O que diz a imprensa norte-americana sobre a ameaça de "fogo e fúria" de Trump à Coreia do Norte - TVI

O que diz a imprensa norte-americana sobre a ameaça de "fogo e fúria" de Trump à Coreia do Norte

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As opiniões de especialistas citados por alguns meios de informação nos Estados Unidos dividem-se. Uns acreditam que o discurso do presidente apenas contribui para a escalada de tensões. Outros julgam que as palavras servem como dissuasão

"Podem esperar uma chuva de ruínas do céu, como nunca foi visto nesta terra". A frase é de 1945 e pertence a Harry S. Truman, então presidente dos Estados Unidos. As palavras, inflamadas, inserem-se no discurso em que foi anunciado o lançamento de uma bomba atómica em Hiroshima e o Japão foi instado a render-se. Se os japoneses recusassem, a resposta seria como Truman alertara.

É isto que recorda o jornal The New York Times, para mostrar que foi preciso esperar mais de sete décadas para voltar a ouvir algo num tom semelhante dito por um presidente dos Estados Unidos. Mais concretamente, a ameaça de "fogo e fúria" disparada por Donald Trump à Coreia do Norte, esta terça-feira

As declarações do atual líder da Casa Branca contrastam claramente com o discurso mais contido dos seus antecessores em resposta às provocações de Pyongyang. Entrevistado pelo Times, Peter Feaver, antigo membro do Conselho de Segurança Nacional sob George W. Bush e professor de ciência política, afirma que as palavras vão beber ligeiramente "ao tom dos norte-coreanos". O site de notícias Vox escreve no mesmo sentido. Trump aparenta estar a imitar "o tom exagerado pelo qual os comunicados norte-coreanos são famosos". 

As opiniões na imprensa norte-americana dividem-se. A revista The Atlantic classificou o discurso do presidente republicano como "invulgarmente bélico e abrupto". E o facto do homólogo de Trump ser Kim Jong-un aumenta os riscos de retaliação, visto que o líder de Pyongyang também é alguém de "pouca-confiança" e "imprevisível", afirmou o jornalista de política, David A. Graham.

"Com Trump, nunca se sabe", também escreveu David Ignatius, num artigo de opinião para o jornal The Washington Post, lembrando que, se até o conselheiro para a segurança nacional, H.R. McMaster, diz ao presidente que uma Coreia do Norte nuclear é "intolerável", então é possível que estejam a ser preparadas "opções militares". Aprofunda o site Vox que as palavras enviam um sinal totalmente oposto daquilo "que o presidente deveria estar a enviar numa altura em que as tensões por causa do programa nuclear norte-coreano atingiram níveis sem precedentes devido aos recentes testes com mísseis".

Outros discordam. Victor Chan sublinha que as palavras não são uma promessa, mas um alerta para as consequências que a Coreia do Norte pode enfrentar se decidir usar poder nuclear. "Uma mensagem de dissuasão, importante agora para evitar qualquer erro de cálculo", afirmou este antigo membro do Conselho de Segurança Nacional ao The New York Times

E é precisamente um "erro de cálculo" que teme Laura Rosenberger, antiga diretora do Conselho de Segurança Nacional para a Coreia e China. As palavras de Trump podem igualmente levar Pyongyang a julgar "que tem de agir preventivamente, se acreditar que um ataque dos Estados Unidos está iminente", alertou, em declarações à Vox.

David Ignatius pensa que este é "o momento da verdade" na questão da Coreia do Norte e enaltece a importância da China. Se os Estados Unidos e Pequim estiverem sintonizados na forma como têm de lidar com Pyongyang, os chineses podem afirmar-se definitivamente no teatro internacional. Ignatius acredita nesta tendência, sobretudo quando o Conselho de Segurança das Nações Unidas (do qual fazem parte ambos os países) aprovou, de forma unânime, novas sanções contra o regime norte-coreano. Mas, se as duas potências não se entenderem, escreve no Post, então podem dar origem "a um conflito militar catastrófico na península coreana".

É nesta linha que a The Atlantic recorda a opinião do secretário de Defesa norte-americano. "Um conflito na Coreia do Norte (...) seria provavelmente o pior tipo de luta na vida das pessoas", afirmou James Mattis, em maio passado. Por isso é que Trump está a traçar "uma linha vermelha que será certamente cruzada - talvez muito em breve", diz a revista norte-americana, se Kim Jong-un estiver na disposição para tal. O melhor que pode acontecer ao mundo é que nesta situação, o presidente "volte a distrair-se", conclui.

Concede a Vox que tudo é "teoricamente possível quando se fala de Trump", mas é mais provável isto tratar-se de "mais um exemplo dele a fazer uma declaração extremamente inflamatória sem realmente pensar nas respetivas implicações". Refere ainda o site, num artigo de opinião intitulado Calm down: we're (probably) not about to go to war with North Korea (Tenham calma: nós (provavelmente) não estamos prestes a ir para a guerra com a Coreia do Norte, na tradução portuguesa), que não existe qualquer indicação de que os norte-americanos começaram as devidas preparações para despoletar uma guerra com Pyongyang. Aliás, lembra, os Estados Unidos ainda não têm um embaixador na Coreia do Sul. Se a Casa Branca decidisse seguir para um conflito, seria de esperar "uma enorme mobilização a partir dos ramos políticos, militares e diplomáticos do governo".

Não é esse o caso, afiança a Vox. "Aquilo que realmente temos é um discurso beligerante que o presidente Trump fez quando estava de férias em New Jersey", remata.

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