Diretora da Vogue Brasil gera polémica com festa de aniversário "negra" - TVI

Diretora da Vogue Brasil gera polémica com festa de aniversário "negra"

Donata Meirelles

Duas fotografias em particular mostravam Donata Meirelles sentada numa cadeira, rodeada de mulheres negras. As imagens foram interpretadas como “a sinhá e suas mucamas”

A festa de 50 anos de Donata Meirelles, diretora da revista Vogue Brasil, tornou-se alvo de polémica, depois de imagens publicadas no Instagram terem indiciado que a temática da festa era a escravatura. As fotografias, entretanto retiradas da rede social, mostravam mulheres negras vestidas com trajes tradicionais a receber os convidados e a posar paras as objetivas com a aniversariante.

Numa das imagens, era possível ver Donata sentada numa cadeira, ladeada por duas mulheres negras. Muitos interpretaram a imagem como “a sinhá e suas mucamas” e a indignação instalou-se nas redes sociais. 

Donata Meirelles na sua festa de 50 anos. (Reprodução Instagram Rita Batista)

Rita Batista, uma apresentadora de televisão negra, de Salvador da Bahia, postou no Instagram uma fotografia que mostra uma sinhá ladeada de seus mucamos e explicou na legenda porque é que as fotografias do aniversário de Donata provocaram tanta indignação. A apresentadora citou um excerto do livro “Joias de Crioula”, de Laura Cunha e Thomas Milz para contextualizar a polémica:

“(...) Já as escravas de casas ricas eram adornadas por seus próprios senhores. 

Quando saíam para as ruas acompanhando suas senhoras ou crianças, eram exibidas em trajes finos e carregadas de joias.A própria escrava era um objeto de ostentação do dono, um objeto de luxo a ser mostrado publicamente”.

Ao lado da referida imagem, estava uma reprodução da foto de aniversário de Donata e Rita Batista comentou: “A primeira foto foi tirada em 1860. De acordo com @edercansino a foto que faz parte do acervo do @imoreirasalles, intitulada ‘senhora da família Costa Carvalho na liteira com dois escravos’ foi feita na Bahia por fotógrafo desconhecido. A segunda imagem é de 2019 mesmo.”

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

“(...)Já as escravas de casas ricas eram adornadas por seus próprios senhores. Quando saíam para as ruas acompanhando suas senhoras ou crianças, eram exibidas em trajes finos e carregadas de joias.A própria escrava era um objeto de ostentação do dono, um objeto de luxo a ser mostrado publicamente”. Trecho do livro Jóias de Crioula de Laura Cunha e Thomas Milz. A primeira foto foi tirada em 1860. De acordo com @edercansino a foto que faz parte do acervo do @imoreirasalles, intitulada “senhora da família Costa Carvalho na liteira com dois escravos” foi feita na Bahia por fotógrafo desconhecido. A segunda imagem é de 2019 mesmo. #sóeuacheiestranho #Bahiaterradafelicidade #ritadeixederecalque #passeodedinhoprolado #osprincípiosacimadaspersonalidades #qualquersemelhança #nãoémeracoincidência

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A polémica, obrigou Donata Meirelles a explicar-se no Instagram, garantindo que não se tratou de uma “festa temática”. Donata assegura que as mulheres a seu lado estavam vestidas com trajes tradicionais baianos.

Ontem comemorei meus 50 anos em Salvador, cidade de meu marido e que tanto amo. Não era uma festa temática. Como era sexta-feira e a festa foi na Bahia, muitos convidados e o receptivo estavam de branco, como reza a tradição. Mas vale também esclarecer: nas fotos publicadas, a cadeira não era uma cadeira de Sinhá, e sim de candomblé, e as roupas não eram de mucama, mas trajes de baiana de festa. Ainda assim, se causamos uma impressão diferente dessa, peço desculpas”, escreveu.

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Ontem comemorei meus 50 anos em Salvador, cidade de meu marido e que tanto amo. Não era uma festa temática. Como era sexta-feira e a festa foi na Bahia, muitos convidados e o receptivo estavam de branco, como reza a tradição. Mas vale também esclarecer: nas fotos publicadas, a cadeira não era uma cadeira de Sinhá, e sim de candomblé, e as roupas não eram de mucama, mas trajes de baiana de festa. Ainda assim, se causamos uma impressão diferente dessa, peço desculpas. Respeito a Bahia, sua cultura e suas tradições, assim como as baianas, que são Patrimônio Imaterial desta terra que também considero minha e que recebem com tanto carinho os visitantes no aeroporto, nas ruas e nas festas. Mas, como dizia Juscelino, com erro não há compromisso e, como diz o samba, perdão foi feito para pedir.

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Mas nem isso arrefeceu a polémica. Num artigo de opinião, no jornal Folha de São Paulo, o argumentista Tony Goes fala numa “sucessão de equívocos”.

A aniversariante se defendeu quando a controvérsia explodiu. Pediu desculpas pelo mal-entendido via Instagram, e ainda disse que a cadeira era, na verdade, um ´trono de candomblé´. Não percebeu, mais uma vez, que cometeu uma gafe: nos terreiros, os tronos de candomblé são reservados para os pais e mães-de-santo, coisa que Donata não é”, escreveu.

A polémica levou mesmo a própria Vogue Brasil a emitir um comunicado, em jeito de esclarecimento e pedido de desculpas. Um comunicado que foi partilhado pela própria Donata, na sua página de Instagram.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Em relação às manifestações referentes à festa de 50 anos de Donata Meirelles, a Vogue Brasil lamenta profundamente o ocorrido e espera que o debate gerado sirva de aprendizado. Nós acreditamos em ações afirmativas e propositivas e também que a empatia é a melhor alternativa para a construção de uma sociedade mais justa, em que as desigualdades históricas do País sejam debatidas e enfrentadas. Em busca da evolução constante que sempre nos pautou, aproveitamos a reflexão gerada para ampliar as vozes dentro da equipe e criar, em caráter permanente, um fórum formado por ativistas e estudiosos que ajudarão a definir conteúdos e imagens que combatam essas desigualdades.

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Aos 50 anos, a hora é de ação. Ouvi muito, preciso ouvir ainda mais. Quero agir em conjunto com as mulheres que têm a me ensinar e com quem mais estiver disposto a ser elo em uma transformação que se faz necessária. Meu compromisso é me colocar em (re)construção! Em ação! #Repost @voguebrasil ・・・ Em relação às manifestações referentes à festa de 50 anos de Donata Meirelles, a Vogue Brasil lamenta profundamente o ocorrido e espera que o debate gerado sirva de aprendizado. Nós acreditamos em ações afirmativas e propositivas e também que a empatia é a melhor alternativa para a construção de uma sociedade mais justa, em que as desigualdades históricas do País sejam debatidas e enfrentadas. Em busca da evolução constante que sempre nos pautou, aproveitamos a reflexão gerada para ampliar as vozes dentro da equipe e criar, em caráter permanente, um fórum formado por ativistas e estudiosos que ajudarão a definir conteúdos e imagens que combatam essas desigualdades.

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A festa durou dois dias e as fotografias referem-se ao primeiro dia. A polémica acabou por envolver outros famosos bem conhecidos do público português. Ivete Sangalo atuou no segundo dia das comemorações, já a polémica estava instalada. Ivete fez um breve discurso à amiga aniversariante que dividiu opiniões sobre o que a cantora realmente pensa sobre a controvérsia que envolve o racismo.

Precisamos compreender a aflição do outro e a dor do outro, por isso estou aqui hoje com todo meu amor e meu carinho para você. Esse é o nosso exercício: pensar no outro, para que pensem na gente, da mesma maneira que temos que pensar no outro. Independente de que situação seja, é preciso pensar no outro e compreender”, disse a cantora no discurso.

Para uns, o discurso de Ivete foi encarado como um apoio à amiga, enquanto outras pessoas viram como um puxão de orelhas.

A atriz Taís Araújo, conhecida também pelo seu ativismo contra o racismo, também já se pronunciou publicamente sobre a polémica. Num post no Instagram, a atriz disse gostar de Donata, mas lança-lhe também duras críticas. 

É uma mulher que eu conheço e de quem gosto. O que aconteceu, no entanto, considero um erro, pois a festa foi feita por pessoas que trabalham com imagem e sabem o poder que uma imagem tem. Não acredito que o desejo deles tenha sido retratar o Brasil Colônia, um período duro, mas uma imagem fala mais que mil palavras e dez mil desejos. As comparações são inevitáveis. O que aconteceu ali é o que o que ocorre nesse país construído sobre o racismo, corpos, suor, sangue e lágrimas negros. Esse sofrimento é tão naturalizado que fica difícil para as pessoas que não se identificam com as moças de pé ao lado da cadeira sentirem o que a população negra sente", escreveu.

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Muitos têm me perguntado sobre a festa da Donata. Bom, ela é uma mulher que eu conheço e de quem gosto. O que aconteceu, no entanto, considero um erro, pois a festa foi feita por pessoas que trabalham com IMAGEM e sabem o poder que uma imagem tem. Não acredito que o desejo deles tenha sido retratar o Brasil Colônia, um período duro, mas uma IMAGEM fala mais que mil palavras e dez mil desejos. As comparações são inevitáveis. O que aconteceu ali é o que ocorre nesse país construído sobre o racismo, corpos, suor, sangue e lágrimas negros. Esse sofrimento é tão naturalizado que fica difícil para as pessoas que não se identificam com as moças de pé ao lado da cadeira sentirem o que a população negra sente. Tudo fica natural, passa a ser “mimimi”. “Mas agora tudo é racismo?” Bom, lamento dizer que, se "nem tudo é racismo", é sobre racismo que nossa sociedade foi construída. Mesmo que muitos de nós, negros, brancos e indígenas, não tenhamos consciência; mesmo que seja contra a nossa vontade; mesmo sentindo vergonha, esta é a nossa história. Cabe a nós, adultos, olhar para o nosso país com maturidade e crítica, e educar nossas crianças pra um futuro menos desigual. Reconhecer é um caminho. Errar faz parte do processo e o melhor do erro é ele ser o caminho para o aprendizado. Meu posicionamento sobre racismo estrutural tem sido dado em toda a minha carreira. Basta rolar o feed e você verá que me pronunciei em situações parecidas, como, por exemplo, quando uma marca fez uma estampa "celebrando" a escravidão. Mas evitei comentar quando, recentemente, um menino branco foi fantasiado pela mãe em uma festa como escravo, lembra? Isto porque meu pronunciamento está dado e não mudou. Nem mudará, e não preciso repetir sempre. É tudo a mesma coisa e, como já disse anteriormente, a escravidão deveria estar em livros de história e ter erguido museus para lembrarmos de seu horror e da dor e violência sofridas por seres humanos em mais de 300 anos. Proponho uma reflexão: pq essa imagem continua acontecendo dentro de muitos restaurantes, lugares públicos e lares sem que ninguém se movimente? Pq será que em nosso dia a dia não nos incomodamos e somos coniventes, hein, Brasil?

Uma publicação partilhada por Taís Araujo (@taisdeverdade) a

Donata é casada com Nizan Guanaes, um dos mais conceituados e premiados empresários do ramo da publicidade no Brasil. Mas nem a vasta experiência do marido parece ter impedido a diretora de uma das mais conceituadas revistas do Brasil de ter sido abalada por uma polémica que lhe trouxe publicidade negativa. 

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