ribera, a destacar a importância de manter esses parágrafos e da mensagem ao mundo sobre a importância que têm os oceanos.

A presidência da COP pediu duas vezes ao Brasil para que não bloqueasse o acordo, mas o representante brasileiro, numa primeira intervenção, disse que não podia aceitar os parágrafos porque “minavam” o resto do texto, que no seu conjunto era “muito importante”.

No entanto, perante a insistência da presidente chilena, o Brasil acabou por comunicar formalmente que aceitava o acordo na integra, um anúncio recebido com aplausos.

 

Oikos e Zero responsabilizam EUA, Austrália e Brasil por resultado "pouco positivo"

As organizações ambientalistas Oikos e Zero consideram "pouco positivo" o resultado da cimeira do clima e acusaram os Estados Unidos, Austrália e o Brasil de proteger interesses económicos.

Atolados por negociações de má-fé que colocam a política e os interesses dos combustíveis fósseis acima das pessoas e do planeta, muitos países - liderados pelos Estados Unidos, Austrália e Brasil - mais uma vez expuseram a sua apatia ao sofrimento de milhões e uma rejeição voluntária da ciência", denunciam em comunicado conjunto divulgado horas depois de anunciado o acordo na cimeira.

As duas organizações não governamentais dizem ainda que é "cada vez maior" a diferença entre o que as pessoas exigem por um futuro seguro para o clima e o que os líderes estão dispostos a fazer "à medida que as emissões aumentam, a produção de combustíveis fósseis se expande e os impactos são mais dramáticos".

Acusando os líderes da COP25 de "falhar" na intensificação da ação climática de acordo com o objetivo de 1,5°C do Acordo de Paris, a ZERO e a Oikos consideram que "existe uma falta de liderança política num processo que tem muitos países a criarem obstáculos" e que tal limitou a ambição na COP25 quanto à preparação das decisões em Galsgow.

Depois de um ano em que o mundo assistiu a uma mobilização sem precedentes pedindo urgência na ação climática, os líderes da COP25 falharam em intensificar a ação climática de acordo com o objetivo de 1,5°C do Acordo de Paris", acusa, considerando que a COP25 ofereceu aos governos a "oportunidade perfeita" para elaborar em detalhe planos para aumentar até 2020 a ambição nacional climática e que "esses planos deveriam descrever a resposta dos governos à emergência climática e à ciência climática e como iniciarão a transformação social".

Os ambientalistas acusam os principais países emissores de "recuar" nos compromissos de aumentar a ambição até 2020 e os países ricos de "recusar" a promessa de fornecer financiamento para perdas e danos.

"A já referida ausência de liderança negocial à escala mundial pressiona ainda mais a União Europeia a apresentar uma meta de redução de emissões para 2030 substancialmente mais alta no início de 2020 para convencer outros grandes emissores como a China e abrir caminho a um aumento da ambição global na COP26 do próximo ano em Glasgow", acrescentam as organizações.

Os ambientalistas lembraram ainda que, durante a COP25, a União Europeia "disse repetidamente que deseja dar o exemplo" e que, para provar a sua sinceridade e liderança na implementação do Acordo de Paris, "precisa de aumentar substancialmente a sua promessa climática para 2030 através de metas de redução iguais ou preferencialmente mais elevadas" que 55% entre 1990 e 2030, nos primeiros meses de 2020.

A janela de oportunidade para se alcançar o objetivo de 1,5°C do Acordo de Paris está rapidamente a fechar-se", acrescentam no comunicado.

No que respeita a Portugal, a Zero diz ser preciso acelerar o ritmo de implementação das políticas climáticas, antecipar objetivos e ser coerente nas ações para salvar o planeta de um aquecimento global excessivo.

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